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Como usar as redes sociais para construir sua marca como jornalista

Por Sergio Quintanilha

As redes sociais digitais modificaram não só o jornalismo, mas o mundo. Os jornalistas, porém, talvez sejam os profissionais mais afetados por seu impacto, pois lidam com a informação. Uma vez que qualquer pessoa pode difundir qualquer informação, o papel do jornalista profissional ficou muito mais complexo. A importância das redes sociais para os jornalistas é um fato. Isso se aplica também aos profissionais de outras áreas, mas no caso específico dos jornalistas nosso único produto é a informação — portanto, é diferente de quem vende qualquer coisa que não seja informação.

Estar presente (e ativo) nas redes sociais é fundamental para o jornalista que não quer ser menos relevante no mundo da comunicação do que seus próprios leitores. Nem todos conseguem. Para jornalistas de supermídias, como televisão, grandes jornais e rádios com boa audiência, a tarefa é mais fácil. O nome já está feito e basta fazer das redes sociais um complemento. Para jornalistas de áreas especializadas a tarefa é muito mais difícil.

Para construir uma audiência robusta nas redes sociais digitais é preciso três coisas: 1) estratégia; 2) foco; 3) dedicação. A primeira coisa a decidir é: em quais redes sociais atuar e de que forma. Para começo de conversa, YouTube não é rede social, e sim uma televisão particular, na qual cada um pode brincar de ser o todo-poderoso Boni dos bons tempos da Rede Globo. WhatsApp também tem características que diferem das redes sociais clássicas, por isso deve ser considerado como uma ferramenta de comunicação direta, como o antigo e-mail e o jurrássico telefone.

Do ponto de vista do jornalista profissional, as redes sociais mais importantes são, pela ordem: Twitter, Instagram, Facebook, Linkedin e Pinterest. Para quem faz vídeo, o Instagram é mais importante do que o Twitter — e isso já faz parte da estratégia de cada jornalista. Vamos começar pelos dois últimos. Pinterest talvez seja mais útil para guardar fotos e/ou informações (infográficos) do que para se comunicar com o público. Já o Linkedin serve para “vender” a sua imagem como profissional ou para falar com líderes empresariais. É uma rede difícil de atuar, porque você pode passar de irrelevante para pedante num único post.

Particularmente, acho perda de tempo postar constantamente links e matérias sobre automobilismo no Linkedin, pois banaliza sua presença e reduz seu “valor” profissional caso suas postagens sejam barradas pelo rigoroso algoritmo dessa rede. Se tiver menos de 20 ou 30 engajamentos por postagem, sua imagem não será a de uma pessoa bem informada, mas sim a de um “fracassado” (o que pode ser irreal) ignorado pela rede na qual todo mundo “precisa” brilhar.

O Facebook também é rigoroso no algoritmo, mas é o preferido pela maioria dos jornalistas que não são da grande mídia (estes estão todos no Twitter). Embora seja uma rede social tóxica, contaminada por severas discussões políticas (daí ter servido como instrumento de manipulação de eleições), o Facebook é extremamente amigável. É o lugar ideal para falar com quem você conhece, por isso a sensação de estar “sendo ouvido” no Facebook é mais aparente. Mas raríssimos posts levam os leitores a visitar as páginas. A maioria dos comentários é feita com base no próprio título.

Uma opção interessante do Facebook é a página profissional, cheia de recursos e muito fácil de usar. Para que essa página “bombe”, porém, você precisa ser famoso (e, nesse caso, não precisa do Facebook). A outra solução é pagar mensalmente por campanhas que aumentem sua audiência, mas isso exige uma boa quantia em dinheiro e leva meses ou até anos para dar resultado. É viável para veículos de comunicação, mas não muito para jornalistas. O Facebook também é mais tolerante quando o jornalista posta temas polêmicos fora de sua área de atuação. Mas essa “tolerância” tem um custo silencioso: a pessoa deixa de seguir o jornalista ou simplesmente cancela a “amizade” — eis um clássico da modernidade líquida (Bauman). Os não-comentários em postagens polêmicas do Facebook são mais nocivos do que os bate-bocas públicos.

O Instagram é uma rede interessante e mais fácil de conseguir seguidores. Sua fórmula é simples e eficiente. Para o jornalista profissional, entretanto, o Instagram exige uma disciplina que poucos conseguem cumprir. De novo: a menos que o jornalista já seja famoso, para ser seguido no Instagram é preciso dar informações, ser útil de alguma forma. Imagem é a melhor e mais sedutora informação nos tempos modernos. Então, quem segue um jornalista especializado em automobilismo quer ver… carros de corrida, corridas de carro, pilotos, e não o churrasco do fim de semana.

Twitter da equipe Mercedes de Fórmula 1: quatro fotos num único post.

Mesmo assim, carros não são sempre a mesma coisa. Carros de passeio têm um significado, carros de corrida têm outro bem diferente. Misturar carros de passeio, carros de corrida e pilotos de competição é a receita certa para fracassar. O enfoque das postagens é ainda mais complexo. Quando postei uma foto de Lewis Hamilton, após o GP da Estíria de 2020, num gesto de protesto contra o racismo, perdi alguns seguidores. Para além disso, o Instagram exige dedicação total nas “stories”. São elas que prendem o público e fazem aumentar a audiência, e não as fotos. São as “stories” que tiram a pessoa do anonimato e a transformam em “influencer”.

