Este trabalho é um estudo do tema do amor na novela 'Dão-Lalalão (o devente)', do livro Corpo de baile, de João Guimarães Rosa, à luz de suas correspondências com A divina comédia, de Dante Alighieri. Buscamos compreender, a partir do estudo das semelhanças e contrastes que se estabelecem entre as duas obras, a visão particular de amor que Guimarães Rosa apresenta ao leitor em sua novela. Ao oferecermos uma análise do tema do amor em uma obra específica, pretendemos contribuir também para a revisão pela qual a questão vem passando nos últimos tempos na crítica ao autor mineiro.
O trabalho consiste em analisar o vínculo entre poeticidade, imaginação e memória nas narrativas “Buriti”, “Dão-lalalão – o devente” e “A estória de Lélio e Lina de Guimarães Rosa. Para tanto, toma-se como ponto de partida a presença da imaginação e da memória na constituição dos protagonistas masculinos, respectivamente, Miguel, Soropita e Lélio que, no sertão construído pelo escritor, vivenciam singulares experiências, em especial, nos recônditos da imaginação e da memória, geralmente suscitadas pelos relacionamentos com os pares femininos. Como, nas narrativas selecionadas, o devaneio, a fantasia e a memória são, em geral, apresentados poeticamente, investiga-se a similaridade entre certos processos discursivos oriundos da função poética da linguagem e mecanismos observados naqueles procedimentos. Como essa orientação peculiar dos protagonistas para a imaginação e a memória confere tratamento diferenciado ao espaço e ao tempo, o estudo dessas categorias contempla, primeiramente, os ensaios críticos sobre a obra rosiana em geral e sobre as três novelas em particular. Em segundo lugar, toma-se o instrumental teórico da poesia, no qual cabe destacar os textos basilares de Roman Jakobson “Lingüística e poética” e “À procura da essência da linguagem”. O estudo da imaginação e da memória como elementos atuantes nas personagens encaminha-nos a obras centradas na simbologia do imaginário, como As estruturas antropológicas do imaginário de G. Durand; ancoradas na filosofia, como as de H. Bergson, Matéria e Memória e Ensaio sobre os dados imediatos da consciência; na relação entre a palavra mítica e a linguagem, como Antropologia filosófica e Linguagem e mito; e de fundo psicanalítico, como “A instância da letra no inconsciente ou a razão desde Freud” de J. Lacan.
"As mulheres e o mundo do sertão na obra de Guimarães Rosa" é uma leitura de Grande sertão: veredas e das novelas "Dão-Lalalão" e "Buriti", com incursões em outros textos que, em determinado momento, foram considerados importantes para ilustrar um ponto de vista de análise ou evidenciar um traço recorrente do autor. A atenção deste escrito está voltada para a linguagem, não para observar a riqueza da criação de palavras e a maneira originalíssima de relacioná-las entre si, mas como ferramenta de criação de um mundo de significados presentes na alma humana, no caso, expressa pelo retrato do homem do sertão de Minas Gerais, mas de forma alguma reduzida por limites de espaço ou de tempo. Entre os elementos narrativos, este estudo privilegia as personagens, sempre complexas. Complexidade que se expressa no ritmo dos eventos, marcados por idas e vindas não apenas espaciais e temporais-cronológicos, mas também e principalmente pela dosagem de informação fornecida em cada situação. As personagens se dão a conhecer por suas ações, falas e reflexões, mas nem sempre as ações são decisivas ou a fala é conclusiva; o próprio pensamento muitas vezes é conjetura, suposição, desconfiança. O universo do texto de Guimarães Rosa é essencialmente povoado de homens. As mulheres ocupam menos do que eles o espaço público das histórias, mas isso não deve nos