Este estudo objetiva analisar o tema do duplo, sob uma perspectiva platônica, em "Ripuária", conto publicado no volume Tutaméia (Terceiras Estórias) (1967), de João Guimarães Rosa (1908-1967). A análise procurará evidenciar, no citado texto, a construção do amor a partir da ideia de androginia, presente em O banquete, bem como a ideia de prisão versus desejo de libertação, presente no mito da caverna, relatado no livro VII de A república.
Este trabalho enfoca duas narrativas deTutaméia, de João Guimarães Rosa,“Ripuária” e “Orientação”, que se voltam para a problemática da fronteira, do outro, do diferente, remetendo-nos também a questões como globalização e tradução. As relações entre narração, discurso e diegese em Tutaméia e sua versão alemã constituíram o ponto de partida de nossa pesquisa. Ao final, foi preciso considerar a questão da transculturação como fundamental para se compreender a obra desse autor.
Nesta tese analisamos Tutaméia de Guimarães Rosa, por meio de alguns contos, aos quais demos tratamento de texto poético: Curtamão, Azo de almirante, Ripuária, Quadrinho de estória e Lá, nas campinas... . Tutaméia é formado por quatro prefácios e quarenta contos caracterizados pelo sintetismo e complexidade temática, nos quais a poesia se faz presente. Tal elaboração temática mostra-se em enredos aparentemente simples, os quais retratam cenas cotidianas, vividas por homens comuns, capazes de ver o mundo sob outra perspectiva, cuja aparente ignorância oculta profunda sabedoria. A linguagem é a base que sustenta esse universo. Guimarães faz renascer termos, cria vocábulos, universaliza regionalismos. A palavra é devolvida ao estado de pureza original e enriquecida por uma imensa energia criadora, capaz de renovar o mundo e cicatrizar o sofrimento, incorporando a poesia no cotidiano. Essa mesma linguagem tece uma rede de imagens e símbolos que representam, simultaneamente, o individual e o coletivo, além de ampliar o sentido. Desse trabalho nasce Tutaméia, trama perfeita, na qual os contos estabelecem ligações entre si, ecoando uns sobre os outros, sem perder, entretanto, a individualidade. Diante de uma obra cuidadosamente arquitetada, o principal objetivo deste trabalho é entender como o símbolo, a imagem e outros elementos compõem o tecido desse livro, a função e o papel que desempenham, como se relacionam com os personagens e estabelecem elos entre os contos. Tal reflexão será embasada por obras que teorizam sobre poesia, material usado na construção dos contos.
Centro de Letras e Ciências Humanas. Programa de Pós-Graduação em Letras.
Tutaméia (Terceiras Estórias), de João Guimarães Rosa, é uma obra que desestrutura o leitor. Os elementos que a tornam labiríntica são múltiplos: dois índices, dois títulos, ordenação alfabética dos contos, anagramas, epígrafes, glossário, quatro prefácios, ilustrações de capa e ilustrações ao final de cada estória. A tese que se propõe defender nesta pesquisa dá conta de decifrar parte de um de seus enigmas. Curiosamente, o livro possui quatro prefácios distribuídos de entremeio aos contos. A nosso ver, desempenhando função específica planejada pelo ficcionista, tais textos estariam a serviço de “prefaciar” os correspondentes contos que antecipam. Através da análise dos onze contos que seguem o terceiro prefácio, “Nós, os temulentos”, o presente estudo objetiva evidenciar esta intenção do escritor. Em “Nós, os temulentos”, Guimarães Rosa explora, pela via do humor, a visão “diplópica” de “Chico, o herói”, propiciada pela embriaguez. Por meio da imagem deste temulento e de seus dualismos, o autor parece oferecer a chave temática do grupo de estórias que segue o referido prefácio. Acreditamos que a grande constante ou a coluna dorsal de tais contos é o tema do duplo. O primeiro passo a ser dado para provar esta tese inicia já na introdução do trabalho. Nesta parte, são detalhados os pormenores da peculiar estrutura de Tutaméia (Terceiras Estórias) e tecidas algumas considerações acerca dos quatro prefácios que a compõem. Em seguida, conforme antecipa o título do primeiro capítulo, é realizado “um périplo pelo território do duplo”, assunto de abrangência bastante considerável. Por último, são realizadas as análises dos contos “O outro ou o outro”, “Orientação”, “Os três homens e o boi dos três homens que inventaram um boi”, “Palhaço da boca verde”, “Presepe”, “Quadrinho de estória”, “Rebimba, o bom”, “Retrato de cavalo”, “Ripuária”, “Se eu seria personagem” e “Sinhá secada”.
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