“Cara-de-Bonze”, publicado primeiramente como poema em Corpo de Baile e posteriormente como conto na coletânea No Urubuquaquá, No Pinhém, foi na data da publicação e ainda hoje é motivo de discussões de cunho genérico, além de suscitar manifestações interpretativas das mais diversas por conta de sua estrutura narrativa formada por partes líricas, em prosa, notas de rodapé, citações e roteiro cinematográfico. Por meio da análise de seis diferentes leitores, este artigo discute as possibilidades de leitura às quais o texto se abre, e se estas podem ser feitas a guisa de puro entretenimento ou se são possíveis somente por meio da análise de seus elementos narrativos, dada sua estrutura polimórfica. Deste modo, o artigo verifica a dificuldade e até mesmo a impossibilidade da leitura gastronômica[1] do conto, e a amálgama de interpretações possíveis, conforme o experimentalismo no uso da multiformidade de discursos.
Esta é uma reflexão sobre como Graciliano Ramos lê as obras de Rosa e sobre como ambos os autores inspiraram minha própria produção literária: através de uma transposição artística de nossas raízes.
O corpo, em especial, o corpo presente, parece ser um ponto de encontro entre o universo literário, a leitura literária e a dança. Na literatura, são diversas as narrativas em que personagens passam por transformações ao entrarem em contato com o mundo na relação corporal que estabelecem com ele. No conto “As Margens da Alegria”, de João Guimarães Rosa, a ser analisado neste trabalho, o protagonista se vê tocado pelo que presencia. Na leitura literária, por sua vez, o corpo a corpo do leitor com texto permite uma relação sensorial com ele. Para Zumthor (2000), quando é estabelecido um vínculo com o texto, a experiência do ato de ler é presenciada no corpo, é performance; o texto, na leitura, dança no corpo do leitor, quando ele se coloca presente. Na dança (VIANNA, 2005), principalmente naquela em que não se visa exclusivamente uma destreza técnica, o trabalho corporal acontece na escuta do corpo, um corpo que se quer presente.
Este artigo analisa a representação de leitores e da leitura que realizam alguns textos literários de João Guimarães Rosa, vistos do ponto de vista no qual literatura é concebida como textos da cultura que são transferidos em livros como suporte material.
Buriti, de Guimarães Rosa, é um enigma. Conto/novela/poema narrado em flashback, o
texto abre-se a uma pluralidade de leituras. A polifonia e o desvio do uso convencional da
linguagem são estratégias que prendem o leitor, encantado com a originalidade dos
experimentos linguísticos do ficcionista mineiro. Este artigo tem como objetivo apontar
algumas das qualidades do texto rosiano presentes em Buriti, com especial destaque para a
grande riqueza das palavras, a multiplicidade de focos narrativos e o uso do flashback.
Esta pesquisa tem o objetivo de investigar a leitura como tarefa interpretativa e ato performático, à luz das teorias de leitura e leitor de Iser e dos estudos de Zumthor sobre leitor, corpo e voz. A reflexão sobre a categoria narrativa leitor terá por corpus de análise o conto Meu tio o Iauaretê, de Guimarães Rosa. Narrativa que leva a palavra ao limite da não-palavra, por meio de grunhidos, onomatopéias e outros conjuntos sonoros, que são presenças vocais embora não lingüísticas. Tal desarticulação cria uma linguagem-onça, fazendo da narrativa um espaço de metamorfose seja do narrador e do interlocutor, no plano da história, seja do autor e do leitor implícito, no plano do discurso. Abrem-se para o leitor empírico, então, três possibilidades de papéis na sua interação com o texto: a do interlocutor ou ficção do leitor, inscrito na própria história; a do leitor implícito na sua ação de preenchimento dos vazios do texto e a do leitor-performer em ato de imersão multisensorial no corpo a corpo com essa escritura vocalizada
Instituto de Letras, Departamento de Teoria Literária e Literatura, Programa de Pós-Graduação em Literatura
A atividade de ler o mundo é imprescindível para a atuação do ser humano em sociedade. Aplicada a contextos sociais específicos, a leitura da palavra escrita é necessária à ampliação das leituras de mundo. Ler literatura é recurso que contribui para a transformação do sujeito-leitor e de seu mundo. A partir do confronto entre essas premissas e a constatação de que não há recepção da obra de João Guimarães Rosa no Vale do Urucuia, originou-se o problema desta pesquisa: não se lê a obra do Autor, apesar de ele ser vulto importante na região, por ter explorado em sua obra a paisagem e os valores urucuianos e por se constituir um importante ator nas relações sociais do Vale. A partir disso, buscamos demonstrar que ler João Guimarães Rosa, na educação básica, é possível. Embasados na dialogia bakhtiniana, na teoria do efeito estético iseriana e no letramento literário, propusemos um projeto de intervenção, cuja metodologia, centrada na pesquisa-ação, demonstra estratégias de leitura dos textos rosianos para as escolas de educação básica situadas na região. Dessa forma, objetivamos desmistificar a ideia de que os textos do Autor são difíceis e herméticos; evidenciar que os leitores no vale do Urucuia se reconhecem nos textos, identificam a paisagem local explorada nas obras. Visamos também despertar nos leitores o sentimento de pertencimento e a necessidade de assunção cultural por meio da valorização da identidade urucuiana a partir da leitura da obra de JGR. Nesse processo, destacamos o papel fundamental do professor, na posição de mediador de estratégias de leitura, sobretudo quando elas constituem eventos dialógicos que devem ser planejados e flexibilizados considerando o público que lê e o texto a ser lido. A proposta aponta para uma concepção de leitura necessária e uma práxis decisiva para formação de leitores autônomos, que contribuem para o alargamento da visão do urucuiano acerca de si mesmo e acerca da obra de João Guimarães Rosa.
O objetivo da pesquisa Meninos eu li!: leitores de Sagarana escrevem a Guimarães Rosa, cujo corpus são oitenta e cinco cartas sobre a recepção do livro de estreia do escritor, Sagarana, publicado em abril de 1946, e arquivadas no Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo, é discutir a leitura desses primeiros leitores na contra-luz das críticas recebidas pelo livro. Para tanto, procedeu-se aos seguintes passos: 1)- Identificação dos principais tópicos de cada carta. 2)- Identificação dos paradigmas de leitura – autores, obras, elementos de crítica literária – mencionados pelos missivistas. 3)- Discussão das críticas recebidas pelo livro a fim de mensurar seu peso como horizonte da comunidade de leitores constituída pelos missivistas. Num segundo momento recortou-se a correspondência pelo viés identitário distribuindo-a da seguinte maneira: remetentes desconhecidos e remetentes mulheres, com objetivo de identificar semelhanças e diferenças no modo de ler de diferentes leitores. Com pressupostos teóricos da Estética da Recepção, da História da Leitura e do Discurso Epistolar, a pesquisa chegou às seguintes conclusões: 1- a importância da crítica literária como mediadora da leitura; 2- a legitimação da identidade brasileira através da literatura; 3- a forte presença de escritores pré-modernistas como paradigmas de leitura tanto da crítica quanto dos missivistas; 4- o crescimento e amadurecimento do mercado cultural brasileiro; 5- a importância nesse mercado tanto do Estado quanto das práticas informais; 6 - o longo tempo de maturação e concretização de projetos, anunciados nas cartas, de expansão da circulação de Sagarana.