Neste artigo propomos leituras do Grande Sertão: veredas, de João Guimarães Rosa, e dos poemas homéricos, mais especificamente a Ilíada, com performances dialetais diferentes. Nosso intuito será comprovar (a partir de rotacismos, apócopes, aféreses, síncopes etc.) a amplificação de sentido que advém dessas alterações fonéticas no contexto das obras em foco como um todo. Visamos ao estudo dos metaplasmos como mecanismo que flexibiliza o texto poético e que lhe faculta a dinamicidade, a espacialidade cultural e a fugacidade do oral. Com o recurso de potencializar metaplasmos, o texto ganha novos sentidos no tempo e no espaço. Recuperam-se as estratégias de oralidade do português brasileiro e, através delas, projetam-se aquelas da chamada ‘língua morta’ de Homero.
Vamos comentar trechos da obra maior de João Guimarães Rosa, o Grande sertão: veredas, para refletir sobre o processo de construção das múltiplas identidades brasileiras a partir da literatura. Buscaremos o germe da ideia de identidade no mundo grego aristotélico, a saber, a ação de ler, ver e reconhecer: a anagnórisis/ ἀναγνώρισις. Em outros termos: indagamos o porquê de, no Brasil, nos colocarmos a estudar a língua e a literatura gregas. Uma das respostas possíveis está na literatura de João Guimarães Rosa, que, a partir do modelo grego, aprimora e supera a prática literária da anagnórisis registrada em Homero. Para isso os gregos e Guimarães Rosa serão nossa base.
O artigo pretende discutir a potência de uso dos metaplasmos em textos literários. Eles são vistos como instrumento para quebrar preconceitos culturais e linguísticos. A discussão avaliará o uso do recurso em dois autores: João Guimarães Rosa (Grande Sertão: Veredas) e Homero (Ilíada). Vamos realçar a riqueza do processo no sentido de ver tais alterações como componentes do panorama linguístico de uma nação. Sugerimos que reproduzir esteticamente a diversidade de uma comunidade linguística é ato político. Durante a discussão, utilizamos metaplasmos para, na tradução de trechos da Ilíada, ensaiar o que chamamos de fantasias metaplasmáticas.