enganar quanto à densidade da personagem feminina, ao significado do seu estar no mundo e sua ressonância sobre o destino dos homens. Os homens supõem coisas acerca das mulheres, e raramente sua suposição é confirmada ou desmentida por elas mesmas ou por alguém que saiba mais delas do que o personagem masculino. De Doralda sabemos o que Soropita sabe, mas, como ele está sempre se surpreendendo com ela, desconfiamos que pode haver muito mais. Diadorim quase nada conta de si a Riobaldo, e o que conta é pouco relevante. Diadorim faz confidências à mulher do Hermógenes, e, para esta ) leitura, o ato da confidência "àquela" mulher, mais do que o conteúdo confidenciado, apresenta-se como demarcador de mundos, ressaltando que o mundo feminino tem mistérios, verdades complexas que a simples palavra nem sempre traduz. Lembremos aqui a relação amorosa entre a mãe e a filha de Sorôco cuja densidade a cidade não soubera perceber. O papel de Lalinha em "Buriti" é exemplar. Naquela fazenda de fim de mundo, aonde chegou resguardada pelo pai do ex-marido, ela vai iluminar o destino não só de Maria da Glória em seu estado de tardia puberdade, mas de todos dali, homens e mulheres. Sua imagem, que para aquela gente sertaneja era de quem parecia não ter o juízo no lugar, desestabiliza verdades seculares e instiga ao convívio com o diferente.
Faculdade de Letras, Departamento de Letras Vernáculas
Este estudo apresenta algumas reflexões sobre o amor, em três estórias de Guimarães Rosa - "Substância", "Dão-Lalalão" e "Luas-de-mel". Ao mesmo tempo em que mantêm a sua autonomia, há uma profunda intedependência entre elas. Dentro de um universo de diferenças, cada uma se explica junto às outras. Essa integração corresponde a uma vertente do projeto de amor rosiano - manter a diversidade na unidade. A leitura proposta observa que o amor propicia transformações existenciais que ocorrem durante profunda viagem à interioridade dos personagens. Esse processo de metamorfose acontece diante de um tempo descontínuo, porém, circular. Nesse movimento, a natureza se une às mudanças dos personagens e se torna epifânica. Essas estórias mostram que Eros ultrapassa a visão dicotomizada e excludente entre lógico ou alógico, corpo ou alma. Elas propõem o amor envolvendo corpo e alma, razão e desrazão. Nelas, o amor se concretiza na transcendência e permite que o ser esteja em constante movimento de inaugurar a vida a cada instante, se descobrindo e descobrindo o novo e colocando-se por inteiro na aventura do viver.
A relação entre criador e receptor se faz presente de forma peculiar em grande parte das obras de João Guimarães Rosa, inserida também intratextualmente em suas estórias. Para destacar tal relação, serão analisadas três novelas de Corpo de Baile: "Campo Geral", "Cara-de-Bronze" e "Dão-lalalão". Embora haja contadores ao longo de todo o ciclo novelístico, o corpus escolhido apresenta mais acentuadamente protagonistas que narram para os outros e, de certa forma, para si mesmos. Miguilim narra principalmente estórias infantis; Grivo reconta a trajetória pessoal de Cara-de-Bronze, modificando a versão inventada e vivida pelo fazendeiro, e, por fim, Soropita repassa questões pessoais por meio de devaneios. As estórias internas provocam um efeito sobre seus ouvintes, agindo ora como aprendizado, ora como impulso para buscas ou para ações distintas. A partir daí, este trabalho tem por objetivo tanto delimitar os criadores e receptores dessas estórias, refletindo acerca de seus papéis, quanto evidenciar as funções e conseqüências de tais narrativas para suas personagens, mostrando que os contadores internos auxiliam, com experiências ficcionais, não só a própria "vivência", mas também a de seus ouvintes.
