ISSN 2359-5191

15/06/2011 - Ano: 44 - Edição Nº: 48 - Meio Ambiente - Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade
Estudo mostra as prováveis consequências das mudanças climáticas no Brasil

São Paulo (AUN - USP) - O estudo “Economia da Mudança do Clima no Brasil: custos e oportunidades” pretende traçar um panorama do futuro do país unindo aspectos climáticos, econômicos e sociais. As conclusões são fruto de um trabalho realizado por 11 instituições brasileiras, entre elas a USP, a Unicamp, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e a Fiocruz, sob a coordenação do professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP (FEA), Jacques Marcovitch.

As raízes dos motivos que geraram esse esforço conjunto estão na Convenção do Clima Rio-92, que completa 20 anos no ano que vem. É por causa dessa reunião que se começa a se estruturar no Brasil um movimento de reflexão sobre os grandes temas ambientais. “Isso ocorre primeiro no campo das ciências ambientais. Depois, percebe-se que é preciso se aproximar da economia porque era preciso traduzir em números o que os cientistas estavam observando”, explica Marcovitch.

Atualmente, a questão da mudança climática, bem como a sustentabilidade, proteção ambiental, redução do consumo, redução da emissão de gases poluentes e os recursos naturais já são temas estabelecidos na agenda dos países, independente do grau de desenvolvimento.

Em relação a isso, a ONU estabelece o princípio da responsabilidade comum, porém diferenciada. Os países desenvolvidos são os maiores responsáveis pelas alterações no clima, já que seu desenvolvimento foi baseado na emissão de gases efeito estufa (GEE). No entanto, os países subdesenvolvidos serão os mais afetados porque são mais vulneráveis. Além disso, esses países reivindicam o direito de também se desenvolver com gases GEE. Países emergentes como China, Brasil e Índia já têm um número maior de emissões brutas do que países desenvolvidos. Sendo assim, a responsabilidade e a preocupação passam a ser de todos.

Nesse sentido, o estudo pretende quantificar o impacto da mudança do clima na agenda de desenvolvimento do Brasil para embasar os tomadores de decisão no que diz respeito às políticas públicas e corporativas. “O estudo fornece subsídios para uma estratégia nacional de transição para uma economia de baixa emissão de carbono. O desafio brasileiro é desacoplar crescimento econômico e emissão de gases GEE”, diz Marcovitch.

Com base nos possíveis futuros cenários climáticos projetados para o mundo pelo Painel Intergovernamental de Mudança do Clima (IPCC) em 2007, o estudo apresenta dois cenários para o Brasil. Há o A2-BR, o cenário mais pessimista e o B2-BR, um pouco mais otimista, ambos têm o ano de 2050 como horizonte das simulações.

Marcovitch explica que o A2-BR não é “pessimista” porque tem um olhar pessimista sobre o mundo, mas que existem vários futuros possíveis para o Brasil. “O que foi chamado de pessimista foi a somatória de vários fatores que tornariam a situação mais difícil e o otimista assume a ocorrência de fatores que tornariam o a situação melhor. De alguma forma, o futuro do Brasil está entre o cenário A2-BR e B2-BR”.

Em relação ao PIB brasileiro, por exemplo, estima-se que será de R$ 15,3 trilhões no cenário A2-BR e de R$ 16 trilhões no cenário B2-BR. Com o impacto da mudança climática, o PIB sofrerá redução de 0,5% e de 2,3%, respectivamente.

O futuro do clima no Brasil
Para o ano de 2100, é previsto o aumento da temperatura e das ondas de calor em todas as regiões do país. Na região Norte, a temperatura aumentará de 4º a 6ºC. Também haverá redução de até 1,5 mm de chuvas por dia, a não ser na Amazônia do Oeste, onde pode ocorrer o aumento extremo de chuvas.

A outra região brasileira que será mais afetada pela mudança climática é a região Nordeste. Lá, haverá reduções de até 2,5 mm de chuva por dia no semi-árido durante as estações chuvosas, o que causará perdas agrícolas em todos os estados. Além disso, a falta de chuvas afeta a vazão dos rios em até 90% (nas bacias do Parnaíba e do Atlântico leste) e diminui de 29,3 a 31,5% a produção de energia hidrelétrica.

“Como o Norte e o Nordeste são regiões mais pobres, serão mais afetadas também do ponto de vista de queda da produtividade agrícola. E, como lá a população depende da agricultura de subsistência, o relatório afirma que a produtividade agrícola cairá principalmente nas culturas de subsistência do país”, explica Marcovitch.

Ainda em relação à agricultura, a área para o plantio da soja cairá de 30% a 34% e para o café cairá de 17% a 18%.

No Sudeste, haverá mais chuvas intensas e redução das geadas em São Paulo. Da mesma forma haverá menos geadas no Mato Grosso do Sul e no Rio Grande do Sul, onde se verificará também aumento de chuvas intensas.

