café

 

 
por
Júlia Tavares


O café e seus mitos



infotoques
Disque tecnologia

 

SEU SUPOSTO IMPACTO PARA A SAÚDE AFASTA CONSUMIDORES. MAS ESPECIALISTAS AFIRMAM O CONTRÁRIO: ATÉ QUATRO DOSES DIÁRIAS, A BEBIDA TRAZ BENEFÍCIOS



  Acordar de manhã e tomar o famoso “pingado”. No trabalho, mais uma xícara de café para começar o dia. Logo na primeira reunião do serviço, o cafezinho é ritual obrigatório para iniciar uma conversa. Depois do almoço, a bandeja com a garrafa de café virou passagem comum depois de pagar a conta. Mais outras xícaras devem acompanhar os lanches da tarde e da noite.

Foto:Cecília Bastos
O hábito de beber café, tão enraizado na cultura brasileira, está também cercado de mitos a respeito de seu impacto para a saúde. A Revista Espaço Aberto procurou especialistas na área de nutrição e coração que garantem: quatro xícaras diárias não trazem nenhum mal. Pelo contrário. “Algumas substâncias do café ocupam no cérebro os
mesmos lugares que ocupam, por exemplo, a nicotina e algumas drogas como a cocaína, e podem ser úteis para tratar pessoas com depressão”, afirma Luiz Antônio Machado, médico do Instituto do Coração (Incor ).



Infelizmente, os estudos sobre o café no organismo estão concentrados nos efeitos da cafeína, sua substância mais conhecida que, no entanto, só representa de 1 % a 2,5 % de sua composição. Com o propósito de relacionar todos os seus desdobramentos para a saúde, de acordo com tipo de café, modo de preparo e dosagens diárias, o Incor acabou de criar uma Unidade de Pesquisas do Café, que fará estudos integrados com a USP, Universidade Estadual do Rio de Janeiro e outras instituições estrangeiras.



Os estudos realizados no exterior, entretanto, detectam sustâncias que podem ser importantes para a saúde, como os minerais potássio, magnésio, cálcio e ferro; aminoácidos; lipídios; açúcares; vitamina B e ácidos clorogênicos. Uma dessas pesquisas mencionadas por Silvia
Cozzolino, professora do Departamento de Alimentos da Faculdade de Ciências Farmacêuticas, provou que esse tipo de ácido reduz a incidência de dependência de drogas.

Outra boa notícia para os apreciadores desta antiga bebida – que já era citada em textos bíblicos e foi difundida pelos muçulmanos no ano 500 d.C. – é que ela pode reduzir em 50 % a chance de manifestação da diabete. “A cafeína e outras substâncias melhoram a sensibilidade da célula à insulina (hormônio que facilita a absorção da glicose pelo organismo), prevenindo a ocorrência da doença”, diz Machado, também supervisor da equipe médica de coronariopatias do Incor.

Ainda assim, a “má fama” do café persiste. Seu suposto prejuízo à saúde é apontado por 93% dos não-consumidores do café, segundo o estudo Tendências do Consumo de Café no Brasil , encomendado pelo Ministério da Agricultura. Afinal, por que tanto medo?

“Já tive problema de estômago e gastrite. Cortei o café e o leite e os sintomas desapareceram”, conta Joílson de Oliveira, porteiro do Crusp, que diz beber no máximo três xícaras por dia. Para Machado, no entanto, esses sintomas devem estar ligados a outros hábitos, mas a Associação Brasileira da Indústria do Café desaconselha a bebida para quem já sofre de gastrite.

Foto:Cecília Bastos


O funcionário acrescenta que a esposa reclama de dor de cabeça quando pára de tomar a bebida por um longo período de tempo, dando margem para outra constante dúvida: o café vicia? Mais uma vez, a resposta do médico contraria o senso comum. “O que existe são sintomas da retirada da cafeína, como a dor de cabeça. A cafeína tem essa propriedade farmacológica, por isso está presente em alguns remédios.”

Silvia ressalta que falar de café sem especificar o tipo de grão e o modo de preparo pode ser perigoso. “Cada classe do produto tem substâncias em concentrações diferentes. O tempo de torrefação também interfere no sabor e na qualidade do produto”, afirma, lembrando que o Brasil produz basicamente dois tipos: o arábica e o robusta. O arábica tem mais aromas e sabores, e o robusta mais cafeína (até 4%). Por isso o tipo mais comprado é uma mistura: os blends.

Tanto Silvia como Machado concordam que o café coado no filtro é mais aconselhável que o café fervido junto com a água. “A água não precisa ferver. Dessa forma é possível retirar uma série de substâncias sem extrair óleo demais dos grãos”, recomenda o médico.

Já se o consumo do café ultrapassa muito além do meio litro diário, ele pode estimular a taquicardia (aumento do batimento cardíaco), que vem a favorecer o risco de infarto ou arritmia no coração. Tais efeitos são também responsáveis pela cafeína em excesso, que pode trazer insônia e super-excitação.

Alertas como estes parecem não surtirem efeito para Cláudio Zimichut, que trabalha na área de patrimônio do Instituto Oceanográfico. Também fumante, ele bebe mais ou menos um litro de café por dia há 17 anos, mas ainda assim não se considera “viciado”. “Quando fui motorista, não tinha como tomar, mas eu não sentia falta”, diz. Mesmo sempre fumando quando bebe café, Zimichut acertou: não há relação entre os dois hábitos. “Sou tão viciado no cigarro que até bebendo água, eu fumo”, confessa.

Problemas à parte, muito ainda precisa ser estudado por especialistas brasileiros e, ao que tudo indica, 2005 será um bom ano para que esses resultados comecem a aparecer.

 

CURIOSIDADES


O café é a planta mais consumida no mundo,
e o Brasil é o maior produtor de café:
nossos grãos representam um
saldo positivo de R$ 2 bilhões para
a balança comercial.
Em segundo lugar está a Colômbia

O café coado é o mais
consumido no Brasil (93%),
seguido do instantâneo (15%),
do capucino (11%) e do expresso (8%)

Metade dos não-consumidores
de café no País é jovem e tem
idade entre 15 e 26 anos.
Eles substituem o café
por sucos ou leite

A população da Finlândia lidera
o ranking das maiores
consumidoras, com
consumo médio de 12,4 kg/hab/ano,
seguida pela Suécia com 11,4 kg/hab/ano,
Noruega com 11,3 kg/hab/ano
e a Dinamarca com 10,5 kg/hab/ano.

A descoberta do café,
por volta do ano 500,
é atribuída a um pastor de cabras
muçulmano chamado Kaldi,
ao perceber que seu rebanho
permanecia acordado e estimulado.
Maomé é conhecido como um dos
mais ilustres apreciadores da bebida

A cafeína só foi identificada
em 1820, pelo químico
alemão Ferdinand Rouge

   


 
O Espaço Aberto é uma publicação mensal da Universidade de São Paulo produzida pela CCS - Coordenadoria de Comunicação Social.
Todos os direitos reservados® e.mail: espaber@edu.usp.br