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Uma tragédia e várias repercussões

Por: Ana Carina Marcelino e Guilherme Torres Corrêa 

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O acidente do voo LaMia 2933, no qual faleceram 71 pessoas, entre jogadores, comissão técnica e dirigentes da Chapecoense, além da tripulação e também jornalistas e funcionários da imprensa esportiva brasileira, é uma tragédia para o futebol brasileiro de grandes proporções. Primeira, e obviamente, pela morte trágica de seres humanos, que deixam órfãos de sua companhia familiares, amigos e fãs. Em segundo lugar, uma tragédia desta natureza provoca um abatimento geral, sobretudo naqueles ligados à equipe da Chapecoense. Além disso, a própria cidade de Chapecó, que tinha no clube um dos seus maiores símbolos, certamente encontra-se em dor e luto profundos.

A queda do avião que levava o time da Chapecoense e profissionais de imprensa causou muita comoção pelo país. Logo após a tragédia, diversos clubes de futebol pelo país cancelaram seus treinos em comoção por conta do acidente. Alguns ainda mudaram as fotos de perfil nas redes sociais pelo símbolo da equipe catarinense, além de subirem a hashtag #forçaChape. Os times da série A conjuntamente publicaram nota oficial lamentando o ocorrido, oferecendo suporte financeiro e técnico e solicitando à CBF que mantenha o time imune de rebaixamento por algumas temporadas.

O time que enfrentaria a Chapecoense na final da Copa Sul-Americana, o Atlético Nacional, também prestou solidariedade, fazendo um minuto de silêncio e publicando uma nota de homenagem em português. O clube colombiano também entrou com o pedido à Conmebol para que o título seja concedido à equipe de Chapecó como louro honorário.

Grandes clubes internacionais como Real Madrid e Barcelona também publicaram homenagens e mensagens de apoio e solidariedade. David Luiz, zagueiro do time inglês Chelsea, postou três emocionantes mensagens no Instagram, uma direcionada para o clube e os torcedores e as outras duas relembrando e celebrando a memória de Arthur Maia e Anderson Paixão, amigos próximos do jogador. Outras grandes figuras do futebol, como Neymar, Kaká, Messi, Beckham, Casillas, Zidane, Casemiro, Pelé, Maradona, Cafu e Rooney prestaram solidariedade pelas redes sociais.

Enquanto isso, torcedores do clube catarinense se reuniram em vigília em frente ao estádio Arena Condá, em Chapecó, para prestar tributo. Muitos se emocionaram fortemente, enquanto outros até passaram mal e tiveram de ser socorridos. A prefeitura da cidade e Chapecó determinou luto oficial de 30 dias e suspendeu todos os eventos festivos de fim de ano.

A CBF, a FIFA e a ABERT (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão) ainda soltaram uma nota oficial lamentando o acidente. A CBF também anunciou na mesma o adiamento da partida da final da Copa do Brasil entre Atlético Mineiro e Grêmio.

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Contudo, uma outra dimensão desse acidente diz respeito mais especificamente ao futebol brasileiro, e isso nos remete à outra tragédia do futebol mundial: a de 04 de maio de 1949, em Turim. O acidente aéreo, fatal a todas as 31 pessoas a bordo, provocou a morte de uma geração de ouro italiana. A equipe do Torino era a base da seleção da Itália e um dos melhores times da Europa à época. O que era o maior clube italiano, a caminho do quinto título nacional seguido, perderia sua força nos anos seguintes à tragédia, chegando ao rebaixamento à segunda divisão uma década depois. Evidentemente, a posição que ocupa a Chapecoense no cenário do futebol brasileiro é de muito menor destaque da ocupada pelo Torino em 1949 na Itália; mas há algo que não podemos deixar passar em branco. A equipe de Chapecó vinha de quatro ascensos de divisão nacional e dois títulos estaduais nos últimos sete anos. Ademais, na sua terceira participação seguida na série A do Campeonato Brasileiro encontra-se em nono lugar, a frente de grandes clubes nacionais. Mais que isso, após ser eliminada de forma honrada nas quartas de final da Copa Sulamericana de 2015 diante do poderoso River Plate, alcançou a final do torneio na edição atual, passando por clubes como Independiente (ARG) e San Lorenzo (ARG). A postura de entrega dos jogadores, bem como a qualidade do time, vinha angariando ao clube uma simpatia sincera de torcedores de várias agremiações pelo Brasil, e certamente teria o apoio da maioria da torcida brasileira nos jogos finais contra o campeão da Libertadores Atlético Nacional (COL).

Todavia, não é “só” isso que não devemos deixar passar em branco. O crescimento da Chapecoense ao longo desses últimos anos não foi mero acaso, mas fruto de um trabalho sério de gestão do clube. Em meio a tanta miséria administrativa no futebol nacional, em especial na CBF, que teve sua pobreza amenizada pelo talento de Tite e companhia, o que essa tragédia pode implicar para a organização do nosso futebol? Como os nossos clubes – que logo demonstraram total e justo apoio ao time de Chapecó, aos familiares, amigos e fãs dos falecidos – podem evitar, para além da perda incomparável e incalculável das vidas humanas em questão, que essa tragédia acabe também com exemplos recentes tão raros de sucesso administrativo no futebol brasileiro? Que todos se unam, antes de qualquer coisa, para oferecer uma rede de apoio a todos os envolvidos nessa tragédia (como vimos na primeira parte deste texto), e que essa união se mantenha para o fortalecimento do futebol profissional no Brasil, o que seria uma grande homenagem aos que nos deixaram neste momento.

Supporters of Brazilian Chapecoense cheer for their team during their 2016 Copa Sudamericana semifinal second leg football match against Argentina's San Lorenzo match held at Arena Conda stadium, in Chapeco, Brazil, on November 23, 2016. / AFP / NELSON ALMEIDA (Photo credit should read NELSON ALMEIDA/AFP/Getty Images)

Fotos: ESPN.com.br, Goal.com