São Paulo (AUN - USP) - Graduado em psicologia e especializado em saúde do trabalhador pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Luis Eduardo Lacorte concluiu, em 2012, o mestrado na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP/USP) com uma pesquisa sobre estratégias de erradicação do trabalho infantil adotadas no município de Limeira, no interior de São Paulo. A cidade, que é um dos principais pólos de produção de joias e bijuterias do país, concentra também um alto índice de exploração de mão-de-obra infantil e adolescente.
Segundo dados apresentados na pesquisa de Lacorte, 27% dos alunos das escolas estaduais localizadas em Limeira trabalham na montagem ou solda de bijuterias e joias. Essa porcentagem equivale a um contingente de 8.340 indivíduos expostos à realização de tarefas repetitivas e a um conseqüente risco para a saúde física e psicológica. Devido à constatação dessa realidade foi criada no município a Comissão Municipal de Erradicação do Trabalho Intantil de Limeira (Cometil), entidade cujas atividades foram objeto de investigação de Lacorte no período entre 2007 – ano de sua criação – e 2010.
Segundo o psicólogo, o trabalho infantil e o trabalho adolescente desprotegido são fenômenos que se caracterizam por atingir principalmente indivíduos pertencentes às classes sociais mais desfavorecidas. “Essas crianças e adolescentes sobrevivem em ambientes socioculturais e laborais pouco favoráveis ou agressivos ao seu desenvolvimento, além de serem expostos a situações de vulnerabilidade social inadmissíveis para os padrões de uma sociedade próspera e democrática”, afirma.
O pesquisador explica, evocando a abordagem sócio-histórica proposta por Lev Vygotsky, que o processo do desenvolvimento humano se dá nas relações entre cada indivíduo com o meio e com os outros. “O desenvolvimento não é determinado apenas por processos de maturação biológicos ou genéticos. O meio envolve cultura, sociedade, condições socioeconômicas, práticas e interações que são determinantes no desenvolvimento humano”, esclarece. Tal constatação permite compreender a importância do ensino e do ato de brincar como ferramentas para a assimilação da cultura – no sentido mais amplo da palavra – e das “regras sociais” pelo indivíduo em formação.
Lacorte conta que, ao longo da pesquisa, foi possível sistematizar um quadro com os prejuízos que podem ser provocados pelo trabalho infantil e pelo trabalho adolescente desprotegido. Tais prejuízos foram classificados como físicos – risco de lesões, deformidades, intoxicação, acidentes e interferências no ciclo do sono –, cognitivos – maior incidência de repetência, abandono escolar e desinteresse –, emocionais – possibilidade de desenvolvimento de síndromes psicológicas, dificuldades no estabelecimento de vínculos afetivos e maior passividade frente às relações verticais de poder – e sociais – falta de tempo para o estudo e o lazer, convívio reduzido com pessoas da mesma idade e diminuição das possibilidades de um bom posicionamento no mercado de trabalho na vida adulta.
De acordo com o autor, o trabalho infantil e o trabalho adolescente desprotegido são causados pela desigualdade social, mas, ao mesmo tempo, reforçam e sustentam a manutenção e o agravamento dessa desigualdade, dificultando a mobilidade social e impedindo a superação da condição de pobreza. “Um projeto de democracia está longe do seu ideal se a criança se vê obrigada a trabalhar para poder exercer os seus direitos”.