São Paulo (AUN - USP) - Com o título “Direitos Humanos e a questão racial na Constituição Federal de 1988: Do discurso a práticas sociais”, a dissertação de Denise Carvalho dos Santos, apresentada recentemente, na Faculdade de Direito da USP, conclui que apesar dos avanços da Constituição de 1988 com relação às leis voltadas para a proteção e combate à discriminação do negro, ainda existem limitações para o cumprimento prático de algumas medidas.
Formada em Ciências Sociais pela Universidade do Rio Grande do Norte, Denise optou por fazer um recorte específico no seu tema, relacionando questões étnico-sociais à legislação brasileira. Segundo a pesquisadora, as ineficiências legislativas nessa área estão relacionadas à cultura arraigada no Brasil. “Deveria haver a conscientização da sociedade, mais trabalhos sociais, um equilíbrio entre a promoção da educação para a percepção dessas leis e de suas necessidades de aplicação”, diz.
A análise ganha destaque quando contrastada com outras teses da Faculdade de Direito da USP. Para Denise, as dissertações relacionadas ao tema apresentadas antes de sua pesquisa se baseiam unicamente na perspectiva das leis. “Minha idéia era fugir um pouco da forma de pensar daqui [Faculdade de Direito], onde há um grande enaltecimento da Constituição e dos tradicionais nomes da Faculdade”, contou Denise.
O mestrado em Direitos Humanos na Faculdade de Direito do Largo São Francisco é a única especialização da unidade que admite alunos formados em uma graduação diferente do Direito. O caráter interdisciplinar possibilitado por esse mestrado se manifestou na abordagem de Denise. “É interessante cruzar o Direito com as questões das Ciências Sociais. Não se faz ciência sem que ela se sustente pelo argumento”, afirmou Eduardo Bittar, professor orientador da pesquisa.
A dissertação de 174 páginas passa por muitos temas relacionados à questão étnico-racial no Brasil para chegar na discussão sobre as leis que contemplam essa realidade. A pesquisa é toda marcada pela explicação de como o racismo e o não acesso às leis são fatores sintomáticos no Brasil. Os dois primeiros capítulos abordam justamente o racismo presente na vivencia social do país, desde o preconceito explícito até o uso de terminologias que o reforçam. A questão da Constituição de 1988, que estipula o racismo como crime inafiançável e imprescritível (passível de punição e não extinguível), também é abordada no início da pesquisa.
O capítulo três mostra a efetividade da análise social agregada ao Direito. Para essa parte da dissertação Denise entrevistou personagens de instituições que deveriam garantir o cumprimento das leis contemplativas. As entrevistas, com um integrante da polícia militar e um funcionário do sistema jurídico, confirmam que muitas vezes a não educação desses profissionais para o trabalho com leis contemplativas colabora para a limitação de suas ações e alcances.
A partir da análise contemporânea da função social e efetividade de uma lei criada para a garantir a tolerância entre indivíduos étnico e culturalmente diferentes, Denise acredita contribuir para fazer valer a cultura de direitos e acesso a eles. “Foi uma grande conquista chegar onde chegamos, mas mesmo assim poderíamos implementar leis de maior efetividade para não necessitarmos recorrer tantas vezes”, disse a mestra, que escolheu o tema de sua defesa a partir de inquietações pessoais.