Utilizando tecnologias de rastreamento do olhar, pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP vêm estudando o comportamento visual humano e seus focos de atenção.
“Atenção é a disponibilidade de recursos para processar informação. Para qualquer atividade, precisamos alocar atenção para processar as informações que vêm dos órgãos sensoriais. Estamos descrevendo o comportamento da tensão visual”, explica Camilo Rodegheri, autor da tese de doutorado à qual a pesquisa corresponde.
O pesquisador explica que há regiões no espaço para as quais respondemos mais rapidamente quando estimuladas, porque há mais atenção alocada nelas. “Queremos entender como ocorre o processo da transição de um local para outro, como algo chama sua atenção”.
Chamar atenção é realocar seu potencial de processar informações para um determinado ponto. “Algumas coisas se destacam muito e conseguem capturar sua atenção para determinadas regiões do espaço”. Um exemplo do uso da atenção visual é o ilusionismo. O “mágico” guia o olhar do observador para determinado ponto para que ele não preste atenção a determinadas ações dele. É justamente neste instante que o truque ocorre.
O trabalho da equipe é diferenciado pois estuda fatores que antes não eram considerados. “Quantos milissegundos há entre um foco atencional em um canto e no outro canto? Quanto tempo leva-se para desalocar a tensão de uma e alocá-la em outra? É esse tipo de pergunta que queremos responder”.
O método utilizado pela equipe chama-se cronometria mental. Ele mede o tempo que leva para apertar um botão a partir do momento em que um estímulo visual assinalou para que o fizesse. “Usamos o tempo da resposta como indicador de desempenho. Nele, está compreendido o tempo que a informação leva para alcançar a retina, o tempo de processamento dela e o tempo de resposta muscular”.
Um dos equipamentos utilizados foi o rastreador do olhar (eye-tracker), que permite observar por qual região o olhar esteve transitando. “Esta tecnologia é uma solução nacional, a primeira deste gênero, que desenvolvi em meu Trabalho de Conclusão de Curso. O equipamento estrangeiro, comprado no Brasil, custa em torno de R$ 100 mil e R$ 200 mil. Desenvolvi isso com custo muito menor”, conta Rodegheri.
O pesquisador explica que a visão em alta definição do ser humano é muito limitada. “O que temos de impressão do mundo é um trabalho de processamento do cérebro. À medida que visualizamos o mundo, o cérebro soma essas imagens e constrói a impressão de alta-definição”, afirma.
O estudo ainda está na fase inicial. Porém, ela ajudará a esclarecer as discussões sobre linhas de pensamento a respeito do funcionamento da atenção visual. “Com esse experimento, esperamos dar um passo a mais para estender o conhecimento para saber como a atenção visual funciona de fato”, pontua o pesquisador.
Aplicação prática
A tecnologia de eye-tracking possui diversas aplicações. Ele é amplamente utilizada marketing e estudos sobre acessibilidade de sites, por exemplo. Associando-a com os conceitos de alocação de atenção, a equipe realizou, em maio deste anos, estudos sobre desempenho esportivo, em especial sobre o desempenho de goleiros em defesas de pênaltis.
Os experimentos foram feitos a convite da oftalmologista da Seleção Brasileira de Futebol. O teste que envolvia o rastreamento do olhar. O goleiro olhava para uma tela para na qual via o vídeo de uma cobrança de penalidade. Nele, o cobrador foi filmado pela posição do defensor, que só via o vídeo até o momento exatamente anterior ao pé encostar na bola, e ele tinha que defender como em uma cobrança normal.
Assim, o grupo filmava a resposta do goleiro. “Conseguimos a informação de qual é a estratégia visual do goleiro (isto é, para onde ele está olhando em detalhe no momento da cobrança), se ele acertou o lado da defesa e se ele antecipa à cobrança”, explica ele. Com isso, foi possível avaliar a estratégia do goleiro. “Há estratégias diferentes de acordo com o nível do jogador. Alguém que olha para muitos pontos em geral tem um desempenho pior nas defesas. Os profissionais, em geral, identificam o lado a partir da cabeça, ombro, coxa e pé”. O vídeo abaixo, feito com jogadores do time da Red Bull, mostra como foram os experimentos.