Representada pela literatura, a Amazônia configura-se enquanto espaço fronteiriço, à margem da história, como se verifica em Inferno verde, de Alberto Rangel. Dessa obra, examina-se “Hospitalidade”, comparado, a seguir, com “Meu tio o Iauaretê”, de Guimarães Rosa. Embora, relativamente ao estilo e a estrutura, os dois contos sejam diferentes, expõem, ambos, um lugar noturno e selvático, com um homem extraviado no mato e com um assassino que lhe dá abrigo. Deste modo, Rangel e Rosa interrogam a hospitalidade num espaço banido e selvagem e propõem uma questão radical sobre o limite entre aquilo que é dentro ou fora da Lei. Questionam o limiar primordial separando e conjungindo, ao mesmo tempo, o humano e o animal.
Em "Meu tio o Iauretê" de João Guimarães Rosa temos a vercom a confissão, por parte de um mameluco, da sua metamorfose dehomem em onça. No fim da sua fala ele é morto pelo seu interlocutormudo. A partir deste conto “impossível”, vai ser investigada a relaçãoentre a morte e a linguagem. No texto rosiano, de fato, não descobrimosapenas o parentesco essencial entre a phoné e o lógos que nela se dobra,mas nos aproximamos, sobretudo, do limiar último em que a voz seconfunde com o silêncio, em que o humano reencontra a sua essênciadesumana. Temos a ver, nesse sentido, com aquele que Giorgio Agambendefine como a "testemunha integral", ou seja, com quem se coloca nolimite insituável entre a vontade de dizer e a sua impossibilidade.
Este artigo analisa a relação homem-animal no conto “meu tio o Iauaretê”, de Guimarães Rosa. Entende-se aqui que a metamorfose física, que ocorre ao final da história, é parte de uma transformação maior e mais completa, que antecede a primeira e se torna visível nos hábitos, na linguagem, nos sentimentos e nos gostos do onceiro-narrador. O artigo concluiu que a metamorfose, no conto rosiano, não ocorre em um movimento brusco e inesperado, mas em um longo processo de mudança de identidade, no qual a cultura e a humanidade são rejeitadas em favor da natureza ancestral.
O artigo toma por objeto a articulação voz e linguagem na obra Ó (2008), de Nuno Ramos, atentando à correlação desta bipartição à polaridade cultura e natureza, conforme consta na Política, de Aristóteles. Infere-se que Ramos elabora uma descida da linguagem à voz, procedimento que pode ser entendido como a inversão do esquema traçado por Padre Antônio Vieira no sermão “Nossa senhora do ó” (1640), no qual a voz é submetida à linguagem, o corpo ao espírito. Doravante, elegeremos o conto “Meu tio o Iauaretê”, de João Guimarães Rosa, como um possível precursor da expressão “ó” por fazer o ruído animal atravessar a comunicação, embora nossa conclusão seja a de que Nuno Ramos propõe uma decida de mão única do espírito à animalidade, do lógos à phoné, o que nos permitiria vincular sua humanista teoria da separação entre cultura e natureza àquela proposta pelo filósofo Giorgio Agamben; enquanto em Rosa haveria um procedimento perspectivista, como o teorizado pelo antropólogo Eduardo Viveiros de Castro, segundo o qual a natureza seria capaz também de possuir linguagem, saber.