Na Amazônia, o desmatamento, combinado com a mudança climática, fará com que haja 38% menos espécies na floresta em 2100. O aquecimento pode chegar a até 8ºC, o que indica o processo de savanização (desaparecimento da floresta por conta da sua transformação no bioma da savana) da região, com perda de até 40% de cobertura vegetal. “A savanização acabará com a floresta que é uma das fontes das nossas chuvas que circulam pelo país. Além disso, o pulmão de oxigenação do planeta também será afetado”, diz Marcovitch.

A mudança no clima provoca ainda impactos sociais como a ocorrência de doenças comuns em áreas mais quentes por causa da elevação da temperatura. Além disso, o professor afirma que os problemas na agricultura de subsistência criarão um fluxo migratório das pessoas da região Norte e Nordeste para as zonas costeiras do país.

Adaptar e Mitigar
As medidas necessárias para reduzir drasticamente as alterações climáticas envolvem todos os países e se referem, sobretudo, à redução da emissão de gases GEE. Não importa qual país reduza sua emissão, pois os benefícios serão compartilhados pelo mundo todo. Segundo o estudo, “a estratégia básica de mitigação é, portanto, a de custo-efetividade: idealmente o mundo todo deve buscar a forma mais barata de reduzir a emissão de qualquer tonelada de GEE, seja em que país for”.

Entretanto, o caráter inevitável das mudanças climáticas obriga cada país a se adaptar individualmente. É nesse ponto que os países mais vulneráveis ficam em desvantagem. É possível traçar uma analogia com as regiões Norte e Nordeste, já que são as regiões brasileiras menos desenvolvidas e menos preparadas para a adaptação e que, portanto, vão sofrer mais com as alterações no clima.

No caso do Brasil, algumas adaptações sugeridas pelo estudo são o investimento de R$ 1 bilhão por ano em pesquisas de modificações genéticas para aumentar a produtividade na agricultura e o investimento de aproximadamente US$ 50 bilhões em geração de energia por gás natural, bagaço de cana e energia eólica para compensar a perda do potencial hidrelétrico.

O Brasil é considerado uma potência ambiental porque, mais que adaptar-se, o país tem um grande potencial de adaptação por causa da Amazônia. O desmatamento é responsável por 60% das emissões de carbono do país. Se nossas emissões fossem taxadas em US$ 50 a cada tonelada de carbono, seria possível reduzir o desmatamento em 95%. Essa medida, ao mesmo tempo em que diminui as emissões brasileiras, protege a floresta que é a grande sequestradora de gases GEE do mundo.

O princípio da taxação do carbono funciona como uma espécie de multa para as emissões de carbono como o objetivo de inibi-las. “As pessoas que são contra esse procedimento alegam que o governo recolhe as taxas, mas esse dinheiro não é investido em limpeza do meio ambiente. Na prática, a taxação funciona como uma autorização para poluir”, diz Marcovitch.

A solução no caso é o mercado de carbono, no qual os países e empresas que poluem menos negociam suas cotas para os mais poluentes. O professor explica que “isso cria um sistema de punição e prêmio que altera o comportamento das emissões de maneira mais eficiente do que a simples taxação pelo Estado”.

Outra área que o Brasil, em especial, pode explorar são os biocombustíveis. “O Brasil tem uma eficiência nessa área que é histórica. O ciclo do açúcar deu ao Brasil uma competência na área da cana, de modo que hoje não temos mais uma cana de açúcar, mas uma cana de energia”, diz Marcovitch.

Agir
O estudo propõe ainda algumas prioridades de ação como iniciativas sociais no Norte e Nordeste, a integração de políticas públicas ambientais e de transporte, habitação, indústria, agricultura, o estanque do desmatamento na Amazônia, investir mais em pesquisa agrícola e conhecimento técnico e manter a matriz energética limpa.

A inação, por outro lado, acarreta perdas econômicas. Voltando ao exemplo da soja, a perda de produtividade, no pior cenário possível (A2-BR), acarretaria o prejuízo de R$ 6.308 milhões por ano. O governo brasileiro tem, sem dúvida, parte de responsabilidade por tais ações. Marcovitch diz que as políticas públicas avançam e recuam, citando o Código Florestal como um recuo “já que as pessoas derrubarão florestas e comprarão terras sabendo que terão respaldo na lei”.

“Há um preocupante descolamento dos interesses internos representados no Congresso Nacional com uma leitura internacional. O fato de o Brasil não assumir sua responsabilidade na área ambiental terá um preço. O Brasil não deve sacrificar seu desenvolvimento, mas também não podemos estar de acordo com um Brasil que destrói o seu futuro e o futuro do planeta”, diz o professor.

Marcovitch destaca também o papel dos jovens nesse processo. Além do potencial de recursos naturais, o Brasil é um país que traz esperança de mudança porque tem uma população jovem.

Para o professor, a formação de recursos humanos especializados é um fator determinante para a transição do Brasil a uma economia de baixa emissão de carbono. “As profissões verdes, tais como as que lidem com aproveitamento de dejetos da cadeia produtiva, serão cada vez mais importantes. No campo da engenharia, o engenheiro não será mais um mero construtor, mas, sim, um engenheiro verde que concebe a longo prazo, ou seja, pensa em como construir algo em harmonia com a natureza e com a dimensão humana”.

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