O presente artigo busca analisar os aspectos da infância dos garotos negros Guirigó de Grande sertão: veredas (2017) e Tiãozinho, menino guia, do conto Conversa de bois da obra Sagarana (2017) ambas do autor mineiro João Guimarães Rosa. Busca-se evidenciar como a infância pode se constituir de formas tão distintas considerando aspectos sociais como a composição familiar, racial e o lugar de fala na sociedade. Evidenciando através de uma aproximação entre as personagens apresentar aspectos que unem suas infâncias mesmo sendo garotos de obras distintas a fim de debater como a figura da infância idealizada, cercada de cuidados e prazeres está distante para ambos.
Este trabalho propõe um exame comparativo do tema da infância e dos aspectos formais que ligam as narrativas “A menina de lá”, de Guimarães Rosa e “As flores de Novidade”, de Mia Couto. Para esse fim, o presente estudo traça como seu objetivo a compreensão das crianças e das linguagens poéticas criadas em língua portuguesa de Brasil e Moçambique sendo agentes de beleza e de sonho em períodos conturbados no Ocidente, como os anos da Guerra Fria e dos combates civis pós-libertação. Sendo composto por uma pesquisa bibliográfica, esse trabalho, volta-se para o exame das aproximações estéticas que fazem da literatura produzida pelo autor de Terra sonâmbula (1992), uma continuação das propostas lançadas pelo autor de Sagarana (1946). Frente ao exposto, pretender-se-á identificar os elementos componentes das narrativas e os pontos de convergência na infância, com base nos estudos de Bosi (2003); Rónai (2005), entre outros. Ao delimitar o estudo dessas obras, Rosa e Couto inserem-se no espaço das chamadas shorts estories. Logo, obtêm-se, entre outros resultados, a constatação de que esses grandes observadores-participantes das histórias contemporâneas de seus países estabelecem as personagens infantis como as únicas responsáveis por preencherem com os seus dons, o jardim do mal que configurou-se em grande parte do século XX.
Este trabalho faz uma análise do conto “A partida do audaz navegante”, de Guimarães Rosa, tendo como fio condutor o universo mágico da infância. O objetivo é refletir sobre a construção do pensamento mágico-poético no discurso do narrador e das personagens crianças; apreender a construção e a desconstrução do universo poético-maravilhoso nessas narrativas rosianas, assim como analisar o vínculo entre a enunciação do narrador e a das personagens infantis, ressaltando o encantamento e o desencantamento. A fundamentação teórica baseia-se em concepções de Roland Barthes sobre a leitura e a escritura. O estudo evidenciou que, em um contexto em que a criança raramente tem sua voz própria, Rosa dilui seu discurso e o seu olhar poético ao do narrador e das personagens, tornando-o quase indissociável do discurso infantil, está intimamente relacionado com experiências mágicas, construídas, por sua vez, em universo poético-maravilhoso.
O ensaio propõe um exercício de leitura da estória “Terceira margem do rio”, de Guimarães Rosa: partindo de uma análise do título, deduz cinco lições, tanto sobre o texto de Rosa como sobre a própria ideia de leitura.
No presente artigo pretendemos analisar dois contos do sistema literário das literaturas de língua portuguesa, Conversa de Bois de Guimarães Rosa e Estória da Galinha e do ovo de José Luandino Vieira, com o objetivo de apontar a violência e a busca pela liberdade vivenciada pelas crianças nas duas narrativas. A nossa análise sustenta-se no aporte teórico de SCHØLLHAMMER (2013) acerca da violência, em LORENZ (2002) e BOSI (2002) sobre a resistência. Verificamos que os dois autores tem semelhança no trato dado a resistência tanto pelo tema quanto pela escrita e no fato de que as crianças resolvem os conflitos de duas formas: Tiãozinho com o auxílio dos bois em Guimarães Rosa e Beto e Xico com o respeito a tradição sem auxílio de ninguém.
ste artigo propõe uma análise da representação da infância em Campo Geral, de Guimarães Rosa, levando em consideração a abordagem sócio-histórica explorada pelo narrador. Neste sentido, apresenta-se uma infância na qual se mesclam elementos antigo-medievais e modernos em constante ciclo de tensão, conforme Jaques Le Goff. Ao analisar o conceito de infância com essa perspectiva, sem refutar os elementos míticos e místicos, consideramos que os componentes contraditórios da narrativa não são solucionados, mas potencializados por meio de ritos de passagem experimentados pelo protagonista Miguilim: os medos, os conflitos, as perdas e as separações que fazem parte dessa concepção antropológica da infância na narrativa rosiana.