Este trabalho intenta refletir sobre a relação entre corpo e linguagem, a partir dos modos como ela é encenada em Nove noites, de Bernardo Carvalho, e “Meu tio o iauaretê, de Guimarães Rosa. No romance de Carvalho, narradores, agenciados pelo narrador-romancista, tentam esclarecer, a partir de múltiplos relatos, o suicídio de Buell Quain, que mutilou o próprio corpo, aniquilando-se, como resposta a um conflito entre seus desejos e o processo civilizatório que incide na existência de cada sujeito e a constitui. No conto de Rosa, por sua vez, o leitor depara com um narrador-escritor que, encenando o discurso oscilante do onceiro-jaguar, relata como o matou para salvar-se de ser devorado. Trata-se, portanto, de uma narrativa sobre a aniquilação de um corpo que, como último recurso à sobrevivência, volta-se à natureza animalesca, diante da incidência da linguagem impossível de realizar-se satisfatoriamente na língua (dominadora) do outro. Como recursos a essa reflexão, são agenciadas a concepção de linguagem de Benveniste (1989a, 1989b, 1976a, 1976b), a noção de ficção de Iser (2002) e a leitura do conto de Rosa feita por Wey (2005).
Programa de Estudos Pós-Graduados em Língua Portuguesa
A oralidade reinou absoluta desde os primórdios da civilização, até que, com o desenvolvimento das culturas, o surgimento da escrita revolucionou a forma como o conhecimento passou a ser registrado e preservado. Na busca de melhor compreender a aparente dicotomia entre a modalidade oral e a escrita, este trabalho discute as peculariedades linguísticas orais presentes na linguagem espontânea sertaneja. Assim, decidiu-se utilizar como corpus de análise desta dissertação o conto Meu tio o Iauaretê, do mineiro João Guimarães Rosa (JGR), cujo protagonista Tonho Tigreiro supostamente se metamorfoseia em onça mesclando vingança, ódio e arrependimento, valendo-se de uma oralidade que mistura fenômenos linguageiros caracterizados por neologismos e onomatopeias. A partir da revisão da produção de estudiosos do tema como Preti, Bakhtin, Marcuschi, Ullmann entre outros, o objetivo do estudo pôde ser sintetizado na seguinte indagação: Quais marcas de oralidade presentes no texto analisado caracterizam a fala cotidiana e corriqueira do sertanejo e quais são as peculiaridades linguageiras mais frequentes? Entre os achados, verifica-se que JGR exalta a diversidade cultural e combate, mediante o tratamento linguístico utilizado no texto, possíveis preconceitos à fala corriqueira tão frequente nos usos livres da oralidade e da escrita na prática cotidiana da língua, o que faz rever posicionamentos acerca de conceitos como certo , errado , apropriado quanto ao uso da língua em determinados momentos comunicativos.
A presente pesquisa apresenta como proposta uma análise comparativa de contos dos ficcionistas Guimarães Rosa e Miguel Torga, a partir da representação do animal humanizado em algumas narrativas. Através de levantamento bibliográfico, constatamos expressiva e singular representação de bichos na obra dos escritores referidos, que dialoga em momentos diversos. Interessa-nos, dessa forma, apurar de que maneira o animal dotado de características humanas está representado nas narrativas, bem como de que modo os autores mencionados abordam a relação entre o bicho, o homem e o mundo que os rodeia, que, no caso das obras dos autores citados, está situado, físico e emblematicamente, sobretudo, no meio rural. A nossa leitura privilegia as implicações da relação humano-animal em textos dos escritores aludidos, implicações que se baseiam, principalmente, em saberes alternativos, identificações e dicotomias. O corpus selecionado são os livros: Bichos, de Torga, e Ave, palavra, Estas estórias e Sagarana, de Guimarães Rosa. Cabe apontar, também, que tomamos como operadores de leitura a noção de antropomorfismo e o recurso da análise comparada.
