São Paulo (AUN - USP) - “A gente tinha bons jogadores, mas jogava na segunda divisão do campeonato. Faltava equipamento, chuteira de marca, bola, estádio. Com o Soar temos meios para jogar na 1ª Divisão dos pesquisadores em astronomia”. É assim que o professor João Steiner, do Departamento de Astronomia do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas – IAG/USP, descreve o efeito do telescópio Soar na astronomia brasileira. O telescópio teve seu comissionamento concluído recentemente e em pouco tempo estará trabalhando a todo vapor.
Soar é sigla de Southern Observatory for Astrophysical Research – Observatório do Sul para Pesquisa Astrofísica. O Brasil, representado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq é um dos sócios que pagaram mais de US$ 30 milhões para construi-lo no deserto do Atacama, a 2.800 metros de altitude.
A oportunidade surgiu em 1992. O Brasil tinha ingressado numa parceria de outro telescópio, o Gemini, mas tinha direito a somente 2,5% das noites úteis à observação. Foi proposto ao professor Steiner, na época membro da comissão diretora do Gemini, que o Brasil substituísse a Universidade de Columbia em um novo telescópio de quatro metros a ser construído no Serro Pachón.
Caberia ao Brasil pagar metade do custo inicial da construção do telescópio. O CNPq desembolsou US$ 12 milhões e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – Fapesp liberou US$ 2 milhões para financiar a construção do telescópio. Os outros sócios do Brasil, Universidade Estadual de Michigan, a National Science Foundation e a Universidade da Carolina do Norte arcariam com o restante do montante e com 82% dos custos da manutenção do telescópio pelos próximos 20 anos de uso. Possivelmente, o telescópio só se tornará obsoleto daqui a 20 anos.
Além disso, o Brasil teve poder de escolha em qual seria a função do telescópio. Os aparelhos e espelhos do Soar servem às especificidades da pesquisa em astronomia brasileira, que já corresponde a 2% da produção mundial, e é considerada pioneira no estudo das estrelas binárias. O desenho foi de responsabilidade do físico brasileiro Gilberto Moretto.
Todos os pesquisadores do país podem usufruir do telescópio. No caso dos que estão no IAG-USP, o deslocamento para as instalações do Soar não é necessário. Há no Bloco E do instituto computadores ligados a WEB 2.0 que permitem radiocontrole do telescópio e captação de seus dados.
Porém, a outros pesquisadores a viagem ao Chile não ficará desconfortável. Próximo ao Soar existe um complexo de instalações, com bibliotecas, hotel, hospital e oficinas, que servem o telescópio e quem nele trabalha. Essa cidade não foi construída com dinheiro brasileiro. As entidades norte-americanas, que possuem outros telescópios pela área, a cederam de graça para nossos cientistas.
Existem nessa região dos Andes Chilenos mais de dez telescópios que são consórcios da mesma maneira que o Soar. O Chile, por ceder o território, recebe 10% do tempo útil, enquanto o Brasil, por suas despesas com a construção que durou doze anos, tem direito a 34% das noites do Soar.
Apesar disso, ainda faltam ajustes para dar início a seu pleno funcionamento. O comissionamento do telescópio, que incluía uma série de testes para checar se tudo que foi montado estava funcionando corretamente, acabou recentemente. Alguns trabalhos até já foram feitos e publicados utilizando observações do telescópio. Um grupo de pesquisadores, com alguns brasileiros dentre eles, localizou a explosão mais antiga do universo através dele.
Entretanto, ainda falta terminar o comissionamento da aparelhagem auxiliar do telescópio, que consta diversos itens como o espectrógrafo e mais de 500 computadores.
Espera-se que a produção científica dos astrônomos brasileiros aumente muito quando o comissionamento estiver finalizado. Já ultrapassamos países com uma ampla tradição em astronomia como o México, que produz 0,9% da pesquisa mundial.