Este artigo se propõe a relacionar duas abordagens teóricas produzidas no âmbito do pensamento de três teóricos do século XX. São eles Mikhail Bakhtin, Gilles Deleuze e Felix Guattari, cujas abordagens dão conta da produção do discurso romanesco e da literatura menor em contextos culturais não hegemônicos. Bakhtin concebe o funcionamento do discurso romanesco pelo aproveitamento de uma dicção familiarizada com o menor, com o baixo, com a língua que ecoa na rua e não nos salões ou vozes aristocráticas; já a literatura menor de Gilles Deleuze e Felix Guattari é apresentada como o uso menor e hierarquicamente desprestigiado que uma minoria faz no seio de uma língua reconhecida culturalmente como superior.Da associação proposta aqui resulta a reflexão de que uma literatura produzida em meio não hegemônico se dá pela ativação de uma força linguística resultante do uso da língua que uma minoria faz em uma língua maior; estende-se essa percepção ao modo de realização literária que uma comunidade de produtores pertencentes a um grupo não hegemônico faz frente ao já avaliado criticamente em contextos culturais dados como mais relevantes histórica e culturalmente.
As arquitetônicas sertanejas da ficção de João Guimarães Rosa são as categorias que dimensionam essa ficção como um novo gênero narrativo criado, construído e realizado nos sete livros que a compõem. A finalidade deste trabalho é de apresentar um conjunto de reflexões e discussões para fundamentar a hipótese basilar de releitura da obra rosiana a partir do pensamento teórico-filosófico de Mikhail Bakhtin e de redimensionar a teoria bakhtiniana a partir da literatura de Rosa. A tese se apresenta dividida em duas partes, sendo a primeira de apresentação e discussão da fortuna crítica e das categorias teóricas que servem de anteparo para a segunda parte, a análise da ficção de Guimarães Rosa. Cada discussão está ligada através de reflexões filosóficas e críticas para o estabelecimento e confirmação da hipótese materializada na questão: como a fortuna crítica rosiana pensa o sentido estético e ético da forma literária de João Guimarães Rosa? As respostas são direcionadas e redirecionadas em cada um dos quatro capítulos da primeira parte e demonstradas nos quatro capítulos da segunda parte. Além da teoria bakhtiniana, vários pensadores da Literatura, da Filosofia, da Estética e da Cultura surgem ao longo do trabalho a fim de alicerçar e estabelecer as linhas de argumentação principais da tese: os conceitos de Weltanschauung e de Arquitetônica para definição da ficção rosiana como um novo gênero literário, que está nomeado aqui como narrativa arquitetônica.