A presença das empresas público-privadas - empresas privadas em que há participação do Estado como sócio minoritário - no Brasil, é crescente apesar do pouco estudo realizado na área e configura uma possibilidade de intervenção estatal na ordem econômica, defende pesquisa realizada na Faculdade de Direito da USP por Rafael Wallbach Schwind. A criação, por empresas estatais, de subsidiárias dedicadas à participação em empresas privadas de diversos setores no país ocorre cada vez mais e pode garantir maior alinhamento dos interesses privados com os interesses estatais, uma vez que as decisões tomadas dentro dessas empresas contam com a deliberação do Estado como acionista minoritário.
O pesquisador se dedicou a estudar como ocorre essa participação aqui no Brasil. No país não há regulamentação específica para os casos em que o Estado é sócio minoritário. Nesse caso, valem as mesmas regras que se aplicam a qualquer sócio com participação menor que 50% em uma empresa. A estatal não tem preponderância no poder de decisão, mas tem participação. Assim, a sociedade garante que os interesses públicos, representados pelas estatais estejam sempre em pauta nas decisões a serem tomadas em uma empresa privada.
“Você tem o caminho da privatização, que seria uma intervenção mínima, o caminho da estatização, da criação de empresas estatais, que é uma intervenção mais forte, e tem o meio termo, que é justamente a participação estatal em empresas privadas”, defende Rafael Schwind.
Alguns exemplos de participações desse tipo são as do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) - a estatal é sócia minoritária principalmente de empresas de petróleo e gás, mineração, energia elétrica e papel e celulose. Os Correios (Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - EBCT) estão em processo de criação da subsidiária CorreiosPar para cuidar de suas participações minoritárias em outras empresas. A empresa pretende ter sociedade com prestadoras de serviços postais eletrônicos, bancos e operadoras de cartões de crédito. A estratégia é participar de tudo que envolva o processo de envio de fatura aos clientes, para facilitar o caminho.
As participações são feitas por meio de acordos e contratos, que podem se adaptar a cada caso. Há situações, também, em que empresas estatais vendem a maior porcentagem de sua parte de um negócio que administra.
A Infraero, estatal que administra a maioria dos aeroportos do Brasil, por exemplo, iniciou há dois anos processos de concessões de alguns aeroportos à iniciativa privada. Nessas concessões, a estatal tornou-se acionista das empresas que adquiriram os aeroportos, com participação de 49%, e as concessões de cinco aeroportos foram feitas por meio de pregões em que os grupos vencedores tornaram-se sócios majoritários. Nos acordos firmados, porém, foi garantido que, mesmo como sócia minoritária das concessionárias, a Infraero teria poder de decisão em “temas relevantes”.
Um exemplo de acordo dessa natureza é o de golden share, em que normalmente o sócio majoritário vende parte das ações da empresa, entretanto ainda tem garantidos alguns poderes, como o de veto. Nas passagens de estatais à iniciativa privada, os acordos geralmente visam dar algumas preferências à estatal que agora é sócia minoritária. Segundo a pesquisa, o Estado pode reduzir a sua participação em uma empresa estatal e manter uma golden share de sua titularidade para que seus interesses sejam levados em conta na empresa que se tornou público-privada. A sistemática se originou no contexto das privatizações no Reino Unido.
As formas de decisão de que empresas serão contempladas pela participação do Estado e quais assumirão serviços públicos antes controlados por estatais também podem variar, de acordo com os interesses e as necessidades previstas pela estatal.