ISSN 2359-5191

28/08/2014 - Ano: 47 - Edição Nº: 47 - Saúde - Faculdade de Ciências Farmacêuticas
Estudo no Hospital Universitário detecta uso de cocaína por mais de 5% das gestantes
Reduções de peso, perímetro encefálico e comprimento do recém-nascido estão relacionadas à exposição fetal à droga
Imagem: Wikimedia Commons

Um estudo epidemiológico realizado com 342 gestantes no Hospital Universitário da Universidade de São Paulo revelou um índice de 5,6% de uso de cocaína durante a gravidez. Para determinar a exposição do feto à droga, foram analisadas as primeiras fezes do recém-nascido, chamadas de mecônio, que permite a detecção de analitos de narcóticos nos últimos seis meses de gravidez.

O trabalho, desenvolvido por Cínthia de Carvalho Mantovani, sob a orientação do professor Doutor Mauricio Yonamine, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas, consistiu em desenvolver e validar métodos analíticos para avaliar amostras de mecônio quanto à exposição à cocaína e ao tetraidrocanabiol (THC, princípio ativo da maconha). O mecônio começa a ser produzido no segundo trimestre de gestação e vai se acumulando até o final da gravidez. Trata-se, porém, de uma matriz complexa que exige diversas etapas de purificação anteriores à análise.

As primeiras etapas que precedem a análise consistem na extração acelerada por solvente, tornando a massa sólida um extrato aquoso, que por sua vez passa por uma fase de extração em fase sólida, capaz de reter os analitos que serão investigados. A análise de fato é feita por cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massa, etapas responsáveis pela separação e identificação dos compostos. "Esse método permite uma identificação praticamente inequívoca, uma 'impressão de digital' [da droga]", explica Cínthia.

Abordadas no Hospital Universitário, as gestantes participantes do estudo autorizavam a utilização das amostras de mecônio e eram entrevistadas sobre uso de psicoativos durante a gravidez. Das 5,6% com resultados positivos para cocaína, só 43,8% admitiram o consumo. Após o parto, dados dos recém-nascidos também foram registrados. Comparados à análise das amostras, as informações mostravam uma correlação entre a exposição à cocaína durante a gestação e redução de peso, comprimento fetal e perímetro encefálico dos bebês se comparados às medidas consideradas normais. "Se o exame fosse feito a partir do sangue ou da urina da mãe, a janela de detecção seria bem menor e, nos casos em que o uso se deu meses antes do parto, não teria sido constatado, apesar do feto ter sido exposto", afirma a pesquisadora. Estudos anteriores também identificam uma relação proporcional entre a quantidade consumida da droga e os efeitos sobre o recém-nascido.

Índice surpreendente

Cínthia relata que o número de positivos foi uma surpresa, em especial quando é considerado o uso de cocaína da população brasileira em geral. Segundo o Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (Lenad) de 2012, a porcentagem de usuários é de 2%, bem menos da metade das gestantes cujo uso foi constatado na pesquisa. “É lógico que é preciso levar em conta que o estudo foi realizado com uma população bem específica. Não dá para extrapolar os resultados para a cidade de São Paulo, por exemplo”, explica.

Para a autora, as gestantes podem não desconhecer os efeitos específicos da cocaína sobre o feto, mas têm uma consciência mínima de que o consumo tem consequências negativas para o organismo. "Uma das participantes chegou no Hospital Universitário em trabalho de parto. Ela estava em uma rave há três dias e disse que tinha usado cocaína e outras drogas. Não acho que as mães desconhecem os efeitos e alterações da cocaína no organismo". Por trás dessas ações, muitas vezes a dependência química dificulta a abstinência mesmo no período da gravidez e, para Cínthia, a situação exige uma assistência específica a essa população, uma estrutura a que possam recorrer ao engravidar: "Estudos mostram que muitas das mães que são usuárias de drogas não fazem o acompanhamento pré-natal. Toda a gestação fica comprometida".

A falta de dados consistentes sobre o problema também é um agravante. Enquanto países europeus e os Estados Unidos fazem levantamentos praticamente anuais do uso de drogas da população em geral, os grandes estudos demográficos relativos ao uso de drogas no Brasil são apenas três: os Levantamentos domiciliares sobre o uso de drogas psicotrópicas no Brasil, de 2001 e 2005, e o Lenad, em 2012. A pesquisadora vê também como importante o acompanhamento de crianças expostas durante o período fetal, uma vez que pesquisas internacionais mostram consequências posteriores ao nascimento, como problemas cognitivos, de memória e de comportamento: “Existem efeitos no longo prazo e acho que um trabalho adequado pode minimizar o que a exposição no período fetal causou”.

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