ISSN 2359-5191

11/05/2015 - Ano: 48 - Edição Nº: 33 - Arte e Cultura - Instituto de Estudos Brasileiros
Pesquisadores resgatam arquivo inédito com voz de Mário de Andrade
Ouça o áudio em que o escritor canta com Rachel de Queiroz, em gravação encontrada nos Estados Unidos
Fotografias feitas por Mário de Andrade, em 1928: "Catolé do Rocha" (esq.) e " Catolé do Rocha / Paraíba / Convento" (dir.). (Legendas do autor). (Montagem Dif. Cultural, IEB/USP) (Arquivo IEB/USP) (crédito: Difusão Cultural - IEB/USP)

Registros fonográficos em que Mário de Andrade, Rachel de Queiroz e Mary Pedrosa, então companheira do crítico Mário Pedrosa, cantam seis canções para o linguista norte-americano Lorenzo Turner, feitos em 1940, no Rio de Janeiro, foram recuperados numa ação conjunta entre pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e da Universidade de Indiana (EUA).

O professor Xavier Vatin, da UFRB, ao realizar pesquisas de pós-doutorado na Universidade de Indiana, entre 2012 e 2013, aprofundou-se no tema das heranças culturais africanas que o linguista Lorenzo Turner havia estudado em outros países. Vatin localizou o nome de Mário de Andrade entre as personalidades entrevistadas e gravadas por Turner, em sua passagem pelo Brasil em 1940. O professor Carlos Sandroni, da UFPE, envolvido no processo, diz que“nunca tinha ouvido falar que houvesse algum registro gravado da voz de Mário, e muito menos de seu canto. Amigos seus mencionam aqui e ali sua voz ‘de barítono’.” Até então, eram conhecidos cerca de dois filminhos mudos em que Mário de Andrade aparece, além de inúmeras fotos do escritor. O ano da gravação feita no Rio de Janeiro coincidia com o período em que ele residiu na cidade (entre 1938 e 1941), o que motivou o cruzamento de informações para ter a certeza de que o registro era da voz do escritor modernista.

Por meio da professora Flávia Toni, do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP, onde se encontra o acervo de Mário de Andrade, verificou-se, através da correspondência do autor com Oneyda Alvarenga, que a presença de Mário e Turner no Rio de Janeiro se confirmava. Além disso, a consulta ao catálogo do arquivo da Universidade de Indiana mencionava o registro de homens e mulheres cantando numa gravação para Turner. Os indícios eram tamanhos que valia a pena solicitar os registros norte-americanos para análise.

A universidade estadunidense realizou cópias digitais dos dois lados de um disco de alumínio da coleção de Turner, que foram enviadas ao professor Sandroni por internet. Além da voz, as canções ganham tom especial  pois são cantigas populares que o próprio Mário recolheu ao circular pelo Nordeste. Sandroni comemora: “todos os leitores e admiradores de Mário de Andrade serão eternamente gratos à Universidade de Indiana, por ter preservado estas gravações, possibilitando que as escutássemos 75 anos depois.” Os áudios podem ser ouvidos na página do jornal O Estado de S. Paulo.

A face A do disco de alumínio, com 6 minutos de duração, traz 5 melodias:

- Aribu, melodia que Rachel de Queiroz aprendera com um palhaço, no Ceará;

- Zunzum, com Mário de Andrade e Mary Pedrosa, peça do final do século XVIII, celebração usada nas rodas de bebida que o musicólogo acreditava ser originária de Minas Gerais;

- Tava muito doentim, cantada por Rachel de Queiroz, colhida por Ascenso Ferreira e Mestre Rozendo, em Pernambuco;

- Deus lhe pague a santa esmola, cantiga de mendigos colhida por Mário de Andrade em Catolé do Rocha, no interior da Paraíba e;

- Toca zumba, cantada por Mário de Andrade, é identificada por ele, na face B, como melodia publicada por A. Friedenthal, “uma canção de negros do tempo da Abolição”, de origem ignorada. Confrontado o registro que chegou de Indiana com a obra do musicólogo alemão, percebeu-se o lapso de Mário: a cantiga se chama O Bilontra, e foi composta por Gomes Cardim, de São Paulo, pouco após a Abolição.

Na face B, com 3 minutos de duração, os cantores – Mary Pedrosa, Rachel de Queiroz e Mário de Andrade – explicam o que gravaram numa conversa com Mário Pedrosa e Pedro Nava. O clima é descontraído e Rachel de Queiroz, desinibida, canta uma última melodia, Meu irmão me dê uma esmola. As cantigas populares, agora resgatadas, trazem à tona a faceta de musicólogo de Mário de Andrade, que se dedicou à área sobretudo no início da carreira, consolidando no Brasil os estudos da história da música e do folclore musical, até então inexistentes.



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