Este artigo procura refletir acerca de uma noção de indeterminação que se dá na materialidade da linguagem atuante na novela “Campo Geral” (1956), de Guimarães Rosa. Os silêncios e as dificuldades de pensar e de dizer presentes na narrativa sugerem uma atenção às experiências vividas, de modo que aberturas possam surgir de formas de vida aparentemente estáveis. A partir do olhar do menino Miguilim, busca-se observar como a escrita de Rosa cria experiências de passagem, fazendo transbordar uma linguagem que não se insere na lógica racional e utilitária. O trabalho analisa a estranheza da sintaxe do texto como tentativa de materializar a perplexidade e a inquietude que tornariam viva a língua escrita. No ato de fabulação de Rosa e do personagem Miguilim, nota-se que a linguagem pode acessar outros mundos. Assim, pensar, lembrar e inventar são meios de expor enigmas. Ao dar concretude ao que não pode ser explicado, são produzidas novas formas de vida, mais dispostas à vulnerabilidade; formas de vida que buscam conviver com as incertezas das experiências sensíveis.
Em relatos pessoais de João Guimarães Rosa, a autora colhe dados sobre episódios da infância e aspectos da paisagem da terra natal do escritor. Correlaciona-os com a criação ficcional, notadamente em Sagarana, segundo conceitos relativos ao fato de que as lembranças também se inventam, pois a fantasia se associa às recordações de infância na memória do adulto.
Este artigo propõe-se a refletir sobre a literatura de Guimarães Rosa dentro de duas publicações que se baseiam em sua biografia e obra: João: o menino rosa, de Lúcia Fidalgo (2011), e João, Joãozinho, Joãozito: o menino encantado, de Cláudio Fragata (2016). Esta última é uma obra literária juvenil que tem como enredo a biografia de Guimarães Rosa narrada de forma a entrelaçar sua própria vida com sua literatura. A primeira é uma biografia para crianças que também se aproxima da obra roseana. Nos dois casos, há uma intertextualidade evidente com a obra de Guimarães Rosa, a qual estará ligada, no caso de Fidalgo (2011), ao o conto A terceira margem do rio, da obra Primeiras Estórias, ao passo que em Fragata (2016), a relação ocorrerá com a novela Campo Geral, da obra Manuelzão e Miguilim. A intertextualidade será concebida a partir dos estudos de Jenny (1979) e Reis (1981). O objetivo, por fim, é verificar como os autores concebem o seu processo de criação, tendo em vista a utilização da obra roseana, num percurso que nomeamos, neste trabalho, de “literatura dentro da escrita”, uma liberdade que tomamos para caracterizar a intertextualidade.
Todos sabemos, por observação ou por própria experiência, que é um mito considerar a infância como um tempo de plena harmonia, como se a felicidade fosse condição obrigatória no cotidiano dos pequenos; todos sabemos quão intensa pode ser a dor no horizonte restrito da dependência. Neste artigo, pretende-se traçar um paralelo entre o modo como duas crianças, diferentes, mas em certo sentido bem próximas, uma menina e um menino, vivenciam e enfrentam a experiência da morte. A análise focará o comportamento dos narradores em "Manuela em dia de chuva", de Autran Dourado, e "Campo geral", de Guimarães Rosa, em especial no momento em que se apresenta o confronto com a perda irreparável do irmão, que protegia e orientava. Experiência da dor, fonte de aprendizado, passagem da infância à maturidade.Tristeza e alento, formas de narrar a solidão e o desamparo, mas também de celebrar, no Mutum ou na casa da família, a força da vida, que continua.
O presente trabalho busca estabelecer aproximações entre as obras do brasileiro Guimarães Rosa e do português Miguel Torga, ambos do século XX. A partir de estudos críticos, como as análises de Walnice Nogueira Galvão, Antonio Candido, Benedito Nunes, Massaud Moisés, Cid Seixas, entre outros, apresentam-se as noções de regionalismo e universalismo que perpassam as obras de ambos os ficcionistas. Através de uma análise intertextual dos contos "A menina de lá" e "O cavaquinho", analisar-se-ão como as personagens-crianças fazem parte de universos distintos de infância. Pretende-se, assim, estabelecer um cotejo entre os contos em questão, apresentando semelhanças e distinções neles presentes, no que tange aos temas e aos procedimentos utilizados.
