Neste artigo, são analisados comparativamente o romance de formação paradigmático Os anos de aprendizado de Wilhelm Meister, de Goethe, e Grande sertão: veredas, de João Guimarães Rosa, sob a perspectiva teórica de Mikhail Bakhtin.
O trabalho tece considerações sobre o enfoque da personagem pelo autor no romance de Dostoiévski a partir da obra Problemas da poética de Dostoiévski de Bakhtin, estabelecendo uma analogia entre a relação autor/herói na obra de Dostoiévski e a relação autor/herói no romance Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa. Segundo Bakhtin, Dostoiévski inaugura o romance polifônico, dialógico, apresentando um herói cuja voz está equiparada à voz do autor. É nesse mesmo contexto que se analisa, no romance rosiano, o narrador Riobaldo.
Este trabalho pretende apresentar uma leitura de “Zingarêsca”, último conto de Tutaméia – Terceiras Estórias (1967), de Guimarães Rosa (1908-1967), buscando evidenciar as características do grotesco que tornam o mundo de Zepaz um mundo estranhado que já não permite uma orientação – conforme teoria discutida por Kayser. Pretende ainda mostrar, amparado pela teoria de Mikhail Bakhtin sobre carnavalização, que o grotesco se faz presente na eliminação de censuras ocasionada pela festa carnavalesca dos zíngaros, originando, assim, a dissolução do que é considerado ordenado, a
desconstrução do convencional.
Este artigo se propõe a relacionar duas abordagens teóricas produzidas no âmbito do pensamento de três teóricos do século XX. São eles Mikhail Bakhtin, Gilles Deleuze e Felix Guattari, cujas abordagens dão conta da produção do discurso romanesco e da literatura menor em contextos culturais não hegemônicos. Bakhtin concebe o funcionamento do discurso romanesco pelo aproveitamento de uma dicção familiarizada com o menor, com o baixo, com a língua que ecoa na rua e não nos salões ou vozes aristocráticas; já a literatura menor de Gilles Deleuze e Felix Guattari é apresentada como o uso menor e hierarquicamente desprestigiado que uma minoria faz no seio de uma língua reconhecida culturalmente como superior.Da associação proposta aqui resulta a reflexão de que uma literatura produzida em meio não hegemônico se dá pela ativação de uma força linguística resultante do uso da língua que uma minoria faz em uma língua maior; estende-se essa percepção ao modo de realização literária que uma comunidade de produtores pertencentes a um grupo não hegemônico faz frente ao já avaliado criticamente em contextos culturais dados como mais relevantes histórica e culturalmente.
O objetivo deste estudo é analisar o romance Grande sertão: veredas, de João Guimarães Rosa, a partir de conceitos elaborados por Mikhail Bakhtin. Este desenvolveu a concepção de romance polifônico em sua interpretação da obra de Fiódor Dostoiévski, desvendando o procedimento do escritor de incluir em sua prosa ficcional a multiplicidade de vozes presentes na sociedade. Trata-se do fenômeno do dialogismo, em que diferentes discursos entram em interação, se manifestam em réplicas diretas ou veladas, reagem entre si, estabelecem consonâncias ou dissonâncias, transformando-se continuamente, sendo que o autor aparece como uma entre as muitas vozes da narrativa. Nesse sentido, apesar de haver apenas uma voz em enunciação, consideramos Grande sertão: veredas um romance polifônico e interpretamos trechos em que o dialogismo é patente. Em seu estudo sobre François Rabelais, Bakhtin introduziu o conceito de carnavalização da literatura, processo por meio do qual foram incorporadas manifestações da cultura popular na linguagem literária. Bakhtin vale-se ainda da noção de grotesco, estilo antigo caracterizado pela mistura de formas. Tanto em Rabelais como em Guimarães Rosa, a linguagem está radicada na oralidade e em expressões populares, ainda que amalgamada a um vasto conhecimento erudito. Desse prisma, analisamos duas novelas (O recado do morro e Meu tio o Iauaretê) e um conto (Darandina) de Guimarães Rosa, além do romance Grande sertão: veredas. Seguindo uma linha de pensamento alinhada às ideias de Bakhtin que encontram ressonância em Guimarães Rosa, nas quais as fronteiras são indistintas e a transformação é inerente ao movimento da vida, procuramos centrar a análise na superação da lógica binária moderna, dando um salto para o polissêmico. É dessa maneira que propomos uma atualização da visão sobre a relação amorosa em Grande sertão: veredas, com o apoio teórico de Michel Foucault.