ISSN 2359-5191

16/08/2016 - Ano: 49 - Edição Nº: 103 - Sociedade - Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas
Tese analisa contextos de duas gerações de executivos negros
Estudo de Antropologia Social da FFLCH mostrou a inserção de negros no mundo corporativo
Segundo dados do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) de 2013, o número de negros empresários cresceu 28,5% em 10 anos; relatório Ethos ainda aponta cifra ínfima. (Fonte: Associação Comercial e Industrial de Mauá)

A comparação de trajetórias profissionais de duas gerações de executivos negros de São Paulo, uma dos anos 70 e outra do início do século XXI, é o tema do doutorado do pesquisador Pedro Jaime Coêlho Júnior. A tese, que vai virar livro pela Edusp ainda neste ano, revela como os comportamentos do movimento negro e do mundo empresarial se alteraram ao longo do tempo e influenciaram as relações raciais no trabalho.

“Existiam pesquisas na linha de investigar profissionais liberais negros, mas não a questão racial no mundo empresarial”, destaca Coêlho. “Esta tese foca uma área que não é tradicionalmente tematizada pela sociologia ou antropologia.”

Segundo ele, o estudo agrega à discussão de discriminação e serve de fonte de consulta histórica, contendo entrevistas e relatos sobre as condições de profissionais negros em diferentes épocas. Ela contribui, por assim dizer, para a pesquisa dos agentes envolvidos, sejam lideranças empresariais ou negros que estão no mundo das corporações, além de RHs de empresas, que podem tomá-la como referencial para reflexões raciais no mundo do trabalho.

As faces das gerações

Os negros analisados na primeira geração foram provenientes do segmento empresarial e tem hoje mais de 50 anos, enquanto os da segunda, com mais de 20, são do segmento bancário - um setor, segundo diz o pesquisador, de delicada tensão em relação a questões do tipo desde episódio acontecido há 13 anos.

Coêlho expõe que, em 2003, o Instituto de Advocacia Racial e Ambiental (IARA), com o apoio da Federação Nacional dos Advogados (FENADV) e ONGs provenientes do movimento negro (como Geledés e Educafro), apresentou ao Ministério Público do Trabalho (MPT) de Brasília uma representação que, apoiada em matérias publicadas na imprensa, denunciava a desigualdade racial no mercado de trabalho. O parecer afirmava que bancos praticavam discriminação racial e, assim, foi pactuada uma política de incentivo à diversidade nesses ambientes, o que criou um cenário favorável aos jovens desse período. “Isso também se deve", pontua ele, "a um contexto de globalização, de políticas transnacionais, como as que já existiam nos Estados Unidos e em outros países”.

Por outro lado, sob o regime militar e pela desorganização da sociedade civil, Coêlho afirma que o movimento negro não contribuiu para a ascensão dos jovens da primeira geração. “Esse grupo se construiu, sobretudo, de estratégias individuais, de pessoas que isoladamente construíram suas trajetórias no mundo empresarial”, observa ele. A postura contrasta com o comportamento da segunda geração, que, já no começo dos anos 2000, adentrou o mercado de trabalho mediante maior presença do movimento negro e de ONGs.

“A segunda geração é fruto da ação coletiva, pois entra no mundo empresarial através de respostas que as empresas estavam dando a pressões que aconteciam no contexto sociopolítico”, argumenta ele.

pesquisaethos

Negros são 5,3% em cargos executivos, seis vezes menos que em posições funcionais. (Fonte: Relatório Ethos de 2010)

Blindagem contra a discriminação

De acordo com o doutor, pela então branda atuação do movimento negro, a geração dos 70 tinha ainda maiores dificuldades de se defender das discriminações. Desta forma, ela se blindava para não ver o racismo ou não adotava estratégias conflitivas para enfrentar situações que “não podia deixar de enxergar”.

“A pessoa aprendia que, para ascender na carreira, não podia partir pro confronto, mas, sim, ficar calada”, diz ele. Deste modo, os jovens da década de 70 cresceram de costas para o movimento, sem ter seus interesses contemplados.

Outro fator que explica o distanciamento dos negros dessa geração com o movimento tem a ver com o marxismo assimilado pelo movimento, que julgava o racismo como uma expressão da sociedade de classes e, assim, punha de lado indivíduos que procuravam ascender socialmente. Apenas depois, pela acomodação das empresas à gestão de diversidade racial e com mudanças na agenda do movimento negro, foram incorporadas pautas como inclusão racial, políticas de ação afirmativa e redução das desigualdades raciais, que não entram em choque com o capitalismo.

Segundo dados do relatório Ethos de 2010, negros contabilizam, em números absolutos, 62 dos 1.062 executivos nas empresas avaliadas, ou, percentualmente, 5,3%. O Sebrae, em pesquisa mais recente, de 2013, admite que o número aumentou em quase 30% na última década, embora continue a ser pequeno.



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