Em “Campo Geral”, Guimarães Rosa amplia o sentido da enunciação ao construir um narrador em 3ª pessoa que faz a dupla mediação do seu ponto de vista pelos olhos infantis e encantados do menino Miguilim. Dessa forma, “Campo Geral” passa de uma narrativa adulta acerca da aprendizagem infantil da alegria para a narrativa encantada da criança a respeito da desconstrução da tristeza do
mundo oficial adulto e da apreensão do sentido ambivalente e regenerador da alegria e do riso infantis. A composição arquitetônica de Rosa é propositalmente desenvolvida de modo polifônico a fim de deixar transparecer a descoberta do mundo pelos olhos infantis, o que torna possível reconhecer o ponto de vista infantil e a sua opinião acerca da alegria como um processo de regeneração e o
riso como um rebaixamento que implicará a reconstrução da vida.
O diálogo entre o tempo e o ser se dá originalmente nas estórias rosianas com as personagens infantis e anciãs. Tanto a criança quanto o idoso torna-se singular na narrativa. O tempo cronológico não cerceia a personagem rosiana, pois, a limitação da existência não decorre através de faixa etária, de mesmo modo, não há predileção por uma fase da vida nas estórias rosianas, não há infantilização da criança. No conto "As margens da alegria, a infância é apresentada como tempo de descobertas e aprendizagem. O "Menino" que parte de casa para a visita à cidade grande, com os tios, deixando um mundo vivido e sua mãe, para um mundo a ser descoberto.
O presente artigo analisa o conto "A menina de lá", do livro Primeiras Estórias, de João Guimarães Rosa, no rastro da experiência da ordem do aberto, do indefinível e inominável que o locativo "lá" configura na narrativa. O conceito de "desrazão", conforme tomado de Foucault e Blanchot por Peter Pál Pelbart, norteia o percurso de análise, no qual a imagem da criança protagonista, construída no signo da ausência, silêncio e imobilidade, tensiona as ambiguidades de carência e plenitude, loucura e santidade, normalidade e anormalidade, silêncio e Verbo Criador, desdobrando a imagem de infans em sua anterioridade em relação à fala/simbolização, à aculturação, ao utilitarismo, em um "lugar de existência" cujas dimensões podem ser psíquicas ou metafísicas. Na trama do enredo e construção da personagem se deslinda uma rede de sentidos e imagens que obrigam o leitor a habitar, também, o vazio, o aberto, a anterioridade... o lá.
Neste artigo propomos abordar o papel de João Guimarães Rosa na literatura de seu tempo,
examinando a obra Primeiras estórias (1962) e problematizando sua relação com a História a
partir de seu conto inicial e também do final, que são protagonizados por Menino, o qual teria
viajado ao local onde se edificava a grande cidade, remetendo à construção de Brasília e ao
processo histórico de urbanização do Brasil, que ali é visto a partir do olhar de uma criança.
Nossa análise centra-se na questão da ficção como mediadora engendradora dos discursos da
Literatura e da História, que é ideia defendida por teóricos como Luiz Costa Lima e Carlo
Ginzburg. Nossos resultados sublinham que a perspectiva literária rosiana, ao abordar a História,
não reproduz o discurso da historiografia, mas aposta em uma criativa reapresentação.
Nos contos de Primeiras estórias, de Guimarães Rosa, transita-se por vários aspectos e temas que caracterizaram a obra do autor, dentre eles o tema da infância. Em “A partida do audaz navegante”, o olhar infantil é responsável por revelações de ordem pessoal, sentimental, existencial. O presente texto visa a analisar o conto a partir de observações feitas durante nosso convívio com o texto. Não selecionaremos um único aspecto, mas, a partir de interpretações várias, tentaremos associá-las entre si, em busca de alguma unidade. Para atingir essa finalidade, dividimos o estudo em duas partes: a primeira encerra aspectos genéricos que se podem depreender não só do conto em questão, como também de outros contos de Primeiras estórias; a segunda objetiva rastrear o texto,
esmiuçando-o em seus detalhes. A análise em questão é resultado do olhar de leitora apaixonada que, a cada nova leitura, redescobre o prazer de ver pelo olhar da infância.
