O ‘jogo limpo’ no esporte: uma conduta que merece prêmio – Parte II

Por Marcelo Cardoso

Brasileiros são premiados pelo espírito esportivo

Na última edição desta coluna comentamos que as boas práticas no esporte são premiadas como estímulo ao fair play e ao espírito esportivo nas competições. Entre os brasileiros agraciados com esta honra internacional há um aviador, um cavaleiro, um maratonista, uma pentatleta e jovens esgrimistas.

O primeiro brasileiro a receber um diploma olímpico foi Alberto Santos-Dumont, o inventor do avião, em 1905, em Bruxelas, na Bélgica. E você deve se perguntar: qual a relação do pai da aviação com o esporte? O aviador brasileiro participava de competições esportivas aéreas, já naquela época, e tinha um comportamento destemido, respeitoso e qualidades atléticas.

Foi o próprio Pierre de Coubertin, fundador dos Jogos Olímpicos Modernos, quem propôs a criação do prêmio. Santos-Dumont sempre foi ligado à prática esportiva – no Brasil ou na França – e gostava de esquiar, de jogar tênis e golfe e de participar de competições a cavalo.

Cavaleiro é exemplo de espírito esportivo

O cavaleiro Rodrigo Pessoa recebeu o Diploma Pierre de Coubertin World Fair Play 2010. A premiação ocorreu pela boa conduta e pode ter lhe custado uma medalha em um dos eventos mais importantes do hipismo mundial. O brasileiro tem três medalhas olímpicas, sendo uma de ouro (Atenas, 2004), e é campeão mundial e tricampeão da Copa do Mundo de Hipismo.

Na final dos Jogos Equestres Mundiais, Pessoa lutava com três cavaleiros pelo ouro na categoria Individual. Apenas os três primeiros são premiados. Na última etapa cada cavaleiro monta o cavalo do adversário. O jovem saudita Abdullah Sharbatly estava no cavalo do brasileiro e, por ter bem menos experiência, se aconselhou com ele.

Pessoa o orientou a como cavalgar e sobre os níveis de dificuldade do percurso.  Sharbatly conquistou a medalha de prata e o brasileiro ficou em quarto lugar, sem prêmio. O gesto de Rodrigo Pessoa, porém, foi reconhecido pelo Comitê Internacional do Fair Play pelo ato de boa conduta esportiva e deve servir como exemplo para outros competidores.

Persistência rende duas medalhas para Vanderlei Cordeiro de Lima  

Em 2004 o incidente que envolveu o brasileiro Vanderlei Cordeiro de Lima ganhou repercussão mundial. O atleta liderava a maratona, última prova dos Jogos Olímpicos de Atenas, quando foi agarrado pelo irlandês Cornelius Horan. O invasor da competição o empurrou e o segurou por alguns segundos.

Lima foi liberado por um torcedor, o ex-atleta grego Polyvios Kossivas, para chegar em terceiro lugar e conquistar a medalha de bronze. O brasileiro entrou no Estádio Panatenaico, local onde se encerrou a prova, e imitou um avião, com os braços abertos, enquanto corria. Foi efusivamente aplaudido pelo público.

Por ter continuado e persistido depois da agressão, Vanderlei Cordeiro de Lima recebeu do Comitê Olímpico Internacional a medalha Pierre de Coubertin.           

Pentatleta é premiada por “gesto corriqueiro”

A pentatleta Stephany Saraiva recebeu o Diploma de Ato de Fair Play de 2016 pela sua conduta no Campeonato Pan-Americano de Pentatlo Moderno, disputado um ano antes, na Argentina. Durante a prova de esgrima o sensor, que acusa quando a espada encosta na atleta, acendeu a favor da brasileira.

O árbitro atribuiu o ponto, mas Stephany alertou que o sensor fora acionado de forma incorreta. O juiz retrucou, mas não houve jeito, a atleta estava firme na decisão e o movimento teve que ser repetido. A adversária era Isabel Brand, da Guatemala.

A atitude foi reconhecida pelo Comitê Internacional do Fair Play que atribuiu à brasileira o diploma. A pentatleta declarou, na época, que falar a verdade não deveria ser um ato heroico, mas um gesto corriqueiro. As modalidades que integram o pentatlo moderno são: natação, esgrima, hipismo e laser-run (tiro esportivo com pistola-laser alternado com corrida).

Atitude cavalheiresca deve começar cedo

Entre os jovens o exemplo de espírito esportivo pode começar cedo. O esgrimista Guilherme Murray tinha apenas 12 anos, em 2014, quando disputou o Campeonato Pan-americano Juvenil da modalidade. Demonstrando honestidade, o atleta relatou para o árbitro que não marcara o ponto.

Foi uma situação parecida com a que viveu a pentatleta Stephany Saraiva. O juiz anulou a pontuação e isso impediu Murray de seguir às quartas de final do campeonato. O esgrimista, porém, recebeu o Diploma Mundial de Fair Play para a Juventude, concedido pelo Comitê Internacional do Fair Play. Murray tem títulos de campeão brasileiro e sul-americano infantil na modalidade ‘esgrima’. 

Para conhecer mais:

International Fair Play Committee, 2017. Disponível em: <http://www.fairplayinternational.org/home>.  Acesso em: 31 jan. 2021.

Rede Nacional de Esporte. Stephany Saraiva. “O Fair Play deveria ser uma coisa rotineira”, 2017. Disponível em: https://medium.com/min-esporte/o-flair-play-deveria-ser-uma-coisa-rotineira-ac5a4bbc3d38. Acesso em: 30 jan. 2021.

Rede Nacional do Esporte. Esgrimista brasileiro recebe prêmio internacional por Fair Play, 2016. Disponível em: http://www.rededoesporte.gov.br/pt-br/noticias/esgrimista-brasileiro-recebe-premio-internacional-por-fair-play. Acesso em: 25 jan. 2021.

Santos-Dumont, aviador esportista: o primeiro herói olímpico do Brasil.  (Lamartine da Costa; Ana Miragaya), p.21-22, 2016. Disponível em: http://sportsinbrazil.com.br/livros/santos_dumont_heroi_olimpico_brasil.pdfAcesso em: 29 jan. 2021.

UIPM – World Pentathlon. Twitter, 2020. Disponível em: https://twitter.com/WorldPentathlon/status/1301487403107057664?s=20. Acesso em: 27 jan. 2021.

World Fair Play Awards Winners. In: International Fair Play Committe. Disponível em: http://www.fairplayinternational.org/award-winners-search. Acesso em: 27 jan. 2021.

Marcelo Cardoso é jornalista e professor universitário. Pesquisa o jornalismo, o rádio e o podcast em suas várias interfaces com o esporte – contato: Facebook, Instagram @cardosomarcelo68 e Twitter @MCardoso68