A presente reflexão analisa duas narrativas de Guimarães Rosa, Cara-de-Bronze e O recado do morro, a partir do agregamento da voz musical à suas tessituras para, assim, verificar de que modo o substrato cultural é utilizado como mediação da dimensão estética na obra rosiana, cuja profusão de palavras, cria uma terceira cultura, derivada de outras duas, a popular e a erudita. Para tanto, a abordagem parte das ideias de Alfredo Bosi sobre dialética cultural, condensadas em Dialética da colonização (1992) e Céu, Inferno (2003), cuja síntese circunscreve a relação das culturas sociais na criação cultural-literária brasileira.
Olhos nus: olhos” é um conto do escritor moçambicano Mia Couto, publicado na coletânea Essa história está diferente, organizada por Ronaldo Bressane (Companhia das Letras: 2010). O livro tem como proposta reunir recriações, por autores diversos — e sempre sob a forma de narrativas de ficção —, de motivos temáticos extraídos das letras de Chico Buarque de Holanda. O texto de Couto, como o título deixa ver, é inspirado na canção “Olhos nos olhos”, de 1976. Nesse contexto, não haveria que se esperar um procedimento diferente do que ocorre nas demais narrativas da coletânea: o desenvolvimento de uma história que tangenciasse, em alguns pontos significativos, as narrativas implícitas no discurso lírico das canções. E, no entanto, a invenção de Couto nos surpreende em mais de um aspecto. A descrição dos processos que promovem esse efeito de surpresa é o que propomos no presente trabalho, para o que buscamos mapear as relações intertextuais que o conto estabelece e as múltiplas experiências de leitura que delas decorrem. Para tanto, revisitamos o conceito de intertextualidade sob a ótica da Teoria Geral dos Signos, aplicando-o ao texto comentado.