Em Campo Geral, primeira novela de Corpo de Baile (1956), Guimarães Rosa, há uma tensão entre ficção moderna e recuperação da narrativa arcaica, bem como entre ingenuidade e maturidade. Na personagem de Miguilim, encontramos uma representação moderna que traz subjetivação complexa e o ponto de vista de uma criança, através dos quais se apresenta uma matéria arcaica, a vida de um menino em uma fazenda remota do sertão mineiro. Na narrativa de iniciação, as etapas (doença, sofrimento, perda...) tendem a ser subsumidas como partes da trajetória. Há uma cena de violência extrema, no entanto, quando o pai agride o filho, que se singulariza como cicatriz não superável para se tornar etapa necessária na formação.
O presente estudo apresenta algumas reflexões acerca do pensamento infantil e seus aspectos poéticos. Para tanto, inspiramo-nos em um conto de João Guimarães Rosa, extraído do livro Primeiras estórias, intitulado “A partida do audaz navegante”. A protagonista do conto é uma criança cujo olhar poético é traduzido em um discurso também poético e polifônico, rico em desvios sintáticos e em criações vocabulares insólitas e instigantes. O conto enfocado revela a presença de um olhar lírico e filosófico sobre as situações cotidianas, que rompem com os paradigmas tradicionais e trazem à tona o imprevisível. A protagonista da história em questão apreende e compreende a realidade pelo viés poético, criando, deste modo, revoluções discursivas poéticas para as situações cotidianas. E é justamente este olhar que a faz ver novas possibilidades onde ninguém consegue ver. Esta forma singular e imprevisível de produzir os discursos por parte da criança na obra de Guimarães Rosa é similar aos gestos discursivos da criança de um modo geral, que, no presente estudo, relacionamos aos do poeta. As surpreendentes desacomodações sintático-gramaticais presentes nas falas da protagonista, longe de serem encaradas como erros gramaticais, fazem-nos refletir sobre o vigor do discurso infantil e as suas idiossincrasias, reflexos de um universo lírico e criativo. O pensamento mágico da criança e sua perplexidade diante do universo que a cerca se expressam por meio de um discurso também mágico e insólito, como o dos poetas. Deste modo, por meio de um diálogo com o filósofo Bachelard, em sua Poética do devaneio, propomos, neste estudo, uma apreciação do discurso infantil no que ele possui de mágico e original, fruto de devaneios criativos, desamarrados dos condicionamentos da linguagem mecânica e instrumentalizada.
O presente estudo apresenta algumas reflexões acerca do discurso infantil e seus aspectos poéticos. Para tanto, inspiramo-nos em um conto de João Guimarães Rosa, extraído do livro Primeiras estórias , intitulado "A partida do audaz navegante". A protagonista possui um olhar poético traduzido em um discurso polifônico, rico em desvios sintáticos e em criações vocabulares insólitas. O conto enfocado revela a presença de um pensamento infantil lírico e filosófico sobre as situações cotidianas, rompendo com os paradigmas tradicionais e previsíveis. É justamente este pensamento que leva a protagonista para regiões onde ninguém consegue chegar. A forma de produção do discurso por parte da criança na obra de Guimarães Rosa será comparada, neste estudo, aos modos poéticos de pensar. As surpreendentes desacomodações sintático-gramaticais presentes nas falas da protagonista revelam o vigor do pensamento infantil. A perplexidade da criança diante do universo que a cerca se expressa por meio de um discurso também mágico e insólito, como o dos poetas. Deste modo, por meio de um diálogo com o filósofo Bachelard, em sua Poética do devaneio , propomos, neste estudo, uma apreciação do pensamento infantil no que ele possui de poético, fruto de devaneios criativos, desamarrados dos condicionamentos da linguagem mecânica e instrumentalizada.
Este trabalho objetiva tratar do tema da infância na obra de Guimarães Rosa, tendo como ponto de partida os contos de abertura e encerramento de Primeiras estórias, publicado em 1962: “Nas margens da alegria” e “Os cimos”. Os contos apresentam uma estrutura semelhante, em que a personagem infantil, identificada como “menino”, viaja de avião para a cidade de Brasília em companhia do tio. Como toda viagem, esta depreende o contato com um mundo novo, em que várias descobertas no âmbito real e no simbólico promovem um processo de amadurecimento psíquico na criança. Essa estrutura básica, na qual o motivo da viagem tem particular importância, pontua a aderência de Rosa a uma tradição literária que remonta ao “romance de formação” alemão. Considerando a remodelação dessa forma literária a partir de seu pressuposto temático-formal fundamental, a viagem e sua potencialidade no desenvolvimento do eu no encontro/contato com o outro, propõe-se uma leitura dos contos, na qual o tema da “viagem de formação” ganha destaque e a figura infantil alcança lugar central na narrativa brasileira moderna.