Em nossa Dissertação de Mestrado, estudaremos, sobretudo, Meu tio o iauaretê, de Estas estórias, e, ainda, O espelho, de Primeiras estórias, de João Guimarães Rosa. Estes são os objetivos gerais do presente trabalho. Em relação ao primeiro relato (uma narrativa mais longa), temos como propósito específico efetuar a sua análise por meio da teoria do gênero fantástico desenvolvida por Tzvetan Todorov, a qual leva em conta os gêneros estranho e maravilhoso. Em relação ao segundo (uma narrativa bem menos extensa), o nosso intento específico é a sua abordagem a partir do maravilhoso. Também lançaremos mão de conceitos da psicologia analítica de Carl Gustav Jung, na leitura de ambos os textos: noções como inconsciente coletivo, arquétipo, anima, animus, alma do mato (para Meu tio o iauaretê), si-mesmo ou self, persona e sombra (para O espelho). Não pretendemos, todavia, transformar os personagens das duas obras em casos clínicos, mas mostrar como aspectos da teorização junguiana, tal como ocorre com a de Freud, servem para iluminar a produção literária de um modo geral. Dois detalhes que funcionam como fatores de ligação das duas narrativas de Rosa são as presenças da figura da onça e do espelho nas páginas de ambas.
Museu Nacional, Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social
Esta dissertação é um estudo de três obras literárias de Guimarães Rosa: “Grande Sertão: Veredas”, “Meu Tio o Iauaretê” e “Bicho Mau”. Este trabalho investiga a potência conceitual e poética desta literatura frente à antropologia. A partir destas três obras, o enfoque é sobre discussões a respeito dos mitos, paradoxos, rituais, simbolismo, tradução e linguagem. Sugere-se que nestes quadros há toda uma fortuna crítica e heurística, capaz de aventar diferentes horizontes tanto para a literatura rosiana, quanto para o campo da antropologia.
Programa de Estudos Pós-Graduados em Literatura e Crítica Literária
Este estudo tem como objetivo investigar a literatura de João Guimarães Rosa com o propósito de entrever um desígnio na escritura rosiana. Tal intenção foi delimitada pela constatação de que, na fortuna crítica sobre o escritor, poucos estudos se interessaram em indagar sua obra sob o conceito de escritura. Nesse sentido, esta pesquisa visa a revelar a escritura rosiana à luz da concepção mitopolítica de literatura. Para isso, indagamos a composição de sua escritura nas relações que estabelece com a linguagem, o mito e a poesia. Preocupamo-nos em examinar a escritura rosiana segundo uma visão m tica, buscando revelar não só a sua concepção de linguagem, mas também explicitar o seu modo de funcionamento. Orientaram a nossa reflexão as hipóteses: uma abordagem mitopolítica da literatura rosiana permite entrever as realizações metamórficas de sua palavra; a concretude da palavra rosiana permite compreender uma destinação meta física para sua escritura. Para desenvolver este estudo, selecionamos como corpus os contos Sorôco, sua mãe, sua filha (1962), Meu tio o Iauaretê (1961), e Lá, nas campinas (1967). A fundamentação teórica baseou-se nos conceitos de escritura propostos por Roland Barthes e Jacques Derrida, e de mitologia propostos por Mielietinski, Eliade e Cassirer, assim como em ensaios cr ticos propostos por críticos da literatura rosiana. Valemo-nos também dos princ ípios políticos do próprio escritor, coletados em entrevistas. Conclu ímos que a literatura de João Guimarães Rosa evidencia alto grau de realização de linguagem, que a revela como uma espécie de metafísica racionalista, como uma escritura que, ao talhar a palavra, configura as metamorfoses do signo literário, e, ainda, propõe ao homem, via linguagem e, por extensão, via poesia, uma transcendência racionalista, pautada pela metafisicalidade da linguagem.
O trabalho propõe um estudo da linguagem e da cosmovisão do narrador do conto, e como esses dois âmbitos da obra estão interligados para introduzir um aspecto altamente inovador na literatura brasileira através do uso da língua tupi de maneira provocadora.
Por nos parecer que linguagem e cosmovisão do narrador-personagem são indissociáveis, ambos os aspectos serão analisados no intuito de descobrir a intenção do texto de uma humanização da literatura através de uma possível desumanização do narrador-personagem, que transita no limiar do humano e o animal. Seria realmente uma desumanização o processo de transformação do narrador em onça? Ou seria, uma outra espécie de humanização, uma cosmovisão que difere da visão ocidental que separa humanos e animais? Sobre a questão animal, também dialogaremos com o ensaio Pensamento e animalidade em Vidas secas de Gustavo Silveira Ribeiro, afim de discutir a presença do animal na literatura e sociedade.
