Este artigo investiga em dois contos de Corpo de Baile, de João Guimarães Rosa, “O recado do morro” e “Cara-de-Bronze” – ambos pertencentes ao volume No Urubuquaquá, no Pinhém (1969) – o problema do mundo, da espacialidade e o lugar da poesia no horizonte da ontologia fundamental do filósofo alemão Martin Heidegger. A investigação divide-se em duas partes: (i) a partir da obra capital Ser e tempo (2011a) e de algumas preleções de 1928 a 1930, como também da década de 1950, trazer para o centro do espaço intervalar entre filosofia e literatura os conceitos de mundo e espaço de Heidegger, bem como a ligação ontológica do ser-aí com a espacialidade – essa própria etapa da investigação justifica ela mesma a sua contribuição para a teoria e crítica literárias, no que concerne a uma teoria do espaço; (ii) examinar o lugar da poesia nos contos: seu efeito (primeiro conto) e sua essência (segundo conto). Neste segundo momento, ao nos apropriarmos de um Heidegger tardio interessado na questão da arte, especialmente na poesia de Hölderlin, sublinhamos o caráter essencial da poesia, para o pensador alemão: fundação (do ser), abertura do mundo, deixar-habitar. Nosso argumento é que entre Heidegger e Guimarães Rosa, o que está em jogo nos contos selecionados é a compreensão da poesia como experiência. Entre o pensador da Floresta Negra e o autor mineiro consolidamos o encontro poesia e mundo, poesia e experiência.
O trabalho pretende desenvolver uma reflexão que trate do vigor poético presente no conto
"A terceira margem do rio", de Guimarães Rosa, apontando seu traço de acontecimento
apropriador de verdade, segundo a articulação de silêncio, língua e mundo. Possui o intuito
ainda de promover uma compreensão da linguagem poética do conto que extrapole os
limites linguísticos. Assim, a discussão tenderá para uma abordagem distinta daquelas que
compreendem a linguagem como representação metafísica do real.
A partir da novela de Guimarães Rosa intitulada “Cara-de-Bronze”, procura-se pensar a arte como uma possibilidade de reaprender a ver o mundo e apresentar essa possibilidade como imprescindível para a unidade da personagem central da narrativa: o fazendeiro Cara-de-Bronze.
Faculdade de Letras. Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas
esta dissertação procura demonstrar de que maneira o escritor João Guimarães Rosa estabelece uma relação de isomorfia entre o mundo natural que perpassa sua obra e a linguagem que o traz à tona. Assumindo um caráter inerentemente metamórfico para a linguagem poética e concebendo a natureza enquanto Gaia, a antiga divindade pré-homérica que existe em consonância com o conceito grego pré-platônico de physis – processo que dá às coisas do cosmos traço permanentemente dinâmico, movente –, o autor mineiro trabalha para desenvolver essas duas premissas em um único e profícuo gesto literário. Como a natureza sob a lógica da physis transforma-se initerruptamente e como a poesia é, dentre inúmeras coisas, uma busca pelo ineditismo na forma da linguagem, Guimarães Rosa pôde forjar a metamorfose telúrica no corpo da sua palavra. Os dois atos confluem e revelam-se o anverso e o reverso de uma mesma realidade. Constrói-se, de tal maneira, um universo muito peculiar onde o binômio linguagemmundo é de fato indissociável. E é a ele que nós nos dedicaremos aqui, tentando
demonstrar pormenorizadamente de que modo, na obra rosiana, a linguagem é mundo e o mundo é linguagem.
O que procuramos quando estamos diante do espelho? O faríamos diante de um espelho sem a imagem que esperaríamos encontrar? Na literatura isso é bastante recorrente. Este trabalho se ocupa com três exemplos nos quais não apenas a questão do espelho é discutida, mas a questão da perda do reflexo como questionamento do Ser. Nas obras homônimas “O Espelho”, de Machado de Assis e Guimarães Rosa, além de “O Reflexo Perdido” (Das Verlorene Spiegelbild) (1815), do escritor alemão E.T.A. Hoffmann, observamos a dinâmica dos espelhos enquanto questão. Na verdade, o percurso dos personagens aparecem no reflexo perdido de cada um: na ausência de suas imagens passam a questionar sua existência. É aí que então, cada um deles encara o seu desdobramento de uma maneira diferente, mas todos através do diálogo. Note-se que quando os personagens perdem seus reflexos, o real, que se dá como realização de mundo, sentido e verdade, se perde. E o que vem a ser mundo sentido e verdade? São questões, e como tais, se manifestam enquanto se retraem tornando-se assim necessária a busca, o percurso. O mundo é a realidade se dando como sentido e quando isso é rompido, este se perde. Diante do espelho o homem se vê um monstro ou uma imagem desfigurada, ou não se vê. Essa quebra de seu mundo, que é aquilo que ele tem por verdade, de repente se esvai, e assim se abre a questão do que é mundo, sentido e verdade, e o que é o homem diante de tudo isso.