ISSN 2359-5191

18/11/2014 - Ano: 47 - Edição Nº: 85 - Educação - Instituto de Psicologia
Aliada à educação, psicanálise potencializa influência na sociedade
Método de Freud pode agir muito além do divã, emprestando a escolas alguns de seus conceitos fundamentais
Hans Casparius/Getty Images

Diante das dificuldades enfrentadas por educadores, como a evasão escolar e a hiperatividade, o uso de alguns conceitos psicanalíticos se destaca como uma das melhores respostas possíveis. No entanto, vale ressaltar que, para além da escuta dentro de uma análise pessoal, a prática psicanalítica vem se mostrando peça chave na compreensão e possível solução de problemas que afligem a sociedade como um todo. Em discussão no Instituto de Psicologia (IP/USP), ocorrida no dia 7 de novembro, especialistas de diferentes países apresentaram hipóteses e pesquisas que podem explicar melhor essa ideia.

Através de conceitos introduzidos por Hannah Arendt em A Condição Humana, o professor da Faculdade de Educação da USP (FE/USP) Rinaldo Voltolini compara as noções de sociedade e de pólis. Segundo ele, é a formação do sujeito através da linguagem que nos diferencia de outros animais sociais (sociedade), nos tornando políticos (pólis). A noção de sujeito, segundo Robert Levy, membro da Escola Freudiana de Paris, está ligada intimamente à psicanálise, que procura a cura de neuroses oriundas de, segundo ele, "comunitarismos redutores". A sociedade, para Voltolini, é um ente abstrato, que funciona como uma estatística. A partir disso, o sujeito pode se deixar sumir, o que a psicanálise procura evitar e resolver.

Já Perla Zelmanovich, psicanalista e pesquisadora na área de Educação da Universidade de Buenos Aires (UBA), contextualiza no debate sua teoria através de uma notícia argentina recente, envolvendo questões de gênero e sexualidade. Segundo a pesquisadora, uma escola, diante da pressão social e legal - já que a Argentina já possui legislação nesse sentido -, quando solicitada pelos pais de um aluno por uma autorização para que ele se vestisse com roupas femininas, aceitou. A argentina faz questão de frisar, no entanto, que, na maior parte das vezes, os profissionais formados na área de pedagogia não estão completamente aptos a lidar com esse tipo de situação. Segundo Zelmanovich, a psicanálise ajudaria a equipe da escola a encarar os sintomas individuais não como patologia, e sim como algo que pode vir a gerar novos significados.

A presença de escolas mais liberais implica em uma sociedade com menos neuroses, conforme a noção introduzida por Freud e reforçada no debate por Robert Levy. Outros franceses como Laurence Gavarini, da Univesité Paris 8, e Dominique Ottari, da Université Paris Ouest Nanterre La Défense, comentaram o que vêm observando a respeito. Em escolas nos subúrbios mais pobres de Paris, Gavarini percebeu em suas pesquisas que a dificuldade apresentada por inúmeros jovens em assimilar o conteúdo das aulas tem a ver com a impossibilidade de se fazer ouvir, em família. "Ignorar o que alguém tem a dizer, é algo de destrutivo", diz a professora. Quando a situação que o aluno viveu em casa se repete na escola, com os professores, a tendência é de aumento da evasão escolar - o que geralmente acaba acontecendo. Além disso, segundo a pesquisa da professora Ottari, a dificuldade encontrada por muitos educadores em considerar as diferentes aptidões e habilidades de alunos também pode dificultar o aprendizado e levar não só à evasão, como também a casos desnecessários de repasse de crianças à escolaridade "especial". É o que acontece com crianças "superdotadas", por exemplo. Através do estudo de habilidades infantis incomuns registradas em narrativas através da história, Ottari procura comprovar que os pequenos, muitas vezes com conhecimentos e aptidões fora das expectativas do adulto, acabam por não conseguir se fazer ouvir e não atingir o aprendizado proposto pela escola. Os pesquisadores franceses concordam que, com a introdução de conceitos psicanalíticos em cursos de pedagogia, muitos desses problemas poderiam ser solucionados, através do desenvolvimento de um olhar mais sensível a essas aptidões por parte do professor.

Os pesquisadores debateram diversos temas envolvendo psicanálise e educação no X Colóquio internacional do LEPSI (Laboratório de Estudos e Pesquisas Psicanalíticas e Educacionais sobre a Infância), "Crianças Públicas, Adultos Privados", que aconteceu no Instituto de Psicologia e na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.

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