ISSN 2359-5191

10/08/2015 - Ano: 48 - Edição Nº: 72 - Saúde - Instituto de Ciências Biomédicas
Descoberta proteína que leva a alterações metabólicas em gestantes
Deleção do SOCS3 em estudo do ICB-USP indica atuação da molécula durante gestação
Atuação do SOCS3 provoca mudanças metabólicas em grávidas. (Fonte: Reprodução)

Uma pesquisa do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP mostrou que uma proteína chamada SOCS3 é a chave das mudanças metabólicas que ocorrem durante a gestação de mamíferos. Essa é a tese de doutorado de Thais Zampieri, que será defendida em agosto deste ano. Ela foi orientada pelo professor José Donato Junior.

Metabolismo em transformação

Entre os mamíferos, todas as fêmeas apresentam mudanças metabólicas significativas quando se encontram grávidas – mais comida ingerida, ganho de peso, resistência aos hormônios insulina e leptina. Conforme o professor explica, “essas mudanças cumprem uma função de aumentar a disponibilidade de nutrientes para o feto e fazer com que a mulher engorde na gestação para que ela tenha condições de ter uma lactação melhor”.

A leptina é produzida no tecido adiposo e tem como função informar ao cérebro a quantidade de alimento que deve ser ingerido, regulando o acúmulo de energia. Quem tem mais gordura secreta mais leptina, sinalizando que o indivíduo não necessita comer mais. A insulina, por sua vez, atua na entrada da glicose nas células, para que esta seja usada como fonte energética. Com o menor acúmulo de glicose pela mãe, o excedente nutre o feto.

No entanto, havia uma dificuldade de se entender o que, biologicamente, provoca essas alterações. O laboratório, que estudou o fenômeno em camundongas, rumou pelo caminho da leptina, acreditando que a resistência a ela causava as demais mudanças.

Pesquisa inédita

“Trouxemos um modelo dos Estados Unidos que permitiu manipular a sensibilidade à leptina dos animais”, diz o professor. Através de técnicas avançadas de engenharia genética, foi criada uma linhagem de camundongas que teve a proteína SOCS3 inativada, que é uma poderosa inibidora da sinalização da leptina. Quando a leptina se liga a um receptor na membrana celular de neurônios, acontecem mudanças no interior da célula. O SOCS3 impede que a ligação ocorra, fazendo com que esses neurônios se tornem praticamente irresponsivos à leptina. Disso decorrem todas as mudanças no organismo da fêmea. O SOCS3 é deletado somente dos neurônios com receptores de leptina, que são muito poucos em comparação ao total, já que é uma proteína com diversas outras funções.

No estudo, foram medidos os níveis de várias proteínas no cérebro de fêmeas grávidas e de fêmeas virgens. Somente o SOCS3 apresentou níveis significativamente diferentes entre os dois grupos, indicando que o grupo estava no caminho certo. A partir de uma série de testes, ficou comprovado que os espécimes com o SOCS3 deletado são mais sensíveis à leptina. Durante a gestação, as camundongas controle apresentaram peso mais elevado do que as knockout (que tiveram a proteína excluída). Essa diferença ocorreu pela deposição de gordura, já que as knockout comeram menos por responderem melhor ao efeito da leptina. O mesmo padrão foi verificado no período da lactação. É importante notar que a gravidez da fêmea sem o SOCS3 não foi prejudicada.

Esses experimentos apontaram, portanto, que o SOCS3 é a causa das mudanças metabólicas da grávida.

As fêmeas knockout, contudo, apresentaram problemas na lactação por terem ganhado menos peso. Mesmo com a decorrência de dificuldades da amamentação, no caso de humanos o estudo é relevante, pois inicialmente as camundongas tinham um peso normal e ingeriram uma dieta saudável, mas metade das mulheres brasileiras está acima do peso (e 17% são obesas), segundo dados do Ministério da Saúde de 2014. Evolutivamente, o ganho de peso durante a gravidez existe para que a lactação seja ideal, mas problemas de saúde comuns na atualidade mostram a necessidade de se desenvolver pesquisas na área. Engordar demais durante a gestação ou engravidar estando com um peso elevado é um risco para a saúde das mulheres. Não há nenhum medicamento para combater essas mudanças.

A equipe também comparou a injeção de leptina (o que frearia o ímpeto da fêmea por comer mais) com a deleção do SOCS3 e esta última se mostrou mais efetiva para conter o ganho de peso. Além disso, tendo em vista o grande problema do diabetes gestacional, se verificou que as fêmeas knockout são mais sensíveis à insulina e, consequentemente, mais tolerantes à glicose.

Futuro promissor

“Esse trabalho desvendou um fenômeno no organismo da fêmea”, resume Donato Junior. A partir das informações compiladas na pesquisa, estudos da área podem se debruçar sobre formas de se inibir o SOCS3 para evitar mudanças metabólicas indesejáveis em mulheres. Ainda é necessário localizar o ponto exato do cérebro onde a proteína atua.

A maioria dos estudos sobre obesidade e diabetes ocorrem com machos, já que eles não têm ciclos menstruais e não estão submetidos a variações hormonais tão intensas. Com isso, pouco se estuda essas condições em fêmeas e sua especificidade permanece incerta. O estudo de Thais Zampieri trata de uma área de grande relevância e ainda pouco abordada. A pesquisa será apresentada em 2016 num congresso de renome nos Estados Unidos que reúne cerca de 8 mil participantes.

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