Este artigo pretende desenvolver uma análise comparativa entre a passagem em que o personagem Gavião-Cujo transmite aos jagunços a notícia da morte de Joca Ramiro em Grande Sertão: veredas e a música “Notícia do Norte” do grupo paulista Nhambuzim. As relações intersemióticas devem ser exploradas de modo a proporcionar novas possibilidades de estudo, trabalho e interpretação. Para tanto, foi utilizada a semiótica como ferramenta teórica a partir da perspectiva de autores como Hildo Honório Couto e Lúcia Santaella, além de outros que nos ajudaram no aspecto musical, como Murray Schafer e James Russel. Ao analisarmos o processo intersemiótico, bem como ao avaliarmos até que ponto a música se assemelha ao romance, chegamos à conclusão de que esses sistemas são complementares e ganham novas dimensões quando contrapostos.
Este ensaio analisa a literatura oral e a canção popular em três passagens de “Uma estória de amor (Festa de Manuelzão)”, de João Guimarães Rosa. O objetivo principal é esclarecer de que modo a narrativa tradicional e o lundu despertam afetos e geram pensamentos no protagonista, além de sugerirem ações. Para tanto, o trabalho se concentrará na leitura crítica da novela e na análise de elementos musicais. Ao final, considerações de Hegel acerca da música indicam outras possibilidades de investigação.
Este trabalho tem por objetivo fazer uma leitura de dois contos (Lá nas campinas e Curtamão) e dois prefácios (Aletria e Hemenêutica e Nós, os temulentos), textos de Tutaméia, de Guimarães Rosa. O artigo analisa duas epígrafes de Schopenhauer, que insistem na releitura. Ambas estão em Tutaméia e têm sintonia com a noção de música tanto nesse pensador quanto na obra de Nietzsche. O pensamento nietzschiano, no entanto, apostando na música como arte do irrepresentável, através de aforismas e paradoxos, escapando ao conceitual e à metafísica de Shopenhauer, parece ser mais apropriado para a leitura de Tutaméia, obra construída numa escrita nômade, dionisíaca, numa festa em que há uma predominância do significante sobre o significado.
A proximidade entre música, filosofia e literatura na tradição alemã e seus métodos de aproveitamento dessas relações marcou profundamente João Guimarães Rosa, possibilitando-lhe desenvolver trilhas próprias a partir dos substratos oferecidos pelas cantigas tradicionais brasileiras. Os efeitos gerais das técnicas musicais em Sagarana, a influência de conceitos da filosofia de Heidegger, a utilização do Grundmotiv wagneriano em "O burrinho pedrês" e "Sarapalha" e as semelhanças entre a narrativa "A hora e vez de Augusto Matraga" e a ópera Parsifal, de Wagner, constituem o objeto desta reflexão.
As relações entre literatura e música constituem o objeto de pesquisa desta tese, dadas por meio da leitura de Sagarana, em especial: O burrinho pedrês, Sarapalha, Corpo fechado e A hora e vez de Augusto Matraga. O conceito de musicalidade incorpora as virtualidades sonoras da língua, as cantigas populares e as técnicas e formas eruditas da música, tais como contraponto e sinfonismo.
A tese se dedica à escrita de Guimarães Rosa sob a perspectiva da inarticulação: atenta às ocasiões em que a língua é levada a seu limite intensivo, ao se deixar atravessar sobretudo por vozes animais (grunhir, uivar, grasnar, piar, balir, sibilar, chiar, etc.), ruídos naturais (vento, água, fogo, etc.) e pelo registro musical. Explorando os modos singulares com que Rosa trabalha sonoridades investidas de forças anárquicas e criadoras, o estudo mostra que um dos traços mais relevantes em sua obra é trazer à tona a experiência de inarticulação da linguagem. Tal experiência manifesta-se como lugar privilegiado de desestabilização das fronteiras habitualmente pressupostas entre o que se convencionou chamar, de um lado e de outro, língua e vida - revelando o corpo material da língua como condição irredutível para que se descortinem vínculos intensivos com as coisas através da literatura. O pensamento contido na própria forma como Rosa trabalha a sua língua é posto em diálogo com as reflexões de Gilles Deleuze/Felix Guattari sobre a língua intensiva, e com as considerações de Friedrich Nietzsche acerca da experiência dionisíaca da música. Assim orientada, a tese se compõe de três ensaios. O primeiro aborda a inarticulação da língua na novela Buriti, de Corpo de Baile, em leitura centrada na personagem Chefe Zequiel e nos modos pelos quais sua sensibilidade auditiva prodigiosa capta micro-percepções sonoras da noite e as transfere para uma língua à beira de se tornar guincho, uivo, assovio do vento. O ensaio seguinte mostra o paralelo existente entre o retorno do ruído na música contemporânea, capitaneado pelo músico John Cage, e a invasão da escrita pela infinita gama de sonoridades não dicionarizadas de que se compõe a obra de Guimarães Rosa. Elabora-se ainda, em correlação com a analogia musical aí desenvolvida, uma interpretação da pouco comentada novela A estória do homem do Pinguelo, de Estas Estórias. Por fim, o terceiro ensaio apresenta a aliança entre poesia, música e inarticulação da língua no cerne do projeto literário do escritor mineiro. Oferece-se aí uma visão do processo criativo de Guimarães Rosa como transmutação de forças e afectos presentes nos sons antes da articulação, em uma língua poética em íntimo enlace com a musicalidade. Também se propõem, nessa ocasião, leituras de Cara-de- Bronze, de Corpo de Baile, e de Duelo, de Sagarana.