ISSN 2359-5191

02/08/2016 - Ano: 49 - Edição Nº: 95 - Sociedade - Escola de Comunicações e Artes
Não há mais uma única liderança na sociedade em rede
Alternância de poder e liderança é característica da sociedade de hoje
Bandeiras e cartazes rejeitando a presença de partido nas manifestações de julho de 2013 indicavam a ausência de uma liderança única (Imagem: Michel Filho/Agência O Globo)

Desde as manifestações populares ocorridas em 2013, procura-se um indivíduo ou um grupo que lidere esses movimentos. Em sua tese de doutorado pela Escola de Comunicações e Artes da USP (ECA/USP), a pesquisadora Maíra Bittencourt procurou entender como se estrutura o poder, a hegemonia e a liderança na sociedade de hoje a partir de uma releitura da obra “O Príncipe”, de Nicolau Maquiavel.

Em seu livro O Príncipe, de 1513, Maquiavel escreve sobre como um príncipe deve agir para garantir a segurança e o bem-estar de sua população (Imagem: Obvious)

Em seu livro O Príncipe, de 1513, Maquiavel escreve sobre como um príncipe deve agir para garantir a segurança e o bem-estar de sua população (Imagem: Obvious)


Essa atualização, que serviria para compreender a sociedade atual sob o contexto da era digital, dá origem à sua teoria do Príncipe Digital. De acordo com esse novo conceito, o poder e a liderança não estariam mais na figura de um único indivíduo, mas pulverizadas em quatro setores: a Multidão de Anônimos, os Líderes de Opinião, os Poderes Políticos e Econômicos e as Comunidades Virtuais Organizadas.

Para descrever teórica e empiricamente o Príncipe Digital, além de identificar qual é sua influência no contexto da sociedade em rede, Maíra usou uma metodologia que parte da pesquisa de campo e resulta em uma teoria com base no que foi coletado. “Primeiro fiz a ida ao campo e, dessa ida, fui criando categorias e sistematizando dados que sustentam a análise teórica”, explica.

O primeiro passo dessa parte empírica consistia em um questionário, aplicado em 25 estados das cinco regiões brasileiras. Nele, procurava-se identificar como se deu a convocação das pessoas para manifestações populares ocorridas entre 2013 e 2015, bem como seus líderes. Por fim, uma análise dos dados investigava qual conteúdo era produzido pelos líderes de opinião indicados e qual meio de comunicação eles utilizavam.

A pesquisa mostrou que as pessoas não têm mais fidelidade a um único líder. Nos questionários, foram citados 354 nomes de comunicadores diferentes. “Chamamos isso de uma alternância de lideranças, em que ora um convoca, ora é outro, mas não existe uma fidelidade”, aponta Maíra. “As pessoas estão mais interessadas no conteúdo que está sendo falado e não ao que aquela pessoa é”.

Além disso, esperava-se que a maioria citasse comunicadores sem formação jornalística. Entretanto, a pesquisa mostrou o contrário: entre os 15 nomes mais citados como formadores de opinião, dez deles são jornalistas, alguns de veículos tradicionais e outros da própria internet. “É uma coisa bem interessante, porque há muito tempo se questiona a importância do jornalismo e a própria população mostrou o contrário”.

Foi observado também que o espaço em que as pessoas mais se atualizam acerca do que está acontecendo e em que mais são convocadas para manifestações é o Facebook. Os blogs e sites de notícias aparecem como um espaço de aprofundamento do conteúdo visto na rede social e plataformas como o YouTube são mais utilizadas para o entretenimento.

Facebook é o local em que as pessoas mais são convocadas para atos populares (Imagem: BlogPop)

Facebook é o local em que as pessoas mais são convocadas para atos populares (Imagem: BlogPop)

As pessoas estão mais ligadas nas redes sociais principalmente por conta dos laços fortes, isto é, as pessoas de relacionamento próximo que estão presentes nessas plataformas. A presença dos líderes de opinião aparece em segundo plano. Uma mostra disso é o fato de a comunicação dirigida, seja via aplicativos de mensagens instantâneas, como o WhatsApp, ou ainda telefone e e-mail, ainda ser bastante presente.

Este fenômeno revela que as pessoas estão mais interessadas em opiniões parecidas com as delas ou que são validadas por seus amigos do que em ideias expressadas por um líder. Isso é comprovado pela grande quantidade de líderes citados e pela pouca fidelidade a um único comunicador, já que as pessoas indicavam nomes diferentes para momentos distintos.

Quando questionadas sobre o porquê de elas gostarem de determinado comunicador, os entrevistados respondiam “Aborda os temas de forma inteligente” e, na sequência, “Tem ideias semelhantes às minhas”. Por último, “É uma pessoa influente”. Segundo Maíra, isso comprova que ser uma pessoa influente, ter um papel de destaque ou ser a liderança de um determinado veículo não importa muito nos dias de hoje.

Livro sobre o trabalho será lançado

Maíra lançará em setembro um livro sobre o tema de sua tese de doutorado. “O foco dele será uma linguagem mais leve do que a da tese, trazendo todos os dados, os gráficos e a parte mais voltada à comunicação”, explica. O livro será lançado em português e em inglês e contará com um prefácio de autoria do orientador da pesquisa, o professor Eugênio Bucci.
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