Poucos jornalistas usam corretamente o Instagram. Os poucos que têm milhares de seguidores no Instagram manejam muito bem as “stories” diariamente. Alguns também utilizam o IGTV para postar vídeos de até 15 minutos e aumentam ainda mais sua relevância. Há casos também de jornalistas que preferem priorizar seus perfis profissionais. Como eu disse, trata-se de ter uma estratégia e foco. E acredite: a competição com aficionados que não são jornalistas é ainda maior do que dentro do próprio meio, daí a necessidade de trazer alguma coisa exclusiva nas postagens.

Por fim, o Twitter é, ao mesmo tempo, a rede social mais relevante da atualidade e também a mais difícil de conseguir seguidores. O Twitter exige uma linguagem própria. Muitos jornalistas fogem do Twitter porque têm a sensação de estar falando para ninguém (daí o conforto do Facebook, apesar dos perrengues). Com o tempo, essa sensação passa, mas o Twitter também exige grande dedicação. Alguns perfis de sucesso no Twitter: Flavio Gomes (166,7 mil seguidores), Lito Cavalcanti (40,5 mil), Julianne Cerasoli (14,9 mil), Rafael Lopes (31,3 mil), Alessandra Alves (8,1 mil) e Reginaldo Leme (159,2 mil). Outros, como Américo Teixeira Júnior, do Diário Motorsports (8,2 mil, preferem priorizar o perfil do veículo.

O Twitter não tem textão; pelo contrário, exige textos cirúrgicos, frases precisas. O Twitter é desafiador em todos os sentidos, pois aceita uma linguagem descolada, debochada, abreviada, dispensa pontuação e até mesmo recria algumas palavras, como “chatiada” no lugar de chateada. Porém, o Twitter tem suas regras não escritas. Ele não tem corretor. Mesmo assim, pega mal, muito mal, excluir postagens, mesmo erradas. É preferível fazer um comentário no próprio tweet corrigindo o erro. Um erro comum é postar somente quando se tem tempo livre. Por isso, recomendo usar o aplicativo TwitterDeck para postar, pois ele permite agendar tweets ao longo do dia. É grátis e amigável.

O Twitter não gosta de quem fica em cima do muro — é preciso escolher um lado. O Twitter é rápido, é ágil. Algumas piadas que surgem no Twitter “bombam” no Facebook uma ou duas semanas depois (quando isso ocorre). O Twitter, por outro lado, é o mais amigável canal de comunicação entre o jornalista e seu público. No Twitter, os famosos respondem aos anônimos. Haters são tratados como haters, normalmente com block. Mas a interação ocorre com extrema facilidade.

Ao contrário do Facebook, no Twitter você pode usar o nome que quiser. Seu nome pode vir acompanhado de uma figura, por exemplo. Porém, lembre-se que a ideia é fazer de seu nome uma marca, por isso vale a pena usá-lo. Nos últimos anos, o Twitter se tornou muito dinâmico. É possível postar vídeos sem limite de tempo e até quatro fotos por post. Ele também permite a “thread”, que são tweets em sequência. Mesmo sabendo de tudo isso, porém, o Twitter também exige foco. Nesse ponto, a audiência do Twitter é ainda mais rígida do que a do Instagram. O preço para quem ousa misturar muitos assuntos é uma audiência baixa. Mas é uma rede tão forte que o sucesso, às vezes, assusta.

Twitter do jornalista Rafael Lopes: começou a comentar no SporTV em 2020, mas está no Twitter desde 2007

A melhor maneira de conquistar seguidores no Twitter é fazendo comentários interessantes em postagens que estão com grande audiência (todos os números são abertos). Ou então fazendo um retweet de um tweet interessante com um comentário próprio (nesse caso, convém ser mais interessante ainda). Quando um famoso responde ou retuita um tweet seu, a audiência explode. Dependendo do caso, chega a ser assustadora a repercussão, pois as pessoas entram em seu perfil e vasculham o que você é e o que você disse.

Para finalizar, a grande dificuldade dos jornalistas nos tempos modernos é como usar bem as redes sociais digitais. Faz muito tempo que Facebook, Twitter e Instagram deixaram de ser uma diversão. A maioria dos usuários tem a sensação de diversão, curtindo coisas legais e postando mensagens de paz e amor.

Mas não. O que estamos fazendo é um trabalho gratuito. Produzimos conteúdo gigante (na forma de comentários, fotos e vídeos) para empresas transnacionais que faturam bilhões do que extraem de nossos olhares. O poder de empresas como Google e Facebook não tem paralelo na história da mídia. Além de produzir conteúdo gratuito, entregamos a essas empresas nossos desejos, nossos hábitos de consumo, nossas preferências políticas e até informações sobre a nossa saúde. Por isso, certas estão aquelas pessoas que tentam tirar algum proveito disso. Para quem pretende ser relevante como jornalista especializado nas redes sociais, o ideal é começar a construir sua marca o quanto antes, mesmo que ainda esteja na faculdade de jornalismo.

Para saber mais: 

Sobre isso, ler Tansformações contemporâneas no papel social dos jornalistas: o caso da mídia automotiva no Brasil: https://bit.ly/3jkjw88

Sergio Quintanilha é doutorando em Ciências da Comunicação na ECA-USP e escreve sobre automobilismo desde 1989 – twitter: @QuintaSergio