São Paulo (AUN - USP) - A lei de Anistia não deve ser estendida aos militares que praticaram a tortura durante o regime militar. Caso contrario, a Justiça estará garantindo a impunidade daqueles que utilizaram o aparelho do Estado para praticar seus crimes. Em entrevista ao AUN, o professor da Faculdade de Direito da USP Marcus Orione mostra como, da perspectiva do Direito, anistiar os crimes praticados pela ditadura é, em ultima instância, prejudicar o processo de consolidação da nossa democracia.
Para Orione, o fato dos torturadores serem agentes de um Estado de direito constituído, mesmo que de exceção, faz com que eles não possam utilizar de meios e instrumentos alheios a esse Estado de direito, como é o caso da tortura. Do outro lado, os opositores do regime estariam em condição de receber anistia, pois lutavam contra esse Estado de Direito, estando à margem do mesmo e só por isso em condição de utilizar meios não previstos na lei, como fizeram os guerrilheiros.
Segundo os que defendem que a anistia deva também abarcar os casos de tortura, revisitar esse passado recente seria colocar em risco o curto período de estabilidade democrática, que foi conquistada e mantida sem que essa exposição precisasse ser realizada. No entanto, o professor mantém opinião contrária. “Nunca conseguiremos cumprir nossa trajetória democrática sem revisitar esse entulho não-democrático (que nos circunda)”. Ele cita como exemplo a Argentina, Chile, Uruguai e Espanha, países que também passaram por regimes ditatoriais e que estão conseguindo levar adiante os processos de punição dos torturadores sem maiores turbulências.
Por uma pauta conjunta
Apesar de estar rodeado de países que estão conseguindo punir seus torturadores, o Brasil não tem ainda uma mobilização popular grande o bastante para exigir que o mesmo aconteça aqui. Para Orione, isso acontece porque os nossos diversos movimentos sociais estão preocupados hoje com outras pautas, diferente do que acontece nesses paises, onde a mobilização em torno do tema é maior. Ele crê, no entanto, que o assunto vem num crescente de importância, e cita a recente responsabilização do Coronel Ulstra por crimes de tortura cometidos no período da ditadura.
O professor acredita que a questão da tortura deve ser abraçada como uma causa conjunta de todos os movimentos sociais, já que é um símbolo não só da repressão praticada pelo Estado, mas também da impunidade de que os agentes do Estado parecem gozar hoje em dia. Absolver esses criminosos significa dizer que o Estado pode tudo, inclusive burlar suas próprias leis, completa.