ISSN 2359-5191

10/12/2015 - Ano: 48 - Edição Nº: 127 - Saúde - Faculdade de Medicina
Estimulação magnética em crianças autistas contribui na melhora de funções cerebrais
Método experimental que combina inibição e excitação simultaneamente tem maior duração e outros resultados positivos
Aparelho de estimulação magnética transcraniana utiliza bobina para excitar partes específicas do cérebro

Durante um estudo experimental promovido pela Faculdade de Medicina da USP, o médico Caio Abujadi conseguiu, através do protocolo de estimulação magnética, trabalhar com áreas da parte frontal do cérebro que melhoraram diversas funções cerebrais, tais como linguagem e sociabilidade em pacientes autistas. Segundo um estudo do instituto norte-americano CDC (Center of Deseases Control and Prevention), a  condição atinge cerca de uma em cada 110 pessoas no mundo. Ela uma síndrome que além de influenciar diversos comportamentos do indivíduo, ainda afeta diferentes aspectos da comunicação. “Eu sou formado pela Unicamp e chegando na minha tese de mestrado eu já estudava muito o autismo havia uns 5 anos”, conta. “Durante meu curso de especialização em neuropsicologia, eu já fazia alguns desses protocolos em pacientes com dislexia, mas foi no mestrado que tive a oportunidade de explorar o tratamento, que era usado para a melhora de linguagem.”

Em parceria com o médico e psiquiatra Marco Antônio Marcolin, antigo coordenador do Laboratório de Neuroadulação da universidade, Caio começou a estudar o funcionamento do cérebro desses indivíduos para entender melhor de que forma minimizar os danos. “Na época, não existiam trabalhos publicados sobre esse assunto, então era muito difícil buscar uma fonte inspiradora”, relata. “A gente achava que poderia fazer algo desse tipo porque o importante mesmo é o método que você usa”. A estimulação magnética, justamente, é um tratamento que utiliza a variação de frequência e intensidade de ondas eletromagnéticas para mexer nos potenciais de ação dos neurônios e músculos e, consequentemente, interferir na atividade dos sistemas do corpo. Ele explica que o método pode ser usado tanto para aumentar quanto diminuir essas funções. “A ideia é um pouco parecida com o que  gente faz com eletroconvulsoterapia - os eletrochoques - que são muito eficientes e consagrados pela literatura, ao contrário do que a opinião pública propaga e publica”. Porém, diferentemente dos métodos utilizam eletricidade, a estimulação magnética não possui efeitos colaterais e por isso, pode ser feito com o paciente ainda acordado.

Para aplicar o protocolo, Caio esclarece um fator importante, chamado por eles de limiar-motor, que define o quanto de intensidade é necessário colocar naquele cérebro para que o sistema desempenhe uma certa função. “O meu cérebro é diferente do seu que é diferente do outro, com fases diferentes do desenvolvimento e históricos familiares. Por esse motivo, o meu limiar de força para mexer o dedo da mão vai ser diferente do seu e é preciso calcular isso”, exemplifica. A partir desse cálculo, Caio e sua equipe passavam para o protocolo de intensidade em cima desse limiar e para a quantidade de frequências de pulsos eletromagnéticos (medida em hertz) que seriam necessários fazer com a bobina no cérebro do paciente.

“A grande questão do autismo é que ele é um problema que afeta a epigenética do desenvolvimento e começa as vezes muito antes de você pensar em engravidar”, pontua.“De acordo com o útero que você se desenvolve, de onde você nasce, o tipo de comida que você come, etc, o perfil da criança vai mudando e o que gera milhares de tipos diferentes de autismo.” Frente a esse empecilho, Caio teve que optar uma dificuldade relacionada à condição que fosse comum aos pacientes escolhidos para assim poder dar uma abordagem e conseguir resultados mais precisos. No caso da pesquisa, o escolhido foi o comportamento restrito-repetitivo, que aborda maneiras de repetição de atitudes que amadurecem junto com o desenvolvimento da criança. “Quando pequeno, a pessoa fica repetindo ações que a gente chama de senso-motoras, como mexer os braços”, ilustra. “Só que quando mais velho, condutas vão se tornando rituais que restringem a pessoa e fazem com que ela se socialize menos por querer fazer sempre a mesma coisa.”

Esses comportamentos são comprovadamente causados por disfunções no córtex pré-frontal, a região cérebro responsável por planejar e realizar as chamadas funções executivas, tais como memória e capacidade de tomadas de decisão. Portanto, qualquer distúrbio na formação desses tecidos cerebrais, seja macro ou microscopicamente, pode causar alterações funcionais que, de tão delicadas, não podem ser captadas por ressonância, somente por coleta do próprio tecido. “Elas criam loopings de relacionamento do córtex com meus núcleos da base e faz com que meus comportamentos fiquem se repetindo e que eu tenha dificuldade de fazer mudanças.”, esclarece Caio

Em sua pesquisa, foram selecionados os pacientes de alto-funcionamento para isolar melhor a condição, ou seja, indivíduos que já possuem cérebros melhor formados. A partir disso foi feito um protocolo excitatório - ao contrário da maioria dos estudos mundiais que preferem os métodos de inibição que são mais seguros - com ondas tipo teta em conjuntos espaçados (bursts) de 5 e 50 Hertz, o que provoca ambos protocolos ao mesmo tempo. “Essa foi uma fórmula que foi estudada e racionalizada durante muito tempo, principalmente pelo doutor Marcolin, especialista na área", afirma. "Ele realmente achou que isso ia fazer toda a diferença com os pacientes com autismo e de fato fez. Pra eles, tudo se encaixou de forma muito mágica."

Caio conta que além de uma melhor desenvoltura dos pacientes, a duração dos resultados foi mais longa do que na maioria dos casos, em que é necessário refazer de meses em meses, chegando a durar até um ano após a estimulação. Apesar dos resultados positivos, ele ressalta que ainda são necessários muitos estudos antes de poder considerar o método um tratamento novo. “Isso ainda não foi aprovado nem pela Associação Brasileira de Medicina e nem pela Anvisa, então não podemos sair por aí estimulando crianças e jovens sem acompanhamento profissional nenhum”, alerta. “A nossa pesquisa pegou especificamente meninos,entre 9 e 17 anos, destros e sem outras comorbidades psiquiátricas num estudo sem um grupo controle. Não significa que podemos sair tratando todo mundo.”

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