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De hobbie a e-sport

Por Fábio Dellape

A audiência dos e-sports passa por uma crescente exponencial nos últimos dez anos. A modalidade que concentra a maior audiência, atualmente, é o League of Legends, um jogo dos chamados MOBAs (Multiplayer Online Battle Arena). Desde 2012, quando a final do mundial lotou o Staples Center, ginásio dos Lakers e outros times, a empresa dona do jogo, Riot Games, percebeu o potencial do jogo como um meio de entretenimento não apenas para jogadores, mas também para espectadores. Isso também foi percebido por grandes players do mercado internacional, fazendo com que o jogo conseguisse grandes patrocinadores como Coca-Cola, Mercedes-Benz, Red Bull, Doritos e diversas marcas de eletrônicos.

Em 2013 a empresa criou ligas regionais divididas por servidor, foram então criadas a NALCS (North America LoL Championship Series), EULCS (Europa), CBLoL (Brasil), para acompanhar as já existentes OGN (Coréia do Sul), LPL (China) e Garena (Sudeste Asiático), das quais a empresa não detinha os direitos de transmissão. Em 2016 a Riot Games decidiu padronizar seus direitos de transmissão, criando um padrão mundial para todas as ligas, transformando a OGN em LCK, e criando ligas regionais para Rússia, Turquia, Austrália, América Latina e Japão

Mundial de LoL foi disputado no Staples Center, em Los Angeles (Foto: Divulgação / Riot)

 

Com a crescente popularidade do esporte e a profissionalização de seus jogadores, houve o surgimento de ligas amadoras não oficiais ao redor do mundo. A Riot Games, reconhecendo a demanda, criou suas próprias ligas amadoras, que servem como classificação para as ligas profissionais, que funcionam basicamente como a Segunda Divisão dos campeonatos esportivos.

A crescente competitividade do esporte também é responsável por exigir dos jogadores uma pesada rotina de treino que, por não limitar os jogadores e técnicos pelo cansaço físico, chegam a treinar mais de 15 horas por dia.

Em uma breve passagem minha pelo e-sport amador e LoL universitário, tive a oportunidade de treinar com Eduardo “Careca” Kenji, técnico de LoL que trabalhou com quem são, hoje, grandes pro-players como Pedro “Matsukaze” Gama, Marcelo “Ayel” Mello, Eidi “esA” Yanagimachi, entre outros, discutivelmente os dois melhores jogadores do Brasil em suas posições, atualmente. Conversamos com “Careca” para falar um pouco mais sobre a carreira de um profissional de LoL, seu dia-a-dia e outros fatores interessantes!

BJE: Primeiramente, bom dia, Eduardo! Acho que podemos começar com uma breve história de sua carreira. Quando você decidiu adentrar no cenário amador como técnico, e qual estrada você trilhou desde então?

Eduardo “Careca” Kenji: Decidi entrar para o cenário competitivo como técnico a 4 anos, durante uma partida ranqueada quando ainda era Bronze (o ranqueamento é feito por classificações de Bronze até Diamante, depois os tiers Mestre e Desafiante) na Season 3 (cada ano o jogo muda de Season/Temporada, onde os ranques são zerados, atualmente o jogo se encontra na transição entre 7ª e 8ª Temporada), nessa época os jogadores de Elo (rank) mais alto, acabavam caindo com os jogadores de Elo mais baixo por conta do número baixo de jogadores no servidor brasileiro, e dentre alguns games, acabei caindo com um jogador profissional na época. Quando perguntei pra ele o que eu precisava fazer para entrar para o competitivo ele me fez a seguinte pergunta: “Você prefere estudar ou aprender na pratica?”. Quando disse que preferiria estudar ele me disse para aprender tudo sobre o jogo e assim apresentar esse conhecimento para os próximos, sendo assim viraria técnico. Desde então passei por alguns times com menor nome e outro mais conhecidos como a CNB e-Sports e a Antiga SevenWars (7w) tendo treinado alguns jogadores com grande destaque no competitivo brasileiro

BJE: Você era certamente jovem quando começou essa carreira. Como foi pra você conciliar o trabalho com os estudos?

