ISSN 2359-5191

21/12/2005 - Ano: 38 - Edição Nº: 22 - Ciência e Tecnologia - Instituto de Estudos Avançados
Pesquisadora denuncia prejuízos do desenvolvimento sustentável na Amazônia

São Paulo (AUN - USP) - O ideal de desenvolvimento sustentável foi vendido, em todo o mundo, como solução para os problemas que a vida moderna causava ao meio ambiente. Era preciso manter elevados os níveis de desenvolvimento econômico, mas reduzir os danos ao planeta. Na Amazônia, entretanto, em nome do desenvolvimento sustentável, permitiu-se a invasão de indivíduos e instituições estrangeiras. Mas como possuíam interesses distintos dos locais, muitos valores históricos da região se alteraram. Construiu-se uma Amazônia insustentável, degradada e cada vez menos brasileira.

O artigo “A intervenção do ambientalismo internacional na Amazônia”, da pesquisadora Rosineide Bentes, foi publicado recentemente na edição 54 da revista Estudos Avançados, do Instituto de Estudos Avançados da USP (IEA/USP). Ph.D em História Social pela London School of Economics and Political Sciences e pesquisadora do Museu Emilio Goeldi (Belém-PA), Bentes afirma que um dos piores efeitos do desenvolvimento sustentável cultivado na Amazônia é o tratamento dado aos amazônidas, moradores cujas famílias se instalaram na região há décadas. Muitos foram expulsos de suas terras para que se criassem reservas de preservação e pesquisa, e, mais grave ainda, não participam das decisões sobre o futuro da Amazônia, apesar de constituírem o grupo social mais envolvido.

Infestação

Expansão urbana e industrial, explosão demográfica, produção e consumo. Excessos sobre os recursos naturais e poluentes despejados no ar. As nações mais desenvolvidas do planeta começaram a se preocupar – de fato – com a preservação do meio ambiente na década de 70. Até então, desflorestar era um “ato civilizatório”, sintoma de desenvolvimento e industrialização. No entanto, as empresas multinacionais perceberam os riscos que poderiam ser causados com a escassez dos recursos naturais. Apareceram inúmeros movimentos ambientalistas, iniciando um debate global sobre o tema.

O interesse internacional sobre a Amazônia ficou evidente na conferência da ONU em Estocolmo, em 1972. Propuseram a autonomia relativa do Brasil sobre a região, que seria um problema universal. O Brasil se opôs e os países mais ricos prometeram não interferir nas políticas locais.

Este panorama alterou-se com a ascensão dos governos neoliberais na década de 80. As decisões se transferiram da ONU, que passava por uma crise financeira, para o G7, o grupo dos sete países então mais ricos do mundo. Nesse contexto, projetaram-se ONGs conservacionistas norte-americanas financiadas por empresas dos EUA. Mas, de que forma essas ONGs abordariam a emissão de gases poluentes sem prejudicar as empresas que as financiavam, muitas delas responsáveis pela degradação? A solução foi uma inversão de valores: a destruição das florestas tropicais produziria mais poluição do que os efeitos da industrialização e da vida moderna. Essa estratégia também foi adotada em algumas pesquisas da própria ONU. Segundo Bentes, isso serviu para reduzir a responsabilidade dos países do G7 no aquecimento da Terra. “A ênfase nas florestas tropicais transformou os países do cone sul nos grandes vilões ambientais, o Brasil em particular”. Para aquelas ONGs e os governos do G7, o ideal seria a conservação das florestas através de gerenciamento científico. Utilizaram instrumentos multilaterais, como o FMI e o Banco Mundial (controlados pelo G7), para pressionarem o governo brasileiro. E a invasão amazônica, que começara na década de 70 – período em que o Brasil abria suas portas para o capital estrangeiro – acentuou-se ao longo dos anos sob a bandeira do desenvolvimento sustentável.

Auto-infestação

A opção brasileira pelo modelo de desenvolvimento europeu e norte-americano efetivou o desejo de cientistas, ambientalistas e estados estrangeiros, afirma Bentes, que aponta um colonialismo interno que agrava o problema. A maioria dos cientistas brasileiros atuantes na região são das regiões sudeste e sul do país. Além da expulsão de inúmeros amazônidas de terras que pertenciam às famílias há décadas, o resultado dessas ações foi a degradação dos conhecimentos e saberes regionais. “As populações locais concebiam os recursos naturais como capital produtivo, como meio de subsistência e um bem econômico a ser transmitido para os filhos”.

Além disso, como os principais investimentos na região provém de órgãos internacionais, priorizou-se projetos estrangeiros, que apresentam interesses distintos das necessidades locais, disseminando o pensamento externo. Segundo Bentes, “Gerações e gerações de brasileiros saíram da escola sem um conhecimento sólido sobre a história da Amazônia, despreparadas para valorizar e entender suas especificidades”.

A pesquisadora afirma que as ações na região amazônica precisam ser reestruturadas. Por exemplo, o que deve se tornar prioridade não é a conservação científica, mas a ocupação e a preservação dos habitantes locais. “A intervenção internacional pode enfraquecer a tradição ecológica da Amazônia e contribuir para a destruição da floresta, em vez de preservá-la”.

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