Nos textos rosianos, os pronomes desempenham funções que ultrapassam aquelas referências mais
frequentemente previstas pelo sistema da língua, revestindo-se de uma carga expressiva emanada pelo próprio texto. Os pronomes demonstrativos - adjetivos ou substantivos - e os pronomes adverbiais adquirem significados diferenciados, dependendo da relação que estabelecem com a instância discursiva. Em relação aos pronomes demonstrativos, examinaremos a indicação espacial expressiva em "este", "esse", "aquele" e "aquilo". Já em "lá", marcador do espaço fora da cena enunciativa, analisaremos a especificidade semântica desse dêitico, indicador de um espaço suprarreal, que denominamos de mágico-poético.
Responsável pela arquitetura narrativa de Grande sertão: veredas, o narrador Riobaldo conduz o jogo dialógico de modo a criar um vaivém discursivo que possibilita a detecção pontual de segmentos pertencentes à ordem do discurso e à ordem da história (respectivamente, mundo comentado e mundo narrado, segundo Harald Weinrich). Permeando um e outro mundo, estão as obsessões fundamentais do narrador, das quais destacamos aquela relativa à existência ou não do diabo. As ambiguidades derivadas desse movimento oscilante entre o ser e o não-ser provocam ainda o deslizamento entre o real e o irreal, o dito e o não-dito, o aparente e o oculto, o dado e o suposto. A coerência, no entanto, é reconstituída no alinhavado constante de vários recursos argumentativos que buscam a adesão do interlocutor, cuja voz só é entre ou vida pela voz do narrador. Nesses casos, verificamos a presença do recurso ao argumento de autoridade, seja pela competência, seja pela experiência, seja, ainda, pelo testemunho. É, pois, nesses momentos de interlocução semiexplícita, na instância da enunciação, que se apresentam, com maior nitidez, elementos linguísticos denunciadores das estratégias argumentativas que provocam e incitam o interlocutor/leitor a acompanhar esse "narrar dificultoso” e a finalmente concordar que “O diabo não há!... Existe é homem humano”.