A partir da correlação estabelecida por Gianfranco Contini e Giorgio Agamben a propósito da poesia de Pascoli entre uma “língua morta” e onomatopeia, o presente ensaio pretende reler o problema da legibilidade no conto “Meu tio o Iauaretê” de Guimarães Rosa, argu- mentando que a sobreposição indistinta entre tupinismos e onomatopeias que pauta a língua de onça do narrador é o ponto extremo de uma poética da ilegibilidade que atravessa toda a obra de Guimarães Rosa.
Meu primeiro contato com Clara Rowland aconteceu quando, em 2014, pleiteava eu uma bolsa de doutorado sanduíche na Universidade de Lisboa e, como a pretendia como tutora/co-orientadora,
apresentava-lhe um projeto de investigação sobre a escrita da violência em Rosa e que tentava unir este a Derrida, a bolsa não vingou, mas o contato e o projeto, estes, sim. Na entrevista que se segue, conversamos sobre a recepção, ou (não)recepção da literatura de Rosa e da literatura brasileira em Portugal, mas, principalmente, sobre um modo diverso de se ler e receber o texto rosiano. Deixemos, pois, falar o diálogo.
Este trabalho propõe uma leitura da obra de Guimarães Rosa de Corpo de Baile (1956) até Estas Estórias (1969), construída sobre a articulação entre duas dimensões, o livro e a narração. Interroga-se o modo como estes textos colocam em relação, na tensão entre escrita e oralidade que está na sua base, a representação do acto narrativo e a reflexão sobre a construção do livro em função de um questionamento da forma e da legibilidade. Descreve-se a resposta que a organização dos livros de Rosa oferece a problemas de representação e referência, através de uma atenção ao paratexto e à edição, e discute-se a releitura e a parábase como figuras da problematização da leitura.