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Os maravilhosos vice-campeões da F1

Por Marcelo Cardoso

Mais uma temporada da Fórmula 1 (F1) terminou e, naturalmente, todos os holofotes midiáticos se voltaram para o campeão, para o futuro da categoria e dos demais pilotos. O ano de 2020 foi diferenciado pelas dificuldades enfrentadas com a pandemia provocada pelo novo coronavírus, pela comemoração do aniversário dos 70 anos da categoria automobilística e pelo desempenho da dupla Lewis Hamilton/Mercedes, que foi absoluta.

O inglês demoliu ou igualou importantes recordes da categoria e sinalizou que fará o mesmo em 2021. E se o rápido Hamilton repetir o cenário, quem seria o candidato a vice? Valtteri Viktor Bottas? Max Emilian Verstappen? O renascido Fernando Alonso Díaz? Ou uma das jovens promessas se tornaria a maior zebra de todos os tempos?

O fato é que o vice quase nunca é lembrado ou, quando citam o seu nome, é para críticas. Os brasileiros sabem disso e amam avacalhar o nome de Rubens Barrichello, vice-campeão na F1 por duas vezes.

Ficar em segundo lugar em um campeonato que reúne a nata dos pilotos do automobilismo na categoria mais cara do planeta tem muito valor, mesmo com pouco reconhecimento daqueles que só querem saber dos vitoriosos. Assim, esta coluna relembra alguns dos melhores “vices” desde o início da F1, sejam eles injustiçados ou não tão competentes.

O maior de todos os vices da F1

Foi o britânico Stirling Crawford Moss (1929-2020) o piloto de F1 a conseguir o maior número de vice-campeonatos na sequência. Ele foi, na verdade, tetra-vice-campeão entre os anos de 1955 e 1958. Para aquela turma de torcedores que ignora o segundo lugar, é bom que se explique antes que o chamem de o “grande perdedor”.

Moss perdeu a taça por três vezes seguidas para o argentino Juan Manuel Fangio (1911-1995) que foi, simplesmente, o maior recordista de títulos na categoria até que o alemão Michael Schumacher ultrapassasse a marca, somente em 2003. “Moss pegou um gênio pela frente, o Fangio. O seu destino era esse, ser vice”, afirma o jornalista especializado em automobilismo Luiz Alberto Pandini.

Stirling Moss foi vice-campeão por quatro vezes consecutivas. (Crédito: @SirStirlingMoss)

O piloto londrino obteve 16 vitórias e fez 16 poles em 66 grandes prêmios. Não dá para dizer que era incompetente. “Foi um dos primeiros a encarar as corridas com abordagem mais comercial”, comenta Pandini. O jornalista explica que Moss possuía uma mentalidade comercialmente mais próxima a do piloto Jackie Stewart, dos anos 1970, um outro momento da F1. “Stewart era o primeiro a sentar no carro sabendo quanto ia ganhar e isso em uma época em que não existiam altos salários na categoria”, relembra Pandini.

Desde 1950 foram 44 vice-campeões. Além de Moss, quem tem o mesmo número de “quase títulos” é o francês Alain Prost – 1983, 1984, 1988 e 1990 -, porém, com a “singela” diferença de ter sido campeão por quatro vezes (1985, 1986, 1989 e 1993).

Os “tri-vices” que foram campeões

O inglês Graham Hill (1929 -1975) foi campeão em 1962, um ano antes de sagrar-se vice e, depois, conquistou novamente o título máximo em 1968. Nos anos de 1964 e 1965 ficou com a segunda colocação no mundial da categoria. Outro britânico, Nigel Mansell, velho conhecido dos brasileiros pelas disputas com Nelson Piquet e Ayrton Senna (1960 – 1994), ficou com a taça de vice nos anos de 1986, 1987 e 1991 para, finalmente, conquistar o título no ano seguinte.

Ainda na ativa, o piloto alemão Sebastian Vettel teve os seus vice-campeonatos nos anos de 2009, 2017 e 2018. Seguindo o mesmo traçado de Mansell, Vettel tornou-se campeão após terminar em segundo no campeonato, porém, foi adiante e conquistou no total quatro títulos:  de 2010 a 2013.

