ISSN 2359-5191

04/09/2015 - Ano: 48 - Edição Nº: 87 - Ciência e Tecnologia - Instituto de Biociências
Práticas funerárias ajudam a reconstruir a cultura dos povos antigos no Brasil
Curso do IB revela a importância da arqueologia na descoberta de costumes e hábitos dos primeiros grupos de caçadores-coletores na região de Minas Gerais
Sep 17 Crânio com outros ossos dentro Créditos: Divulgação

Entre os dias 7 e 11 de setembro ocorrerá no Instituto de Biociências (IB) um curso sobre arqueologia das práticas funerárias. André Strauss, que é o idealizador do curso, explica que para a arqueologia, as práticas funerárias e a maneira como os corpos estão enterrados podem dizer muito sobre os costumes e até mesmo a cultura dos corpos encontrados.

O curso conta com a presença do arqueólogo Walter Alves Neves, ministrante responsável pela abertura (às 13h). André Strauss, que realizou uma dissertação sobre a descoberta de diferentes sepultamentos encontrados na Lapa do Santo (na região da Lagoa Santa, Minas Gerais), iniciará o curso (no dia 7, às 15h45) contando a experiência e as descobertas realizadas.

O pesquisador conta que as descobertas só foram possíveis graças ao local escolhido para os sepultamentos: as cavernas. “Elas são um ambiente propício, porque funcionam como cápsulas de proteção. E o solo tem muito calcário, que leva o ambiente a ser básico, o que impede a decomposição mais rápida dos ossos. Além disso, esses esqueletos estão a uma distância razoável do solo. Lá eles estão há meio metro de profundidade. ”

André, que descobriu 26 sepultamentos na região, comenta que esses foram divididos em padrões, e destacou o padrão 2: “Este padrão dá maior importância a manipulação do corpo. Essa ênfase se dava justamente com os cortes e amputação de partes do corpo. Embora algumas partes estejam articulados, outras foram removidas enquanto ainda tinha tecido mole. ”

Para ele, o padrão 2 “é um bom exemplo de como a arqueologia pode nos ajudar em pensar na alteridade extrema. Você inverte as noções mais fundamentais de interação social, na nossa sociedade. A manipulação do corpo de um familiar morto é de difícil compreensão nos dias de hoje. ”

No dia 8, outras duas palestras sobre a morte ilustram o curso: A fundação da Arqueologia da Morte, ministrada por André Strauss, e às 15h45, Karenina Andrade falará sobre a Antropologia da Morte.

O dia seguinte é aberto com a palestra de Strauss, que falará sobre Rituais de sepultamento secundário no Brasil. Suas aulas serão baseadas tanto nos sepultamentos encontrados na Lapa do Santo, quanto em outras tribos indígenas. Na região, Strauss explica que a prática de desenterrar os corpos e enterrá-los de novo, de uma nova maneira, era muito comum.

Ele dá o exemplo do sepultamento 17, encontrado em 2007, na Lapa do Santo. O sepultamento era de uma calota craniana de uma criança que continha 84 dentes. Perto deste corpo, havia o corpo de um adulto sem dentes. Com uma análise mais profunda, foi possível identificar que alguns dos dentes encontrados no sepultamento 17 eram do corpo daquele adulto. E com isso, o pesquisador e sua equipe concluíram que os dentes foram retirados do corpo e recolocados junto ao da criança, como um tipo de ritual.

Além de relocar partes dos corpos, era comum pintar os ossos com a cor ocre. A pintura, explica Strauss, “era feita depois da decomposição dos tecidos moles. E essa prática funerária secundária é muito comum. Em algumas tribos indígenas, é costumeiro desenterrar os mortos, limpar os ossos e pintá-los. No Brasil, essa prática ainda é muito praticada pelo grupo Bororo. ”

O dia 9 é encerrado com a palestra sobre Sacrifícios Humanos, às 15h45.

Outra descoberta realizada a partir da análise dos corpos da Lapa do Santo é de que os esqueletos encontrados eram de Homo sapiens que viveram há mais ou menos 8000 AP. Essa conclusão permitiu que os pesquisadores classificassem-os no macrogrupo chamado caçadores-coletores. “Sabemos que eles lascavam pedra, e que não produziam cerâmica. Comiam animais de pequeno porte. Se alimentavam de tubérculos e vegetais, e enterravam os mortos deste jeito diferente. E isso é compatível ao que chamamos de caçadores coletores. “ Para Strauss, a descoberta revela a complexidade do grupo, muitas vezes desconsiderado pelos arqueólogos. " Tinha-se a ideia na arqueologia de que as práticas funerárias mais elaboradas tinham relação com povos mais complexos, mais novos. E o que vemos na Lapa do Santo é que se tem práticas extremamente elaboradas em grupos de caçadores coletores”, comenta. As práticas funerárias desse grupo serão mais exploradas no dia 10, às 13horas.

Além disso, no mesmo dia, a palestrante Maria Dulce Gaspar comentará as Práticas Mortuárias em Sambaqui, que para o pesquisador é outro interessante aspecto da cultura dos povos antigos no Brasil.

O entrevistado argumenta que este curso é importante para demonstrar a importância da arqueologia no Brasil. “Todos sabem sobre as múmias egípcias, sobre os povos incas, astecas e maias, mas não sabe sobre o Brasil, alegando que aqui não há nada de interessante. E isso não é verdade. Acho que é porque aqui a gente tem essa cultura de valorizar o que é do outro, e não o que é nosso. O Brasil é ponto focal quando o tema é primeiros americanos, ou biologia dos primeiros povos americanos”. Para ele, já é hora de analisarmos a cultura dos povos antigos brasileiros.

No dia 11, às 13h, a ministrante Sheila Mendonça dá a palestra sobre Ossos no Chão, e Rodrigo Elias de Oliveira comenta a Curadoria de remanescentes esqueléticos humanos, às 15h45. André Strauss encerra o curso às 17horas.

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