O presente trabalho é uma análise sobre os movimentos da memória, do desejo e do amor fruto da experiência, e/ou decorrente dos devaneios presentes nas falas dos protagonistas Riobaldo e Soropita, das obras de João Guimarães Rosa, Grande Sertão: Veredas (GSV) e Dão Lalalão (DL), respectivamente, e a implicação desses movimentos na estruturação das narrativas em tela. A metodologia utilizada foi a revisão bibliográfica da fortuna crítica do escritor, o estudo de elementos da narratologia e das teorias literárias, com o aporte da teoria psicanalítica Freudiana. Esta pesquisa de natureza qualitativa de caráter exploratório da bibliografia possibilitou o estudo dos personagens, do romance, do enredo, do tempo, do espaço e das categorias psicanalíticas que contribuíram para explicitar os comportamentos dos sujeitos protagonistas na cena literária. Atingidos os objetivos verificou-se que a memória, a fantasia e o desejo são mecanismos responsáveis pela maneira de ser dos sujeitos protagonistas e de seus modos de narrar. Este estudo pretendeu oferecer uma contribuição no âmbito dos estudos literários e da linguagem, no des-velamento dos dramas e conflitos humanos, bem como para compreensão da participação desses aspectos no processo criativo da obra literária.
Este trabalho discute a criação de Diadorim e Doralda, personagens rosianas, por uma perspectiva mitopoética, trazida por Benedito Nunes e iluminada pelas teorias de Mircea Eliade e Ernst Cassirer. Discutir essas personagens não poderia prescindir do exame das narrativas em que transitam, Grande sertão: veredas e Corpo de Baile, bem como da análise da relação entre as personagens e seus pares amorosos. Assim, abre-se uma reflexão que abarca os conceitos de mito e de linguagem poética, a construção narrativa de Guimarães Rosa e o desenho das personagens nessa paisagem, que nos levam a perspectivas plurais, contemplando o já conhecido hibridismo e a movência das narrativas rosianas, em que se imbricam o mítico, o místico e o metafísico. Cuidadosamente engendradas, as duas narrativas se configuram por um jogo de mostra/esconde que não oferece possibilidade de respostas, mas trazem outras inquietantes perguntas a serem somadas às que o leitor já trazia ao abrir os livros.
Faculdade de Letras, Departamento de Letras Vernáculas
Eros engendra o universo mitopoético de Guimarães Rosa. A força emancipatória do mito se apresenta como princípio norteador da ficção rosiana. Entendido como agente do processo cosmogônico, vincula corpo e alma com a vitalidade cósmica e criadora da natureza, aproxima linguagem e ser, fundamenta com o poder formativo da palavra um novo sertão e consagra a grandiosidade da vida em constante recomeço. Ele rompe com a tradição patriarcal da sociedade ocidental e contraria a figura divina que, comumente, o caracteriza como interventor na dinâmica familiar e na ética social, sentimento que gera deleite e sofrimento, oposição entre prazer e dever, coerção ou ameaça, impulsionador de atitudes insanas ou inconsequentes, desejo insaciável, sujeito em busca do objeto ou deus absoluto do Olimpo. Nas narrativas do escritor, assume a orquestração tensa e harmônica de contrários que não se excluem, na riqueza de timbres que compõem o viver. Esta tese propõe o viés amoroso como importante possibilidade de diálogo com a tessitura literária de Rosa. A base das discussões prioriza a regência de Eros em imagens poéticas ligadas ao olhar, que evidenciam o irromper do inaugural e miram a invisibilidade de todo ver. Olhar arrebatado por Eros, cria, recria, deforma e transforma imagens porque se insere na dinâmica das metamorfoses. Grande sertão: veredas constitui o núcleo irradiador das reflexões. "A estória de Lélio e Lina", "Substância", "Dão-Lalalão" e "Buriti" contribuem para complementar e confirmar a abrangência de Eros no projeto poético do autor. A elaboração estrutural da obra rosiana suscita uma declaração de amor à vida e uma celebração da potência genesíaca do mais belo dos deuses.