O piloto Fernando Alonso, que já chegou a ser considerado por especialistas como o melhor piloto da F1, teve altos e baixos na carreira. O espanhol foi um daqueles que conquistou títulos (2005-2006) antes de ser vice por três vezes: 2010, 2012 e 2013.

Os “quase campeões” que fizeram dobradinha como vice

Entre tantos pilotos que conseguiram ser vice-campeões por duas vezes – e que demonstraram que não estavam ali por acaso – há gigantes do tamanho de Fangio. O piloto ficou em segundo lugar em 1950 para ser campeão pela primeira vez no ano seguinte.

Em Stuttgart, na Alemanha, homenagem da Mercedes-Benz, uma das escuderias defendidas por Juan Manuel Fangio: cinco campeonatos e dois vices. (Crédito: Marcelo Cardoso)

O escocês Jackie Stewart seguiu este caminho natural e tornou-se vice-campeão em 1968 (e, depois em 1972) para nos anos seguintes conquistar três vezes o maior título (1969, 1971 e 1973). A mesma trajetória tiveram Damon Hill, Kimi Raikkonen, Nico Rosberg e Lewis Hamilton: foram vice para, depois, conquistar o lugar mais alto no pódio da categoria.

Alguns, porém, fizeram o contrário e se tornaram campeões pela primeira vez antes de fechar uma temporada na segunda colocação. Foi o que ocorreu com os brasileiros Emerson Fittipaldi (campeão em 1972 e 1974 e vice em 1973 e 1975) e Ayrton Senna (campeão em 1988, 1990 e 1991 e vice em 1989 e 1993) e com o alemão Michael Schumacher, que conquistou o primeiro, dos sete títulos mundiais, em 1994 e só foi vice quatro anos mais tarde. 

Há, ainda, a lista daqueles vice-campeões por duas vezes e que jamais alcançaram o título máximo como o brasileiro Rubens Barrichello (vice em 2002 e em 2004), Ronnie Peterson (1944-1978) que teve dois vice-campeonatos, um em 1971 e outro em 1978, ano em que morreu durante o Grande Prêmio da Itália. O belga Jacques Bernard Ickx também não conseguiu ser campeão na F1 ficando com segundos lugares nos campeonatos de 1969-1970.

Com o fim da temporada deste ano surge um outro candidato a ficar nesta última lista: Valtteri Bottas. Com dois vice-campeonatos em 2019-2020, o finlandês vai ter que acelerar muito em 2021 para subir no degrau mais alto da F1. Todos os pilotos citados, no entanto, merecem respeito e provaram que são dignos de estarem entre os melhores da F1.

Ser campeão é, também, contar com uma grande escuderia e com a sorte de não ter o melhor entre os adversários; é conseguir permanecer vivo e não enfrentar imprevistos nos momentos mais delicados. Viva os vice-campeões da Fórmula 1!

Para conhecer mais:

PANDINI, Luiz Alberto. Entrevista por telefone em 10 de dezembro de 2020.

Ressaca F1: Os 44 vice-campeões da F1 (1950 – 2019). Disponível em:      https://www.youtube.com/watch?v=pak6OD7bpXE&vl=pt. Acesso em: 12 dez. 2020.

Statsf1: Pilotos: Disponível em: https://www.statsf1.com/pt/stirling-moss.aspx

https://www.youtube.com/watch?v=pak6OD7bpXE&vl=pt. Acesso em: 12 dez. 2020.

Statsf1: Vice-Campeão: Disponível em: https://www.statsf1.com/pt/statistiques/pilote/champion/vice-champion.aspx. Acesso em: 10 dez. 2020.

Marcelo Cardoso é jornalista e professor universitário. Pesquisa o jornalismo, o rádio e o podcast em suas várias interfaces com o esporte – contato: Facebook, Instagram @cardosomarcelo68 e Twitter @MCardoso68