Este artigo propõe uma reflexão acerca da linguagem como abertura para novas formas de vida. A partir de um diálogo com a novela “Cara-de-Bronze”, de Guimarães Rosa, e com textos de Wittgenstein, Viveiros de Castro, Beckett, entre outros, busca-se pensar na língua como passagem, como silêncio e como esquecimento. Ao observar a materialidade atuante na escrita performática, o trabalho procura mostrar a linguagem como um espaço de encontro com as diferenças do outro e com a indeterminação da vida. O silêncio não deve ser compreendido como ausência de som, e sim como uma escuta que atenta para os ruídos do mundo ao redor, possibilitando assim o surgimento de outras sensibilidades.
O conto “A terceira margem do rio”, de Guimarães Rosa, está publicado no livro Primeiras Estórias e já recebeu inúmeras leituras críticas, montagens artísticas, performances, foi cantado também por Caetano Veloso e Milton Nascimento. Neste artigo, invertendo o que ocorre no conto, é a perspectiva da escolha do pai que será examinada, em diálogo com a canção “Margem” do músico paulista Beto Furquim que recria essa mudança de ponto de vista; também será estabelecido um diálogo com o conto “Sonho de uma flauta”, de Hermann Hesse. Se essa narrativa pode ser lida como abertura ao contingente e espera angustiante do ponto de vista do filho, é possível pensar que do ponto de vista paterno tal escolha não tenha a mesma dimensão, pelo contrário, o pai mantém-se fiel à sustentação do seu desejo: ainda que o rio e a canoa signifiquem, para ele, a solidão, o silêncio, sua desconstrução, são também a sua jornada. A canção é o barqueiro desta navegação. A partir dela e de sua força lírica, vão se fiando e desfiando os fios do rio que a terceira margem obriga navegar.
O trabalho pretende desenvolver uma reflexão que trate do vigor poético presente no conto
"A terceira margem do rio", de Guimarães Rosa, apontando seu traço de acontecimento
apropriador de verdade, segundo a articulação de silêncio, língua e mundo. Possui o intuito
ainda de promover uma compreensão da linguagem poética do conto que extrapole os
limites linguísticos. Assim, a discussão tenderá para uma abordagem distinta daquelas que
compreendem a linguagem como representação metafísica do real.
O presente artigo tem por objetivo demonstrar como Guimarães Rosa, no conto Páramo, de Estas Estórias, inaugura uma encenação ficcional da melancolia. O texto rosiano vai sofrendo uma gradual condensação à medida que avança e as ressonâncias melancólicas dessa narrativa funcionam como um rigoroso exercício de subtração da escrita em busca do silêncio, dando sequência às "operações subtrativas" de Tutameia.