A crítica sobre a obra de Guimarães Rosa assumiu diferentes perspectivas no decorrer dos anos, da estilística à sociológica. No interior desta tradição crítica ocorreram alguns deslocamentos conceituais que ilustram o processo recepcional descrito por Jauss, em obras como Pour une hermenéutique littéraire ( 1988). Nesse contexto, o exame da recepção critica da obra “Dão- Lalalão”, de Guimarães Rosa, permite indicar o deslocamento do conceito de alegoria. Assim, de uma leitura mítico- religiosa à sócio- histórica, a alegoria de “Dão- Lalalão” serviu a diferentes horizontes de interpretação, evidenciando, assim, a dinâmica estético- recepcional postulada pela teoria jaussiana.
A criação de novas palavras é comum no processo de escrita de João Guimarães Rosa. Os neologismos que estruturam as obras do autor mineiro surgem da linguagem sertaneja, da reprodução de sons ouvidos e imaginados ou mesmo da combinação de raízes pertencentes a outras línguas. Isto se deve ao fato de que Rosa, além de poliglota, era atento ouvinte das conversas desenvolvidas no sertão mineiro. Na maioria das vezes, descobrir a origem de suas inventivas palavras favorece a compreensão das narrativas nas quais estão inseridas, e esse é o propósito das investigações do presente artigo, que busca uma conceituação da expressão Dão-lalalão – título para uma das novelas de Corpo de Baile. Para a construção de um conceito para o termo, será considerada a intertextualidade com a novela A estória de Lélio e Lina (2016), bem como a possibilidade de relação com antigas raízes da língua hebraica, cujo sentido emerge em narrativas bíblicas. No decorrer da investigação, será fundamental a percepção de que o significado de Dão-lalalão estende-se sobre as personagens principais da novela, Doralda e Soropita, justificando suas atitudes e personalidades. Este estudo, portanto, além de oferecer uma reflexão detalhada sobre o título de Dão-lalalão (2016), constitui-se também em uma proposta de interpretação para a novela.
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Literatura Brasileira
A presente dissertação estuda a novela Dão-Lalaão, do autor mineiro João Guimarães Rosa. Articula-se a proposta de uma análise estilística do texto com a interpretação de cunho psicanalítico, sobretudo a partir de Freud. Situa-se, primeiramente, a relação entre este estudo e a fortuna crítica da obra selecionada, discutindo aspectos relevantes dos trabalhos de outros estudiosos. Ao abordar a relação entre o foco narrativo e o protagonista e utilizando-se de indicações do próprio Guimarães Rosa presentes em outras obras e em correspondências com seus tradutores, utiliza-se a metáfora do badalar de um sino como homólogo aos movimentos internos e externos de Soropita, sobretudo em torno da questão da manutenção do recalque como forma de preservar sua estabilidade social e pessoal. Esta dissertação reflete ainda sobre uma possível disposição melancólica de Soropita, além de estudar aspectos significativos do amor entre este personagem e sua esposa, Doralda, que mantém relação com a dinâmica do recalque. Aponta-se, por fim, para o caráter cíclico e inconcluso da presente narrativa, como sendo sua marca distintiva, não havendo, no nível do personagem principal, solução possível para seus dilemas. As questões histórico-sociais, pertinentes ao contexto abarcado pela novela, também serão articuladas ao estudo do estilo e à problemática psicanalítica abordada.