Eduardo “Careca” Kenji: Quando comecei a levar o fator técnico como trabalho, no começo, foi um pouco complicado de separar o tempo, pois fazia o Ensino Médio de manhã e Técnico à tarde, e deixava o período da noite como horário disponível para trabalhar como técnico e ir me atualizando em relação aos demais lugares do mundo. Mas, com o passar do tempo, com a faculdade, veio uma disponibilidade maior para poder me dedicar a isso, foi quando me mudei para uma Gaming House (casas bancadas pelas organizações onde moram, juntos, jogadores e técnicos, em uma intensa rotina de treino) e pude estudar e trabalhar, tudo no mesmo lugar.

BJE: Você pode descrever um pouco de como era seu trabalho, seu dia-a-dia na Gaming House e como era para você lidar com os jogadores? Quais eram as melhores e as piores partes de tudo isso?

Eduardo “Careca” Kenji: Durante meu período na Gaming House eu tive um choque de realidade, porque você realmente respira e vive o jogo. Você se dedica a ele quase 100% do seu tempo e tudo que você esta fazendo é voltado pra isso. No meu caso, como técnico, eu era responsável pela rotina, sendo desde o horário de início das atividades até o termino das mesmas, além de toda a estrutura teórica e prática da semana para os campeonatos aos finais de semana. Porém, como eu era responsável por 5 jogadores e sobre a rotina deles, era de grande responsabilidade, mas nada que não desse para controlar e tomar conta se você se esforçasse o bastante para isto. Já ao ponto de o que era melhor e pior, não teve uma pior parte, só tem um ponto que realmente era complicado: convivência. Esse pequeno fator poderia fazer o clima do time todo sair de 0 a 100 e o inverso em apenas alguns segundos, mas isso era apenas uma complicação. Já os pontos positivos eram muitos, pois, é uma enorme experiência, algo que todos que se envolveram com isso vão poder se lembrar para o resto de suas vidas. A experiência com uma Gaming House é fantástica em quase todos os aspectos, te faz evoluir como indivíduo e muda sua forma em pensar em relação ao um grupo de pessoas, algo q realmente você só ira entender passando um tempo em uma.

BJE: Um dos maiores problemas atuais das carreiras nos e-sports é a aceitação dos pais, assim como seu apoio. Isso foi um problema sério pra você? Como, tanto eles quanto você, lidaram com isso?

Eduardo “Careca” Kenji: No inicio foi bem complicado, pois meus pais são professores e eles sempre me falaram que isso “não era algo q realmente iria me fornecer um retorno”, ou até mesmo que “não passava de uma fase”. Foi assim durante 1 ano, até q eu comecei a receber um retorno considerável. Mas mesmo assim eles ficam com o pé atrás em relação à vida que eu estava levando, pois ainda é uma profissão que não é bem vista aos olhos das pessoas que não tem tanta ligação com este meio. Hoje em casa já está mais tranquilo, até mesmo meus familiares começaram a acompanhar o cenário de LoL e estão do meu lado para o que eu precisar.

BJE: Você tem alguma dica pra alguém que quer entrar no cenário competitivo como técnico? E como jogador?

Eduardo “Careca” Kenji: Primeira coisa: como toda profissão você precisa estudar e ter uma boa base, e entender que você precisa dar o seu melhor a todo custo. Como é um cenário competitivo, você tem q ter nervos de aço para entender suas próprias frustações e saber lidar com as derrotas (é difícil treinar meses para algo, mais de 10 horas por dia, e acabar sendo eliminado), e saiba diferenciar críticas construtivas de destrutivas, LoL não é difícil a gente que se complica!