Meu tio, o Iauaretê propõe ainda uma d
Guimarães Rosa com seus neologismos se caracteriza principalmente por uma tendência
mimética, sendo, entretanto irrealista. Na balança entre o realismo e irrealismo em suas
obras e em especial no conto “Meu tio o Iauaretê”, o autor reflete na estrutura a sua
preocupação com o nível das ideias e da linguagem ou das aparências e da essência.
Tendo em vista este contexto, objetiva-se neste trabalho apresentar uma análise
estrutural linguística e literária do conto “Meu Tio o Iauaretê”, tendo como base as
dicotomias aparentes no texto. Para tanto, foram analisados os fundamentos teóricos de
Bosi (1981), Campos (1970), Calobrezi (2001), Citelli (1998), Covizzi (1978), Fiorin
(1995), Fiorin e Savioli (1991), Filho (1986) e Rogel (1985) que embasam as
afirmações exploradas no texto.
Este estudo tem como objetivo apontar similitudes entre alguns elementos encontrados no Canto IX da Odisseia de Homero e em “Meu tio o Iauaretê”, novela de João Guimarães Rosa, publicada em 1969, na
coletânea Estas estórias. Dentre os textos teóricos utilizados, destaca-se o artigo de Ana Luiza Martins Costa, no qual é feita uma minuciosa análise do “Caderno de leitura de Homero”, caderneta que contém observações de Guimarães Rosa sobre a narrativa épica, além de o registro de passagens da
Ilíada e da Odisseia. Rosa não teria apenas lido as duas epopeias, porém as estudara com afinco. Ao longo da narrativa da novela, é possível supor que o escritor faz uma releitura de Homero, tanto em relação à “hospitalidade” do anfitrião e à bebida oferecida pelo “visitante”, como, também, à sua
selvageria e ao temor difundido por seu aspecto grotesco. Ao pensamento “bom bonito”, repetido pelo índio-onça, conjectura-se relacionar o kalòs k’agathós grego. A pureza da cachaça apreciada por Antonho
Este trabalho tem por objetivo refletir sobre o conto “Meu tio o Iauaretê”, de João Guimarães Rosa, publicado em revista, pela primeira vez, em 1961 e, mais tarde, na coletânea póstuma Estas Estórias. Consideramos que o conto consiste em uma composição na qual se encontram traços regionalistas e espiritualistas, em evidência no momento de sua escrita, como afirmam Bittencourt e Lopes (2004), visto que se utiliza de uma linguagem característica da região onde a narrativa se desenrola, e de um personagem que se reveste de aspectos sertanejos, mas trata de um tema considerado nessa análise como sobrenatural, ou fantástico, presente na literatura universal: a metamorfose. Elegemos, dentre os diferentes níveis de análise, o olhar sobre a desumanização de seu personagem principal e a sua humanização. Ao nos afastarmos da concepção regionalista tradicional, é possível dialogar com outras metamorfoses da literatura universal, numa perspectiva comparatista diferencial (HEIDMANN, 2010; ADAM, HEIDMANN e MAINGUENEAU, 2010; ADAM, 2011), dentre as quais destacamos autores que, como Rosa, realizaram processos de experimentação na escrita, Ovidio, em suas Metamorfoses, e Kafka, com A metamorfose. Desta maneira, é possível refletir sobre a relação entre os homens e suas novas formas, não como um simples processo de desumanização, mas como um evidenciador da exploração de sua humanidade, dissociada dos padrões sociais, regionalistas ou não. Esta perspectiva pode se aproximar das reflexões de Deleuze e Guattari (1996, 2002), Blanchot (2005), Battaille (2010) e Barthes (1993).
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