ISSN 2359-5191

25/05/2000 - Ano: 33 - Edição Nº: 07 - Sociedade - Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas
Intelectuais discutem realidade social e universidade pública

São Paulo (AUN - USP) - Durante a greve das universidades estaduais paulistas, a USP paralisou suas aulas, suas atividades de pesquisa e extensão. Entretanto, nesses 52 dias houve espaço não só para as tradicionais atividades de greve - as assembléias e passeatas -, mas também para debates às vezes incomuns no meio acadêmico.

Para que se mantenha o rigor e a independência do trabalho científico e intelectual, muitas vezes a universidade se coloca como um lugar distante e alheio, mas foi em aulas realizadas durante a greve que os acadêmicos surgiram para participar e oferecer suas percepções na discussão da realidade política e social do país.

A "aula na greve" acontecia três vezes durante a semana reunindo intelectuais de destaque das mais diversas áreas como Marilena Chauí e Olgária Mattos, da Filosofia, o jurista Hélio Bicudo, o economista Plínio Arruda Sampaio, o crítico teatral Sábato Magaldi e o teórico de literatura Antônio Candido discutindo temas como democracia, a atual política de arte e cultura, o destino da universidade pública, movimentos sociais, políticas de saúde e educação e o papel da imprensa.

As aulas, que aconteciam em um gramado ao ar livre, chegavam a reunir em média 500 pessoas ,entre alunos e funcionários, que depois das exposições dos professores participavam com perguntas ou opiniões sobre o tema debatido.

A aula de Marilena Chauí, "Democracia e políticas públicas", analisou o desmonte da universidade pública como mais uma etapa do sucateamento do ensino brasileiro, que já teria atingido por completo as escolas de ensino médio e fundamental e prosseguiria rumo à universidade em um processo que se estende desde a ditadura até os dias de hoje. "Paulo Renato coroa a obra da ditadura desmontando a escola pública", disse a filósofa que, posicionando essa greve em um contexto mais amplo, defende que a recuperação da excelência do que é público não é um passado nostálgico mas uma necessidade para se pôr fim ao processo de exclusão. Segundo ela, o Estado ao se colocar como mero "gerenciador" de recursos exime-se da responsabilidade social, transformando direitos conquistados através da ação social e política em "serviços", em privilégios. E o privilégio, ressalta Chauí, implica necessariamente em exclusão.

Sua análise prosseguiu afirmando que à medida que provoca uma crescente despolitização, o liberalismo é contraditório à democracia e não intrínseco a ela, como se poderia pensar. "A democracia não é uma forma de governo mas uma forma da sociedade e nesse sentido o conflito é legítimo", afirmou Chauí, que criticou ainda a repressão aos movimentos sociais. "Toda vez que a sociedade se manifesta a resposta do governo é a violência".

A criminalização dos movimentos sociais também foi debatida na aula "Imprensa e direitos civis", de Plínio Arruda Sampaio e Hélio Bicudo. Arruda Sampaio defendeu o direito do cidadão de protestar contra tudo aquilo que fere seus direitos e criticou a atual postura dos meios de comunicação que, na sua visão, teriam deixado de ser o lugar do contraditório para "fabricar o consenso" e doutrinar ideologicamente. "Não existe cidadania de carneiros, de vaquinhas de presépio", concluiu, defendendo a luta social sem deixar de ressaltar que a "aula na greve" não era um comício mas uma aula com todo o "rigor científico pelo qual preza a universidade".

A defesa da mobilização social parece ter sido a tônica dos debates. Antônio Candido, mesmo estando afastado das salas de aula já há algum tempo (é professor aposentado da USP), esteve no campus da universidade para a aula "Cidadania e movimentos sociais". Ao falar da insuficiência da fórmula liberal, uma vez que os direitos civis em si não seriam suficientes, afirmou que "a realidade só corresponderá à teoria através da luta constante".

Ao abrir espaço para a discussão desses temas a "aula na greve" agradou tanto as pessoas que mesmo com o fim da paralisação deverá continuar, será a "aula na grama". O professor Jair Borin, organizador das aulas e mediador do debates, afirma que agora a "aula na grama" deve acontecer uma vez por mês na universidade.

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