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Literatura Brasileira
A presente dissertação estuda a novela Dão-Lalaão, do autor mineiro João Guimarães Rosa. Articula-se a proposta de uma análise estilística do texto com a interpretação de cunho psicanalítico, sobretudo a partir de Freud. Situa-se, primeiramente, a relação entre este estudo e a fortuna crítica da obra selecionada, discutindo aspectos relevantes dos trabalhos de outros estudiosos. Ao abordar a relação entre o foco narrativo e o protagonista e utilizando-se de indicações do próprio Guimarães Rosa presentes em outras obras e em correspondências com seus tradutores, utiliza-se a metáfora do badalar de um sino como homólogo aos movimentos internos e externos de Soropita, sobretudo em torno da questão da manutenção do recalque como forma de preservar sua estabilidade social e pessoal. Esta dissertação reflete ainda sobre uma possível disposição melancólica de Soropita, além de estudar aspectos significativos do amor entre este personagem e sua esposa, Doralda, que mantém relação com a dinâmica do recalque. Aponta-se, por fim, para o caráter cíclico e inconcluso da presente narrativa, como sendo sua marca distintiva, não havendo, no nível do personagem principal, solução possível para seus dilemas. As questões histórico-sociais, pertinentes ao contexto abarcado pela novela, também serão articuladas ao estudo do estilo e à problemática psicanalítica abordada.
O objeto de estudo desta tese são algumas das narrativas elaboradas por João Guimarães Rosa e compiladas nos livros: Sagarana, Primeiras Estórias, Estas estórias, Ave, palavra, Corpo de Baile e Grande Sertão: Veredas. A análise deste corpus tem a finalidade de verificar até que ponto essas narrativas ajudam a repensar o conceito de homem cordial presente no pensamento sociológico brasileiro, tendo em vista, sobretudo o desenvolvimento deste conceito no ensaio Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda (doravante SBH). Dada a inscrição dessas narrativas entre o sertão arcaico e a fundação do ambiente urbano brasileiro, mesmo panorama discutido por SBH, a partir da argumentação desenvolvida, concluiu-se que há um reaproveitamento estético de algumas das principais discussões desenvolvidas por SBH, sobre as raízes da sociedade brasileira. Acredita-se que tal reaproveitamento estético permite que a cordialidade ressoe no corpus analisado, o que nos leva a forjar aqui o qualificativo de poética da cordialidade para as narrativas produzidas por JGR e a enxergar no perfil biográfico desse autor um intérprete do Brasil.
Este trabalho propõe analisar a novela Dão-Lalalão, presente no livro Noites do Sertão, o qual faz parte da obra Corpo de Baile, e o conto Desenredo, presente no livro Tutameia, de João Guimarães Rosa. Nossa proposta é verificar como o tema amoroso se configura nessas narrativas, levando em consideração o contexto histórico e social do sertão. Partindo desses dois elementos, o amor e o sertão, que consideramos fundamentais para compreender a obra do escritor mineiro, este estudo apresenta uma nova chave de leitura, a qual discute o amor inserido no ambiente social e político do sertão, em que o primeiro não pode ser pensado sem o segundo. Nesse sentido, as perguntas que motivam esta pesquisa são: como o amor se manifesta nestas narrativas rosianas, onde, de maneira menos explícita ou mais explícita, há a determinação de ordem social, predominada pelo sistema jagunço? Porque os protagonistas, Jó Joaquim e Soropita, encontram soluções diferentes para lidar com suas relações amorosas, levando em conta que ambos amam mulheres que não correspondem - ou não correspondiam - ao modelo de mulher esperado no sertão? Em outras palavras, buscamos compreender como o amor ocorre neste ambiente histórico específico e quais as implicações para Soropita, protagonista de Dão-Lalalão, que sucumbe ao mal-estar, e para Jó Joaquim, protagonista de Desenredo, que consegue perdoar a mulher que ama e encontrar a felicidade pelo amor.