ISSN 2359-5191

18/11/2015 - Ano: 48 - Edição Nº: 112 - Economia e Política - Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade
Pessoas com deficiência enfrentam dificuldades para chegar ao ensino superior
Essa parcela representa 10% da população mundial, mas ainda é excluída do ambiente educacional
Foto: Pixabay

Por que muitas pessoas com deficiência não conseguem chegar ao ensino superior? É essa a pergunta que motivou Cristina de Carvalho a realizar a sua dissertação de mestrado na FEA-USP. Ela estruturou a pesquisa com base em seis entrevistas que realizou com alunos que fizeram matérias na FEA, todos com algum tipo de deficiência. Orientada pelo professor Edson Riccio, ela ficou intrigada ao perceber que, na empresa em que trabalhava, era muito difícil cumprir a lei 8.213, que prevê que todas as empresas com mais de mil funcionários devem preencher o quadro com pelo menos 5% de pessoas deficientes. “Muitas dessas pessoas não tinham graduação, não tinham alguns cursos específicos. Nós praticamente não conseguíamos cumprir essa cota”, relata.

Para entender melhor o que acontece  com as pessoas deficientes no mercado de trabalho e no ambiente escolar, Cristina  teve que voltar um pouco tempo: “Na Idade Média e até mesmo na Antiguidade essas pessoas foram muito marginalizadas. Em Esparta, por exemplo, as pessoas que nasciam com alguma deficiência eram automaticamente executadas”. Foi só no século 20, depois da Segunda Guerra Mundial, que os deficientes começaram a ganhar mais visibilidade: “Muitos veteranos de guerra voltam mutilados, e eles são considerados os heróis do povo norte-americano. Eles tinham que oferecer alguma assistência para os seus heróis”. A partir daí, os Estados Unidos começaram a desenvolver algumas políticas para criar leis que visam protegê-los. Em 1994, durante uma conferência promovida pela Unesco, 92 países assinaram a Declaração de Salamanca, em que se comprometem a cuidar mais das pessoas com deficiência, principalmente em relação ao ensino: “De 1994 para cá, percebemos que o Brasil começou a desenvolver mais leis voltadas para garantir os direitos dessa parcela da população”.

Mesmo assim, os avanços são poucos. Quando Cristina analisou dados sobre a vida de pessoas com deficiência, principalmente em termos de educação, independentemente do país, elas sempre possuíam condições inferiores: “Pegando o percentual da população que tem ensino fundamental, médio e superior, você tem um número. Pegando os mesmos dados das pessoas com deficiência, em qualquer país, o número é até 20% menor”.

Ao realizar as seis entrevistas, os alunos declararam que a legislação melhorou bastante nos últimos anos, mas eles ainda passam por dificuldades. Um dos entrevistados, deficiente auditivo, possui o direito de ter um intérprete durante as aulas. Mas, na prática, não é bem assim: “Ele falou que tinha dificuldade para entender as matérias, porque fazia leitura labial, e o professor às vezes promovia debates em sala. Com várias pessoas falando ao mesmo tempo, era quase impossível entender as discussões”. Neste caso, o aluno não sabia que possuía direito a um intérprete, e, mesmo se ele soubesse, não saberia como pedir ajuda para conseguir um. “Cheguei à conclusão que é necessário que a Universidade divulgue mais a inclusão dos deficientes, porque às vezes o serviço existe, mas ninguém sabe”, comenta.

Em outro caso, as barreiras arquitetônicas foram as principais inimigas. Um aluno formado recentemente, que ficou paralítico durante a faculdade, sempre se deparava com problemas estruturais: “O prédio principal da FEA não possui elevadores, mas possui uma rampa, que, a princípio, supriria a necessidade dele. Só que aquela rampa é muito inclinada, então ele nunca conseguia subir sozinho, sempre alguém tinha que empurrar a cadeira”. O estacionamento da unidade, sem cobertura, também era um obstáculo nos dias de chuva. O estacionamento de trás, que possui proteção, tem o piso irregular: “Ele preferia se molhar, porque, pelo menos, ia em uma superfície plana”.

Dentro da USP, existe uma instituição que se chama Inclusp, voltada para a inclusão de alunos dentro da universidade. Hoje, existem aproximadamente 200 pessoas inscritas na instituição. O problema é que ela depende de o aluno ir atrás e declarar que possui alguma deficiência, que precisa de algum apoio da faculdade. “Como a maioria não conhece esse direito, ou muitas vezes tem vergonha de declarar a deficiência, o número que vemos hoje é muito baixo”.

Boa parte dos facilitadores encontrados no ambiente universitário acaba vindo de fora. Os amigos, por exemplo, foram apontados como principais agentes de ajuda, seja para empurrar a cadeira de rodas ou para explicar a matéria perdida. Quanto às barreiras, Cristina diz: “Os professores muitas vezes estão despreparados em toda a jornada. A própria instituição às vezes fala que possui determinado recurso, mas, na hora, ele não está funcionando ou não existe”.

Uma das possíveis medidas para aumentar o número de deficientes nas universidades é a adoção de cotas. Atualmente, tramita no Congresso um projeto de lei que quer tornar obrigatório que 10% das cotas sejam reservadas para essa população. Dos seis entrevistados, apenas um era contra a medida, por achar que isso acabaria rotulando os deficientes como menos capazes. Cristina acredita que as cotas são necessárias: "No atual contexto que vivemos, as cotas são fundamentais. O ideal é que não precisasse, mas, no momento, dado todo preconceito que a sociedade tem, se não tiver cota, é muito difícil inserir a pessoa na educação e no trabalho", finaliza.

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