Este artigo tem por objetivo analisar as imagens do povo presentes na obra Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa. Para tanto, propõe-se fazer uma crítica das noções de comunidade e povo, configuradas pelo projeto de nação moderno da década de 1950. A crítica visa repensar o sentido totalizante dessas duas concepções. A leitura de Grande sertão: veredas pretende identificar na obra conceitos de povo e comunidade que escapam às reconfigurações modernas de nação. Nesse sentido, a partir das obras de Roberto Esposito, Didi-Huberman e Giorgio Agamben, analisa-se a população sertaneja não como uma união coesa, mas como uma multiplicidade de singularidades que habitam e convivem numa dimensão comunitária da vida. O domínio do comum é entendido como uma modalidade de ser-com, em que o convívio com o outro não é um reforço da identidade, mas sim uma expropriação de si, das fronteiras da subjetividade. Ao analisar os diversos povos do sertão, inclusive aqueles que foram mortos e cujos sofrimentos são testemunhados por Riobaldo, busca-se pensar num conceito de justiça relacionado com a memória que dá visibilidade a essas populações esquecidas do sertão.
O conto Famigerado, de João Guimarães Rosa, lido a partir da
teoria sociológica de Pierre Bourdieu, nos auxilia a demonstrar que a
linguagem é um instrumento de dominação e violência. Criticamos a leitura
do conto que defende a ideia de que o analfabetismo possa ser equivalente
ao encontro mais primitivo com a palavra. Insistimos na tese de que o poder
simbólico perpassa as relações de poder, constituindo-as e mantendo-as.
Concluímos sustentando a hipótese de que o conto pode ser lido como uma
alegoria do encontro entre a força física do jagunço e o poder simbólico
encarnado pelo médico, narrador do conto. Tal encontro explicita a
invisibilidade da violência simbólica, tornada visível, no entanto, através
literatura.
A partir da constatação do valor polissêmico do signo verbal, Guimarães Rosa, no conto “Famigerado” do livro Primeiras estórias, traz à baila a reflexão sobre o poder do discurso letrado e o eterno desejo do homem de tomar posse do conhecimento. Com base nesse conto, este trabalho pretende meditar sobre a faculdade do discurso de malear a palavra, dobrando-a de acordo com conveniências preestabelecidas. Dessa forma, o domínio da palavra será examinado como estratagema simbólico para imposição de uma concepção de mundo mais em consonância com interesses de grupos ou classes que exercem as prerrogativas de senhores do saber.
O ato da fala pode ser considerado como um ato de poder ou de libertação, segundo o momento em que acontece. Além da relação entre fala e poder, uma outra relação interessante é a de fala e ritual. Neste trabalho tentamos ver em que medida esse ato de vontade, sobretudo no que diz respeito à fala encantatória, tanto pode liberar seu locutor como pode aprisioná-lo numa teia invisível mas tenaz. Trabalhamos o romance de Guimarães Rosa, tendo como pano de fundo a história do Brasil.
A presente pesquisa propõe uma leitura da novela A hora e a vez de Augusto Matraga de João Guimarães Rosa, publicado em Sagarana em 1946. Adotaremos como procedimento de estudo a análise da relação estabelecida entre o medo e a coragem ao longo da narrativa e as relações sociais representadas por esta série. O objetivo deste artigo é mostrar que o medo move a narrativa ao passo que os personagens, em especial Nhô Augusto, se veem aniquilados por este sentimento, mas ao mesmo tempo é dele que ganham forças para prosseguir. A partir da compreensão dessa concepção, nos empenharemos por desenvolver uma discussão sobre como a categoria do medo pode denotar determinadas relações sociais, não só de modo isolado, mas também vinculado à coragem e ao poder. Para tanto, utilizaremos como suporte teórico História do medo no ocidente de Jean Delumeau (2009) e A criação literária de Massaud Moisés (2012).