ISSN 2359-5191

01/02/2016 - Ano: 49 - Edição Nº: 5 - Saúde - Faculdade de Saúde Pública
Inserção da agricultura familiar no cardápio escolar exige maior engajamento público
Hoje, 30% da renda repassadas aos estados e municípios devem ser usadas na compra de alimentos produzidos por agricultores familiares
Foto: Pedro Bolle /USP Imagens

Construir um cardápio repleto de frutas, verduras e legumes provenientes da agricultura familiar é um dos desafios do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Essa iniciativa existe há seis anos e surgiu com a lei 11.947-2009. Ela determina que 30% da renda repassadas pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para o PNAE devem ser usadas na compra de alimentos produzidos por agricultores familiares. Orientada pela professora Betzabeth Slater Villar, a pesquisadora  Claudia Rodríguez, da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, realizou um estudo para avaliar os fatores envolvidos na implantação dessa proposta. Segundo ela, muitas vezes, falta um comprometimento do órgão de agricultura dos municípios que pode prejudicar uma adesão maior ao programa.

Para Claudia, é necessário que o gestor da alimentação implante ações além daquelas estipuladas na lei. Uma das questões levantada por ela é a dificuldade financeira enfrentada pelos fornecedores em transportar os alimentos. A legislação não garante o pagamento do frete a esses profissionais. Isso exige que eles já tenham um investimento significativo para participar do programa. De acordo com a nutricionista, quando a prefeitura ajuda no transporte desses produtos há uma aderência maior dos agricultores. Conforme o estudo, 64% dos municípios apoiaram os agricultores familiares na entrega e logística dos alimentos.

Abrir as portas para entrada dos produtos do campo nas escolas não é uma tarefa fácil. As cozinhas devem estar preparadas para receber os alimentos hortifrutigranjeiros. Eles precisam ser manipulados em condições diferentes daqueles prontos e semi-processados. Assim, são necessárias estruturas específicas de refrigeração e armazenamento. Entretanto, a pesquisadora, ao conversar com as nutricionistas, identificou que apenas 36% dos municípios tinham todas as escolas em condições adequadas para receber esses alimentos.  

Obstáculos no caminho

Levar a lei para sala de aula é uma das principais formas de tornar o programa mais próximo do seu público. Claudia menciona que há pouca divulgação dessa iniciativa com a comunidade escolar. Seria importante discutir, em aulas, a importância dos alimentos produzido na região que, muitas vezes, podem ser da plantação dos pais ou parentes dos alunos. Isso valoriza os hábitos regionais. É preciso “empoderar a população”, ressalta a pesquisadora.

Embora conheçam a lei, muitos agricultores possuem dificuldade de compreendê-la integralmente. Para participar do programa, os produtores não participam de uma licitação, mas, sim, de uma chamada pública. Ela é uma forma mais simples de venda de alimentos ao estado, mas ainda gera muitas dúvidas. Na chamada pública, são selecionadas propostas específicas para aquisição de gêneros alimentícios e os preços já são previamente estabelecidos pela Entidade Executora do processo.

Segundo a nutricionista, os agricultores relatam que carecem de apoio no acompanhamento e formalização dos documentos. Para se vincularem ao programa, eles devem possuir uma Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP). Muitas cidades relatam que não compram alimentos agrícolas pelo fato desses profissionais não estarem com sua atividade regularizada, aponta Claudia. Nos municípios maiores, é mais difícil de vender, pois os produtores necessitam de um maior investimento, por causa da demanda, assim precisam estar mais organizados.

Foto: Marcos Santos/USP Imagens

 

O diálogo com os agricultores

A comunicação entre as nutricionistas das escolas e os agricultores para a construção de um cardápio contendo produtos produzidos regionalmente é muito importante, explica a pesquisadora. Durante o estudo, o grupo de pesquisa se deparou com respostas muito divergentes quanto a esse diálogo. As profissionais da nutrição relataram que conversaram com os produtores, porém esses falaram que não foram contatados.

De acordo com Claudia, é essencial que a entidade da agricultura (Secretaria da Agricultura ou Casa da Agricultura) do município esteja envolvida nesse processo de comunicação com os agricultores. Esse órgão conhece a produção local e pode identificar os alimentos para o nutricionista incluí-los no cardápio escolar. Quando eles apoiam, a gestão do programa é muito mais fácil, destaca a pesquisadora.

Quanto à qualidade dos alimentos, muitos dos nutricionistas relatam que os alimentos provenientes da agricultora familiar cumprem a maioria dos requisitos exigidos na chamada pública, sendo qualificados como muito bons. Eles também afirmam que se houver algum problema com o produto, os agricultores conseguem fazer as trocas e solucionar os problemas. Conforme os dados do estudo, em 92% dos municípios a qualidade dos alimentos é avaliada como ótima ou boa.

Segundo a pesquisadora, o uso de mapas adquiriu um protagonismo muito expressivo neste estudo. A partir deles, foi possível identificar que muitos dos municípios que não conseguem comprar os alimentos estão próximos de regiões com agricultores familiares. Assim, não e uma questão de falta de oferta, mas, sim, de um comprometimento maior dos gestores do município quanto a essa questão. “Não é o agricultor que não consegue vender é o município que não consegue comprar”, conclui Claudia.

Leia também...
Nesta Edição
Destaques

Educação básica é alvo de livros organizados por pesquisadores uspianos

Pesquisa testa software que melhora habilidades fundamentais para o bom desempenho escolar

Pesquisa avalia influência de supermercados na compra de alimentos ultraprocessados

Edições Anteriores
Agência Universitária de Notícias

ISSN 2359-5191

Universidade de São Paulo
Vice-Reitor: Vahan Agopyan
Escola de Comunicações e Artes
Departamento de Jornalismo e Editoração
Chefe Suplente: Ciro Marcondes Filho
Professores Responsáveis
Repórteres
Alunos do curso de Jornalismo da ECA/USP
Editora de Conteúdo
Web Designer
Contato: aun@usp.br