ISSN 2359-5191

07/10/2015 - Ano: 48 - Edição Nº: 93 - Saúde - Instituto de Ciências Biomédicas
Mosquito transgênico é medida eficiente na prevenção à dengue
Grupo de pesquisa da USP desenvolve mosquito geneticamente modificado
Imagem do Aedes aegypti modificado em laboratório (Foto: Danilo Carvalho e Margareth Capurro)

A dengue é uma doença tropical, transmitida pelo mosquito Aedes aegypti, que assola o Brasil de forma recorrente desde a década de 80. Surtos da doença acontecem algumas vezes por ano, ora em uma região, ora em outra, e não é incomum que você conheça alguém que contraiu o vírus ou que você mesmo já tenha tido algum dos sintomas e ficado em estado de observação. As medidas básicas de controle, hoje, são bastante conhecidas e amplamente divulgadas, mas elas não são suficientes para evitar as explosões de dengue e controlar a epidemia de maneira eficiente.

Nos últimos anos, a busca por novos métodos e técnicas para vencer a batalha contra o mosquito têm crescido. No Instituto de Ciências Biomédicas da USP (ICB-USP), o laboratório chefiado pela professora Margareth Capurro desenvolve técnicas para criar mosquitos geneticamente modificados, interferindo na transmissão via um mosquito, em busca de reduzir significativamente a epidemia do Aedes aegypti sem riscos ambientais.

Medidas de controle tradicionais

Margareth explica que existem diferentes tipos de medidas de controle, conhecidas como "controle integrado", para o combate ao mosquito. As mais básicas são as medidas mecânicas, como, por exemplo, a retirada de criadouros. "É possível retirar alguns criadouros artificiais, que se sabe que existem nas casas. Mas não se consegue retirar o rio Pinheiros, por exemplo", explica a professora.

Outro método bem difundido, a nível mundial, é o controle biológico. "Existem algumas situações, principalmente na Ásia, em que faz parte da cultura popular ter vasos com plantas aquáticas. São colocados peixinhos nesses vasos, que não vão ser alimentados para que eles comam a larva de mosquito", explica. No Brasil, apesar de essa cultura de plantas não ser comum, essa técnica é utilizada em algumas situações, como em pequenos lagos ou fontes.

Além das medidas mecânicas e biológicas, existe ainda o uso de inseticidas químicos. "Hoje, o inseticida químico não é usado como antigamente, com aquela visão de pulverizar toda semana, na cidade inteira, para diminuir a população de mosquitos porque isso seleciona resistências", afirma. Há certos locais onde não é possível usar mais nenhum produto porque os mosquitos são 100% resistentes.

Atualmente, o inseticida é utilizado de outra maneira, em situações específicas em que não restam alternativas, como no caso de reservatórios artificiais. "Em locais onde há falta d'água, as pessoas têm reservatórios 'de fundo de quintal', que armazenam uma água mais suja e que não são como caixas d'água limpas e fechadas. São reservatórios fixos, que não podem ser eliminados, pois, para isso, seria preciso elaborar todo um pensamento novo de distribuição de água encanada e de saneamento básico" explica Margareth. Nesses tanques, então, utilizam-se larvicidas, inseticidas que matam as larvas, mas que, no entanto, não têm uma eficiência total. Eliminam-se apenas aqueles criadouros que são encontrados; há muitos reservatórios escondidos. "No tamanho da população, não faz diferença".

A técnica da transgenia aparece como uma alternativa a essas medidas que, sozinhas, acabam por ser pouco eficazes. "O pensamento de mosquito entra porque, se você libera o macho, ele encontra a fêmea. Ele acha o reservatório escondido, acha o mosquito que está vindo desse local. E é essa a ideia: utilizar o próprio mosquito para combater o mosquito", explica Margareth. "A nossa técnica não busca erradicar a doença e nem ser considerada a única opção. Ela é um adicional às medidas de controle", acrescenta, e faz parte do controle integrado.

Larva do mosquito colorida artificialmente (Foto: Danilo Carvalho e Margareth Capurro)

Larva do mosquito colorida artificialmente (Foto: Danilo Carvalho e Margareth Capurro)

Abordagens

O laboratório do ICB trabalha, em conjunto, com duas abordagens experimentais: a introdução de machos estéreis, em que há a competição pelos machos selvagens, e a inserção gênica. A ideia é usar dois tipos de linhagem: uma que diminua a população de mosquitos e outra que combata diretamente o vírus.

Para o desenvolvimento desse método, o primeiro passo foi liberar machos modificados, com o objetivo de reduzir a população. A técnica do macho estéril clássico, por exemplo, é um exemplo que foi utilizado num primeiro momento: criam-se os insetos em massa, pegam-se as pulpas e as esterilizam por radiação para que esses animais sejam liberados. Trata-se de uma técnica inundativa, como explica a professora, em que esses machos estéreis são colocados na natureza em grande quantidade para que a fêmea não encontre o selvagem. O problema no procedimento clássico, contudo, é que a irradiação é um processo caro e pouco seguro. "O custo de um projeto como esse é muito alto. O irradiador é um equipamento caro, que necessita de uma manutenção constante, que precisa estar em cada município para ser eficaz, além de ser uma fonte radioativa", explica. "O transgênico facilita. Agora, pode-se trabalhar e distribuir esses insetos de tal maneira que cada município pode criá-los".

Já existe uma linhagem transgênica pronta, desenvolvida por cientistas ingleses que se juntaram em uma empresa, a Oxitec, e que foi avaliada, no Brasil, pelo laboratório de Margareth. "O Brasil foi um dos países que pegou essa linhagem para testar se a tecnologia funcionava aqui. É muito diferente fazer o experimento no laboratório e pegar esse animal e jogar na natureza. Há uma série de fatores que devem ser avaliados na região em que o mosquito vai ser utilizado: o vento, a chuva, temperaturas drásticas e a umidade são alguns deles", explica a professora. Nessa linhagem, o macho não era estéril, mas podia matar a larva. "Cientificamente falando, essa opção não é a melhor para um programa de grande porte. A linhagem produz machos e fêmeas, mas as fêmeas não são utilizadas, o que faz com que 50% da produção seja lixo", afirma. Mesmo que essas fêmeas, por terem sido criadas em laboratório, não transmitam a doença, isso gera um impacto negativo na população: mais mosquitos acabam sendo liberados.

Larva do mosquito colorida artificialmente (Foto: Danilo Carvalho e Margareth Capurro)

"A primeira coisa que pensamos para melhorar o projeto seria fazer machos estéreis: não vai ter larva", afirma Margareth. Para isso, é preciso fazer uma transgenia que modifique o mosquito para que ele seja estéril. Além disso, para produzir uma geração somente de machos, o laboratório está trabalhando em projetos de reversão sexual, em que as fêmeas têm seu sexo trocado. "Essas duas linhagens fazem uma dupla transgênica. No mundo ideal, a linhagem perfeita seria a de machos estéreis e a produção apenas de machos, que é o que estamos tentando desenvolver", acrescenta.

Associado a isso, os pesquisadores do ICB também estão trabalhando em uma nova linhagem que, além de suprimir os mosquitos, vai combater o próprio vírus. Mesmo em populações em que os mosquitos parecem ter sido suprimidos, eles ainda estão presentes, pois não foram erradicados. Essa população, nunca exposta ao vírus, torna-se "dessensibilizada", de acordo com a professora, o que faz com que, quando o vírus retornar, exploda violentamente uma epidemia. "Com essa dupla, você vai continuar suprimindo os mosquitos, mas, agora, quem sobrou vai também combater o vírus".

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